Primeiro encontro entre o Presidente birmanês e rebeldes karen

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Delegados da União Karen apertam as mãos aos membros do Governo REUTERS/Soe Zeya Tun

Os dois lados de uma das mais longas guerras civis do mundo começam a reunir-se. Estratégia faz parte da abertura do regime

Os dois lados protagonizam um dos mais antigos conflitos civis do mundo, com os rebeldes karen a lutar por autonomia no território desde há mais de 60 anos, e as tropas do regime birmanês a levarem a cabo operações brutais caracterizadas por violações dos direitos humanos.

O encontro desta semana entre o Presidente da Birmânia, Thein Sein, com uma delegação dos rebeldes karen terminou com um acordo de cessar-fogo.

Para os representantes karen, o mais importante é assegurar que não há combates, primeiro, e depois permitir condições para o regresso de dezenas de milhares de pessoas que fugiram. "Penso que se não houver conflito e se não houver trabalho forçado, eles regressarão", disse Phado Kwe Htoo, citado pelo site Eurasia Review. "Mas vão precisar de recomeçar as suas vidas, e isso não pode ser feito imediatamente".

A reunião decorreu de forma "amena e agradável", descreveu uma porta-voz da União Nacional Karen, que tem base na Tailândia e tinha sido ilegalizada na Birmânia.

Os karen são um entre cerca de cem grupos étnicos da Birmânia, mas um dos mais importantes. São o terceiro maior grupo étnico, e estima-se que representem entre 7 a 10% da população de cerca de 50 milhões de birmaneses.

A etnia, cuja maioria é cristã embora haja também karen budistas ou animistas (na Birmânia a religião maioritária é o budismo), era por outro lado a que tinha um maior grupo armado, chegando a contar com 14 mil combatentes e a controlar largas porções de território do Leste do país, na fronteira com a Tailândia, segundo a emissora britânica BBC.

Mas em anos recentes, diz o diário norte-americano Christian Science Monitor, divisões entre os próprios karen levaram o número de combatentes a diminuir e o grupo perdeu o controlo de território estratégico.

Anos de medidas brutais - não só operações militares mas trabalho forçado, passando por violações, tortura, assassínios - levaram a que dezenas de milhares de karen fugissem das suas terras. Muitos estão deslocados internamente, muitos outros fugiram para a Tailândia, onde há cerca de 160 mil refugiados birmaneses e a maioria destes são karen.

O significado deste encontro, o que juntou pela primeira vez representantes a alto nível e que se segue a um primeiro acordo de cessar-fogo assinado em Janeiro, é grande para o conflito entre os karen e o regime birmanês.

Caminho reformista

Mas as implicações são mais alargadas para a situação política na Birmânia: querem dizer que o regime está a continuar a operação de abertura que começou ao designar um Presidente civil no ano passado, passou pela libertação da líder da oposição Aung San Suu Kyi, e que foi, recentemente, confirmada com eleições intercalares para uma pequena parte do Parlamento. A votação deu uma grande vitória ao partido de Suu Kyi e a própria Nobel da Paz foi eleita como deputada.

Suu Kyi já tinha sublinhado, no discurso após a vitória eleitoral no final do mês passado, a importância da "paz étnica" no caminho da Birmânia para a democracia.

Esta é também uma condição apontada por União Europeia e Estados Unidos para o levantamento das sanções que mantêm ao regime.

Na sequência da enorme vitória do partido de Suu Kyi e da derrota de candidatos ligados aos militares, analistas preocupavam-se que o regime retrocedesse no caminho das reformas que vai fazendo a conta-gotas. Esta iniciativa parece mostrar que para já isso não aconteceu.

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