O conquistador do Pólo Sul

Depois do Pólo Norte, a 14 de Dezembro de 1911, o norueguês chegava ao Pólo Sul. Foi avistado, pela última vez, perto do arquipélago Svalbard, no Ártico, à procura de um amigo, em 1928

O ano de 2011 foi declarado, pelos governos do Canadá, dos Estados Unidos e da Noruega, Ano Polar Internacional, tentando assim chamar a atenção para os estudos que se têm realizado sobre as regiões polares. Paralelamente, o Governo norueguês decidiu declarar 2011 Ano Nansen-Amundsen, homenageando os dois exploradores polares.

Assinalam-se, assim, os 150 anos do nascimento de Fridjof Nansen, que ficou para a História como o precursor das expedições polares norueguesas (ao tentar atingir o Pólo Norte de barco, em 1883, e mais tarde de trenó), e o centenário da chegada ao Pólo Sul, na Antárctida, de Roald Amundsen, o primeiro homem a atingi-lo, a pé, a 14 de Dezembro de 1911 - cinco semanas antes de uma expedição inglesa comandada pelo capitão Robert Scott ter conseguido o mesmo feito (apesar de quase ter terminado em tragédia).

As comemorações têm lugar ao longo deste ano, e centram-se sobretudo na pequena cidade de Tromsø, a norte do Círculo Polar Ártico. Tromsø tornou-se famosa por ter sido uma espécie de "porta" das expedições polares e onde, ainda hoje, se localizam os mais importantes institutos de nível universitário que têm como objectivo o estudo de tudo o que se relaciona com os pólos e o oceano Árctico. É também nesta cidade que está localizado o Museu Polar - dividido em várias salas, oferece ao visitante uma perspectiva do que foram as expedições polares, das duras condições climáticas, das actividades de caça praticadas nas primeiras décadas do século XX; e também o local onde se pode quase ver tudo (algumas réplicas) o que se relaciona com a expedição pioneira de Amundsen.

Inverno na Antártida

Roald Amundsen (1872-1928), originário de uma família de armadores, cedo se aventurou no mar. Ainda começou por estudar Medicina, mas acabou por se inscrever na Escola Náutica, em Oslo, na Noruega. Pouco tempo depois, já estudava as regiões polares, interessando-se pelos escritos do seu compatriota Nansen, e pela exploração que este organizara à Gronelândia alguns anos antes. Em 1897, parte de Antuérpia, no navio Bélgica, para uma expedição à Antárctica. A aventura correu mal, e o navio ficou durante 13 meses aprisionado nos gelos. Graças a terem comido carne fresca de foca e de pinguim, acabaram por não ter escorbuto, doença que era normalmente a causa de morte nestes acontecimentos. Foram os primeiros marinheiros a passarem um Inverno na Antárctida.

Anos depois, em 1903, já ao comando de um pequeno veleiro de nome Gjøa, torna-se na primeira expedição a atravessar a passagem Noroeste entre os oceanos Atlântico e Pacífico. Roald Amundsen e a sua equipa seguiram então na direcção do Pólo Norte magnético, e esta foi a primeira vez que alguém conseguiu registar o movimento dos pólos: este tinha-se deslocado 30 milhas.

A estada no Canadá virá a mostrar-se, mais tarde, como essencial para o sucesso da grande expedição que virá a intentar. Amundsen entrou em contacto com os esquimós netsilik e aprendeu com eles as técnicas de sobrevivência num clima extremo de frio e de gelo, e, desde logo, começa a usar as suas roupas. São feitas sem fibras vegetais, usando os esquimós apenas peles de animais, e com um talho ligeiramente largo para permitir a circulação do ar junto ao corpo.

Depois de conseguida a passagem Noroeste, o norueguês começa a fazer planos para conquistas mais audazes, e sonha com o Pólo Norte. Mas recebe a notícia - que mais tarde se mostrará falsa, apesar de restarem, ainda hoje, algumas dúvidas: Frederick Cook e também Robert Peary já lá teriam chegado. No entanto, mantém pública a sua vontade de chegar ao Pólo Norte. O seu compatriota Nansen empresta-lhe o já famoso navio Fram, e ele parte de Tromsø em 1910. Mesmo a bordo, poucos eram os que sabiam que Amundsen ia rumo ao Pólo Sul.

Entretanto, a caminho do Pólo Sul ia também uma expedição inglesa capitaneada por Robert Scott, com a vantagem de terem já uma rota predefinida - a do malogrado Ernest Shackleton. Ambos, Scott e Amundsen, lutavam contra o tempo.

O barco Fram, com os marinheiros da expedição de Amundsen, chegou à Baía das Baleias a 14 de Janeiro de 1911. Durante meses, e com todos os cuidados possíveis, vão estudando partes do percurso, armazenando comida em diferentes pontos, esperando pelo momento mais propício para a partida. O plano da expedição incluía trenós puxados por cães - a função destes animais não seria apenas de tracção, como mais adiante se verá.

A cerca de 600 quilómetros dali, Scott preparava também a sua expedição, que seguiria uma rota diferente. No entanto, em muito pouco se assemelhava à do explorador norueguês. O capitão inglês decidira-se a usar póneis em vez de cães (à semelhança do que já fizera um seu antecessor); os trenós seriam motorizados, e, em vez de esquis (os homens de Scott não sabiam esquiar), usariam botas para caminhar.

Quatro homens e 13 cães

Amundsen decide iniciar a expedição a 11 de Setembro, em condições climáticas ainda muito difíceis, mas o bom-senso fá-lo desistir quatro dias depois e voltar ao acampamento inicial. Ia esperar a chegada da Primavera polar, mais de um mês. Torna a partir a 19 de Outubro, acompanhado de quatro homens, 13 cães e quatro trenós, cada um carregado com cerca de 400 quilos de material e comida. Pela frente, tinham cerca de 1350 quilómetros para percorrer até ao local onde hasteariam a bandeira da Noruega.

A viagem correu sem percalços de maior e a 14 de Dezembro de 1911 a bandeira da Noruega foi hasteada no planalto que ele baptizou com o nome do seu rei, Haakon VII. Aquela não era apenas a vitória de um grupo de homens, carregava também um significado político, pois a Noruega tornara-se num país independente havia meia dúzia de anos.

No que alguns interpretam como um gesto de arrogância - que não foi, conforme se justifica no seu diário -, Amundsen deixou no Pólo Sul uma carta para ser entregue ao seu rei (caso algo acontecesse à expedição no regresso) e uma carta para Robert Scott, a atestar que chegara. Deixou também víveres que já não iriam ser necessários. A expedição inglesa chegou cinco semanas depois, e Scott guardou as cartas deixadas por Amundsen.

O regresso à Baía das Baleias correu mais ou menos dentro do que Amundsen planeara. Os cães que morriam naturalmente serviam para alimentar os restantes, e a expedição planeara também matar alguns, no regresso, como modo de obter carne fresca. E assim o fizeram.

As expedições de Amundsen não pararam com a conquista do Pólo Sul. Em 1918, voltou ao Árctico para estudar a deriva dos gelos. Mas a ideia de ir também ao Pólo Norte não o abandonava. Durante a década de 1920, fez várias tentativas falhadas para o sobrevoar; só em 1926, a bordo do zepelim Norge, pilotado pelo italiano Nobile e com mais um explorador americano, o consegue fazer. As bandeiras de Itália, Noruega e EUA são lançadas sobre o pólo. Amundsen torna-se assim no primeiro homem a ter estado nos dois pólos do planeta.

Por esses anos, a vida não lhe corre como ele previra. Sem dinheiro para continuar as explorações, torna-se um homem azedo, que desdenha daqueles que antes foram seus amigos. Mas, como se o seu destino estivesse traçado desde há muito tempo, num dia de Maio de 1928 ele recebe a notícia de que o avião do italiano Nobile desaparecera no Árctico. Num gesto de grande altruísmo, Roald Amundsen organiza a equipa de salvamento, e embarca de Tromsø no seu hidroavião Lathan 47 em condições climáticas muito difíceis. A última vez que foi avistado foi perto do arquipélago Svalbard. O seu corpo e o avião nunca foram recuperados, apesar das várias tentativas, uma das últimas em 2004.

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