O que faz Murakami aqui?

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KIMIMASA MAYAMA/REUTERS

Não serão o sítio natural da geografia de Haruki Murakami, mas nem Murakami, na sua pós-modernidade literária, conseguiu - ou quis - evitar que as clássicas ryokan fizessem parte da sua paisagem literária. É o nome dado às estalagens tradicionais do Japão, pensadas para acolher os viajantes que andavam pelo país entre os séculos XVII e XIX. Sem os néons dos grandes hotéis da imensa metrópole, mas integradas na sua dinâmica, são hoje uma alternativa nem sempre barata, mas representativa da maneira nipónica de bem receber um hóspede. Isso implica deixar os sapatos à entrada e ter refeições - normalmente o pequeno-almoço e o jantar estão incluídos no preço - com uma qualidade acima da média, o que no Japão eleva muito a fasquia. Não servem cozinha contemporânea, mas pratos tradicionais da chamada cozinha kaiseki, que pouco ou nada tem a ver com sushi. Antes, era uma refeição ligeira servida na cerimónia do chá. Evoluiu para um ritual gastronómico feito de uma sucessão de pequenos pratos, servidos a uma temperatura que exige pontualidade à mesa e com produtos representativos de uma determinada estação num local concreto.

Minimalistas na decoração, actualizados no conforto, as ryokan têm no despojamento o seu maior luxo e nos banhos quentes colectivos o seu grande atractivo. Murakami será aqui mais estranho do que no Hyatt, mas não faltam clientes a passear os livros do autor de Kafka a Beira-Mar, como o mais realista Norwegian Wood. O ambiente que as rodeia surge descrito em A Sul da Fronteira, a Oeste do Sol, livro de 1992, que se desenrola em Tóquio e arredores. Mas Quioto, a cidade natal de Murakami, onde o escritor raramente tenciona voltar, misturou essas casas com a literatura. Yukio Mishima era visita frequente de algumas e o Nobel Yasunari Kawabata aparece sempre ligado ao Ryokan Hiiragiya, um dos mais tradicionais da cidade.

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