Até no Twitter Ronaldo joga em equipa

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O actor Ashton Kutcher decidiu entregar a profissionais a gestão das suas mensagens depois de um tweet criticando a Universidade do estado da Pensilvânia por ter despedido o treinador Joe Paterno, sem saber que este era suspeito de abuso sexual de menores Shaquille O" Neal tem actualmente mais de quatro milhões de seguidores no Twitter. É uma estrela. Os seus tweets até são patrocinados. Quem diria: há cerca de três anos o atleta nem sequer sabia o que era o Twitter ADREES LATIF/reuters

Por detrás de uma celebridade online está, quase sempre, uma boa equipa. Cristiano Ronaldo, Shaquille O" Neal e Ashton Kutcher são apenas dois exemplos de famosos auxiliados por profissionais da Internet. Ser instrutor e gestor de redes sociais é uma profissão com futuro.

Um basquetebolista de 2,16m e uma ex-cheerleader do Wyoming poderão passar por uma dupla bizarra mas são imbatíveis no universo das redes sociais. O atleta chama-se Shaquille O"Neal e foi (é!) uma estrela da NBA. A mulher chama-se Amy Jo Martin e é uma guru do Twitter e do Facebook.

Graças a esta parceria, Shaquille O"Neal tem actualmente mais de quatro milhões de seguidores do Twitter. É uma estrela. Os seus tweets até são patrocinados. Quem diria: há cerca de três anos o atleta nem sequer sabia o que era o Twitter. Só ouviu falar disso depois de ter lido um artigo em que o criticavam por coisas que alegadamente teria escrito naquela plataforma.

Nessa altura, em 2008, Shaquille O"Neal estava nos Phoenix Suns e Amy Jo Martin também, como relações públicas. Auto-intitulava-se responsável pelos media digitais da equipa de basquetebol, perante a generalizada indiferença dos seus dirigentes. Estava constantemente agarrada aos smartphones, a interagir com os fãs e a promover a imagem do clube.

Depois de perceber que alguém se andava a fazer passar por ele no Twitter, Shaquille O"Neal pediu para falar com Amy Jo Martin. Foi aí que o milagre aconteceu. O basquetebolista tornou-se cobaia da jovem perita em redes sociais.

Entre outras manobras publicitárias para o mundo digital, convenceu-o a deixar-se tocar por fãs em troca de bilhetes para jogos. O jogador cimentou o seu estatuto de estrela digital e, pouco depois, Amy Jo Martin saiu dos Phoenix Suns e fundou a sua própria empresa - a Digital Royalty - levando O"Neal consigo.

Ainda hoje o basquetebolista é agenciado pela jovem que viu o seu negócio crescer a um ritmo impressionante nos últimos tempos. A determinada altura, em Outubro do ano passado, nove dos dez tópicos mais populares do Twitter eram oriundos de clientes de Martin, escreve a Business Week.

Este exemplo ilustra a relação estreita que figuras públicas e celebridades mantêm com as empresas ou os agentes que lhes gerem a vida digital. Temos um caso semelhante em Portugal, com a empresa Polaris/Gestifute, que ajuda Cristiano Ronaldo a gerir os seus posts e mensagens nas redes sociais. Pedro Moreira dos Santos é uma das pessoas que se responsabilizam por este trabalho.

Quisemos saber como funciona exactamente este tandem? Em declarações à Pública, Pedro Moreira dos Santos explica que, no caso dos clientes agenciados da Polaris/Gestifute, todas as mensagens que aparecem online nas redes sociais são propostas pelos próprios clientes. "Não temos um ghost writer. As mensagens são autênticas", garante o responsável, querendo com isto dizer que os conteúdos que aparecem no perfil do Cristiano Ronaldo, por exemplo, têm sempre a "autoria moral" do próprio.

Mas na prática as coisas nem sempre são tão lineares: "Por vezes, o agenciado coloca directamente a mensagem e, por vezes, esse mesmo agenciado envia-nos o conteúdo para fazermos o upload. Esta razão prende-se com o facto de alguns se sentirem mais à vontade [do que outros] com o Facebook ou o Twitter. (...) Há também situações em que nos enviam, por exemplo, uma fotografia pedindo para fazermos o upload por uma questão de conveniência. Não há, por isso, um modelo único mas há certamente veracidade na mensagem e conteúdos", explica ainda Pedro Moreira dos Santos.

Passos em falso

Mas às vezes esta veracidade e autenticidade, aliadas ao imediatismo das redes sociais, podem ser um problema.

Para evitar passos em falso, Pedro Moreira dos Santos explica que a Polaris/Gestifute aconselha sempre os seus agenciados a comunicarem uma mensagem "positiva" e "centrada na vertente desportiva (que é a razão pela qual os clientes são conhecidos e admirados)".

O actor norte-americano Ashton Kutcher - a primeira pessoa em todo o mundo a conseguir um milhão de seguidores no Twitter e fervoroso utilizador desta plataforma - decidiu recentemente entregar a profissionais a gestão das suas mensagens precisamente após ter dado um desses passos em falso.

Esta decisão aconteceu depois de ter publicado um tweet criticando a Universidade do estado da Pensilvânia por ter despedido o treinador Joe Paterno (futebol americano). Aquilo que Kutcher não sabia à altura do seu tweet era que Paterno havia sido dispensado por suspeitas de abuso sexual de menores.

Depois deste faux pas, Kutcher explicou claramente a sua mudança de atitude: "Até hoje publiquei virtualmente todos os meus tweets por conta própria, mas claramente esta plataforma tornou-se demasiado grande para ser gerida por um único indivíduo", escreveu o actor no seu blogue. A partir do final do ano passado, passou a ser a produtora co-fundada por si, a Katalyst Media, a editar a priori as suas mensagens, a fim de "assegurar a qualidade dos conteúdos".

Na opinião de Vítor Domingos, director de 2.0 na agência de comunicação Nextpower, esta tarefa de mediação entre figuras públicas e empresas especializadas é cada vez mais comum. "Conheço muito poucas figuras públicas que conseguem efectivamente manter uma presença online eficaz por elas próprias. Isso significa que a maioria é de facto gerida por comunicadores."

Para que a relação entre os clientes e os profissionais das redes sociais possa ter sucesso, Vítor Domingos defende que é necessário o comunicador "vestir a pele do cliente" e ser "verdadeiro, directo e sincero". "As pessoas (fãs, seguidores) são sensíveis, gostam de feedback e gostam de ser ouvidas. Isto é uma conversa e não um monólogo como muitos consideram e aplicam nos seus perfis sociais", explica Vítor Domingos.

Opinião semelhante tem Fernando Baptista, head office da agência de comunicação especializada em relações públicas digitais LEWIS PR: "É importante que quem segue uma figura pública sinta que quem escreve não mostre somente os passos da personalidade, mas também tem de ter momentos em que se aperceba de que é mesmo a figura pública que está a escrever."

Profissão de futuro

Numa altura em que as palavras "crise" e "desemprego" dominam a actualidade, ser gestor de redes sociais poderá ser uma boa aposta de futuro. Quisemos saber isso mesmo e os especialistas parecem concordar que esta é uma actividade em franca expansão.

"Parece-me natural que esta actividade possa ter futuro, dado que é um meio de comunicação novo, onde estão as comunidades, as pessoas, os clientes e os fãs, com regras, linguagem e mecânicas próprias", indicou à Pública Vítor Domingos.

Por seu lado, Fernando Batista afirma, com certeza, que "ser gestor de redes sociais é uma das profissões que se encontra nas novas tendências de emprego". De acordo com este especialista, são os especialistas em redes sociais que permitem "a criação de um relacionamento forte e fiel entre consumidores e marca" ou entre figuras públicas e fãs.

A guru americana Amy Jo Martin considera que não ter espaço nas redes sociais no século XXI era como não ter telefone no século XX. É esse o argumento que ela usa quando algum empresário lhe pergunta: "Como é que eu faço dinheiro com isto das redes sociais?" Num artigo seu publicado online, Amy Jo Martin explica o seu raciocínio: "Os social media não são bem um media. Eu penso neles como um canal, como um telefone. (...) Quando é que um director executivo perguntou como é que podia fazer dinheiro com os telefones? Ou já algum director executivo ameaçou não investir em telefones porque a empresa não pode fazer dinheiro com eles?"

Os tempos mudaram e a forma como se comunica também. De acordo com Fernando Batista, ser gestor de redes sociais implica perceber uma coisa fundamental: a comunicação mudou muito nos últimos anos. "Um dos grandes obstáculos de comunicação prende-se com os paradigmas que vigoraram durante anos onde as marcas comunicavam numa óptica de "um-para-muitos". As redes sociais vieram alterar esta forma de comunicar. Agora estamos num paradigma de "muitos-para-um" que fala sempre de "um-para-um"", explica.

"Henry Ford agora não conseguiria vender um único Ford T, pois as pessoas agora querem carros de outras cores e feitios e não um produto que lhes é imposto", conclui Fernando Batista.

susana.ribeiro@publico.pt

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