Ribeiro dos Santos: o médico antifascista que tinha a paixão das revistas literárias

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O médico e bibliófilo morreu ontem no Porto aos 95 anos FERNANDO VELUDO/NFACTOS

Alfredo Ribeiro dos Santos dedicou os seus últimos anos de vida a escrever uma História Literária do Porto, lançada em 2009

Médico, ensaísta, bibliófilo e figura da oposição democrática ao salazarismo, Alfredo Ribeiro dos Santos morreu ontem no Porto, de onde era natural, aos 95 anos. Autor de várias obras sobre o movimento da Renascença Portuguesa e de estudos dedicados a algumas das suas figuras mais relevantes, o médico - pioneiro, em Portugal, da especialização em anestesia - ainda teve a satisfação de ver impresso o ambicioso trabalho a que dedicou os seus últimos anos de vida: a História Literária do Porto através das Suas Publicações Periódicas (Afrontamento, 2009).

Nascido no Porto em 1917, Ribeiro dos Santos fez os estudos secundários nesta cidade, no liceu Rodrigues de Freitas, onde teve como professor o filósofo Leonardo Coimbra, fundador da Renascença Portuguesa, que exerceria uma influência determinante na sua vida. Formou-se depois em Medicina, em 1943, e estagiou na enfermaria do Hospital de Santo António, então dirigida pelo médico oposicionista Veiga Pires. Foi este "incansável conspirador antifascista do Porto", para citar a caracterização que dele faz Mário Soares, que levou Ribeiro dos Santos para as lutas da oposição, introduzindo-o, nos anos 40, no MUNAF (Movimento de Unidade Nacional Anti-Fascista) e no MUD (Movimento de Unidade Democrática).

Num prefácio escrito para o catálogo que acompanhou o leilão da biblioteca de Ribeiro dos Santos, em 2007, Soares conta que conheceu Ribeiro dos Santos no MUD e que, depois, voltaram a encontrar-se "em todos os grandes momentos da Oposição Democrática", como as candidaturas de Norton de Matos e Humberto Delgado. E descreve o médico do Porto como alguém que "deixou sempre, por onde passou, um rasto de simpatia, de humanidade, de aprumo pessoal e cívico".

Apesar da sua ocasional colaboração em revistas, só no final da vida arranjou tempo para se dedicar a trabalhos de vulto, como A Renascença Portuguesa (1990), uma obra com informação indispensável para o estudo do movimento cultural portuense. Jaime Cortesão, Um dos Grandes de Portugal (1993, com prefácio de Mário Soares), e ainda estudos dedicados a Leonardo Coimbra ou Abel Salazar.

Grande bibliófilo, a jóia da coroa da sua biblioteca, que decidiu leiloar em 2007, era a sua colecção de revistas literárias portuguesas, possivelmente a mais completa que foi à praça nas últimas décadas, e que lhe permitiu escrever a sua História Literária do Porto quase sem ter de sair de casa.

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