Arte de fazer inimigos

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Empenhei-me na defesa do Estado social, conquista maior do constitucionalismo do século XX e alvo do neoliberalismo

Tal como quase tudo, também esta coluna chega ao fim. Por decisão da direção do PÚBLICO, termino aqui a minha colaboração semanal, que se prolongou ininterruptamente por treze anos e que atravessou várias direções deste jornal e vários governos do país. Antes de fazer um balanço próprio do que fui escrevendo, quero agradecer a atenção e a dedicação dos meus leitores e o interesse e a franqueza dos meus críticos. Sem uns e outros não teria valido a pena.

Nas centenas de artigos que publiquei é fácil verificar a recorrência de um conjunto de tópicos à volta dos quais giram as minhas preocupações e as convicções. Refiro aqui os principais.

Preocupei-me antes de mais em defender uma conceção republicana da democracia, baseada não somente na liberdade política e nas eleições periódicas mas também na transparência e responsabilidade dos cargos políticos, na probidade e virtude dos responsáveis políticos, na separação entre funções públicas e interesses privados, na independência entre a esfera política e a religiosa, no empenhamento cívico na atividade política. Defendi por isso o limite dos mandatos políticos, a ampliação das incompatibilidades e das declarações de interesses, a transparência das finanças partidárias, a democracia participativa (especialmente a nível local). Mas também defendi o direito ao bom nome e reputação dos políticos e o seu direito à sua vida privada, bem como a sua imunidade perante "assassínios de caracter" e julgamentos mediáticos.

Empenhei-me na defesa do Estado social, conquista maior do constitucionalismo do século XX e alvo preferencial do neoliberalismo reinante desde há trinta anos. Mas sempre fiz questão de argumentar que não é possível defender o Estado social sem assegurar a sua sustentabilidade financeira, posta em causa pelo envelhecimento da população, pelo crescente custo dos cuidados de saúde, pelo baixo crescimento económico e pela redução da capacidade tributária do Estado. Defender o Estado social é defender a racionalização dos seus recursos (desde logo o sistema de pensões), dar prioridade aos que menos têm, apostar na eficiência dos serviços.

Não perdi uma oportunidade para lutar pela integração europeia e pelo reforço da União Europeia, em nome da coesão económica, social e territorial, de uma Europa dos cidadãos, do modelo social europeu e de um espaço europeu de liberdade, segurança e justiça. Contra a oposição "soberanista" e a oposição esquerdista defendi sucessivamente a Carta de Diretos Fundamentais da União, o (falhado) Tratado Constitucional de 2004 e depois o Tratado de Lisboa de 2007. O nosso futuro coletivo passa pela UE.

Desde muito cedo, quando ainda poucos o faziam, tomei partido pela disciplina das contas públicas e pelo cumprimento das regras orçamentais da UE. Alertei muitas vezes para o despilfarro da M