Novo arcebispo de Cantuária herda uma Igreja dividida e ameaçada por cismas

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Justin Welby tem reputação de conciliador e pragmático LEON NEAL/afp

Justin Welby, um antigo executivo da indústria petrolífera, será o 105.º primaz da Igreja de Inglaterra

O novo arcebispo de Cantuária, primaz da Igreja de Inglaterra, revolucionou a sua vida em 1987, ao abandonar uma carreira de sucesso na indústria petrolífera para se dedicar ao sacerdócio. Ontem, a vida de Justin Welby deu uma nova volta, com a nomeação para o cargo mais alto da hierarquia anglicana, uma comunhão que herda muito dividida.

"A minha reacção inicial foi "oh, não!"", confessou Welby, de 56 anos, no seu primeiro encontro com jornalistas depois de o primeiro-ministro britânico, David Cameron, ter anunciado via Twitter a nomeação. Há vários dias que o nome do actual bispo de Durham era apontado pela imprensa como o previsível sucessor de Rowan Williams, que deixa no final de Dezembro o cargo que exerceu durante dez anos. "Bem, foi o segredo mais bem guardado desde a última remodelação governamental", brincou Welby, confessando-se "atónito e excitado" com a nomeação.

Welby não era a escolha óbvia para suceder a Williams, já que foi nomeado bispo há menos de um ano, mas ultrapassou outros candidatos mais experientes graças à reputação de conciliador e pragmático.

O primeiro-ministro disse que a escolha do painel de sacerdotes e laicos incumbido de decidir sobre a sucessão foi "esmagadora". E acrescentou que a opção por "alguém que teve uma vida fora da Igreja, no mundo dos negócios, trará uma lufada de ar fresco à Igreja de Inglaterra". Rowan Williams saudou a escolha, descrevendo o seu sucessor como "uma pessoa dotada de elegância, paciência, sabedoria e humor".

Características que serão essenciais ao 105.º arcebispo de Cantuária, nomeado para o cargo numa altura em que a comunhão anglicana se debate com divergências profundas que, por mais de uma vez, ameaçaram provocar cisões entre as diferentes Igrejas que a compõem.

Um dos temas mais fracturantes é a permissão para que as mulheres, já admitidas ao sacerdócio entre os anglicanos, possam ser ordenadas bispo. A Igreja de Inglaterra votará sobre o assunto no Sínodo deste mês, mas a decisão não será vinculativa para os anglicanos de outros países, sobre os quais o arcebispo de Cantuária não tem autoridade.

Na conferência de imprensa de ontem, Welby reafirmou o seu apoio a esta reforma, de que tem sido um dos grandes defensores, mas foi muito mais cauteloso sobre o outro tema fracturante - a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo no Reino Unido. Tido como um opositor da iniciativa, preferindo a manutenção do actual sistema de parcerias civis, o novo arcebispo disse que a Igreja "não deve tolerar qualquer forma de homofobia", mas lembrou que tudo o que é decidido em Inglaterra "afecta profundamente igrejas noutros países que estão já a sofrer, como é o caso da Nigéria".

É de África, onde o número de anglicanos mais tem crescido, que chegam as maiores críticas à viragem "liberal" das igrejas em Inglaterra e nos EUA, onde já é permitida a ordenação de pastores homossexuais. Nos Estados Unidos, vários bispos mais tradicionalistas decidiram mesmo converter-se ao catolicismo.

Mas Welby é um homem habituado a duras provas. Educado em Eton, o selectivo colégio de que foi aluno Cameron, foi durante 11 anos um executivo bem pago no sector petrolífero. Terá sido a morte de uma filha, com apenas sete meses, num acidente de viação, que lhe mudou o destino. Apesar de devastado, a perda "de uma forma estranha acabou por me aproximar, e à minha mulher, de Deus". Pouco depois, abandonou o emprego para estudar Teologia, sendo ordenado padre em 1992. Agora é uma das vozes que se erguem na Igreja a favor de um "capitalismo moral" e contra os "salários obscenos pagos aos administradores das grandes empresas".

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