As águas, para além da privatização

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Só o simplismo de posições ideológicas fechadas leva a que se considere a privatização um mal absoluto

1. A água é um sector de futuro e num processo de mudanças profundo, mas é muito mais que um sector, não é dispiciendo que seja um dos temas de referência dos Objectivos do Desenvolvimento do Milénio das Nações Unidas, que num dos seus pontos se propõe:

"Reduzir para metade no ano 2015 a percentagem de pessoas sem acesso à água potável e a serviços básicos de saneamento."

Sendo que o crescimento previsível da população e a sua concentração em áreas urbanas motivará crescentes problemas de fornecimento e saneamento.

A incorporação de novas soluções tecnológicas eficientes e com inovações, já disponíveis no mercado, e uma melhor gestão dos recursos hídricos serão necessários para estabelecer um equilíbrio entre a oferta e a procura.

Teremos questões como a dessalinização, a eficiência e a reutilização industrial e novos procedimentos agrícolas assim como o uso dos caudais e despejos, no primeiro plano.

Uma adequada gestão energética e a utilização de novos sistemas de reciclagem serão fundamentais.

2. Tudo isso e muito mais não pode compaginar-se com os discursos que hoje em Portugal centram a questão num aspecto que não tem nada que ver com todas essas questões a não ser o facto de poder ser um estímulo, numa lógica de mercado, ao melhor tratamento e desenvolvimento de todas essas potencialidades.

Penso que é um erro depreciar a questão da privatização dos sistemas de fornecimento e ou tratamento de águas.

Em si eles não só não tem maldade, como podem trazer aspectos positivos de gestão ao sistema.

Sou favorável à privatização, deste como de outros sistemas, desde que esta seja feita em bases claras e tenha por base orientações objectivas e estabeleça compromissos que devem ser cumpridos por todas as partes.

A eficácia económica dos sistemas está mais bem entregue à iniciativa privada que ao Estado, sejam devidamente assegurados as necessidades sociais e os imperativos ambientais, mediante uma fiscalização rigorosa e contratos de preços transparentes.

A água não é um bem gratuito, mas o seu acesso deve ser um serviço social, por isso o estabelecimento de preços diferenciados, com relação ao uso, industrial, agrícola e doméstico e também indexado às perdas e níveis de poluição destas é a base de um quadro que deve orientar uma sábia política de privatização deste sector, com base em contratos a termo e prevendo a sua rescisão caso incumprimento referido nesses.

Só o simplismo de posições ideológicas fechadas leva a que se considere a privatização um mal absoluto.

Foi a privatização do sector de produção energético que conduziu à paragem quase global da nuclear e se balizada em critérios de eficácia energética, se tivesse em conta os princípios da termodinâmica aplicados à economia, não nos levaria ao dispilfário energético actual nem a discussões redondas sobre esse.

O rigor no estabelecimento das bases contratuais de qualquer privatização, assim como uma fiscalização adequada dessa tirava dois coelhos de uma cartola.

A água é um tema central do política de ambiente, por ela passa a criação e a continuidade, por ela passa a vida e a morte.

Proteger a água é um imperativo de consciência, é um imperativo de vida.

3. Quero deixar claro que sendo este texto a minha posição julgo ser um erro crasso e sinal de falta de rigor e perspectivas enfeudadas a políticas do século XIX que grupos ecologistas/ambientalistas se manifestem contra a privatização do sector das águas, como parece ser intenção de alguns, e envolverem-se com correntes politicas ou iniciativas referendárias que são da mais pura demagogia e não tem nada que ver com a sustentabilidade do território, em vez de se preocuparem com casos concretos de insalubridade no fornecimento desse serviço público, erros de gestão das águas residuais ou o que é o inadequado processo em curso na famosa praia fluvial de Mangualde ou o contínuo disparate em curso no Alqueva, ou o envolvimento nas discussões dos planos de gestão de bacia, a revisão da convenção luso-espanhola, ou o plano nacional de Barragens. Membro e dirigente de diversas associações ambientais

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