Governo estuda TGV em via única para cortar custo do projecto

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O comboio de alta velocidade está em estudo no Governo MANUEL ROBERTO

Confrontado com indemnizações e acordos internacionais, o Governo não vai parar o TGV, mas procura solução que permita salvar a face

O Governo está a estudar cenários para reduzir a participação do Estado no projecto da alta velocidade, mas já decidiu que este é para avançar pois, se o não fizer, haverá pagamento de indemnizações e perda de fundos comunitários. A pressão internacional, tanto de Madrid como de Bruxelas, também pesou na decisão de mandar prosseguir com o TGV, embora se ensaie agora uma solução mais barata que permita salvar a face a Passos Coelho, que, durante a campanha eleitoral, era um feroz opositor do projecto.

De acordo com várias fontes ligadas ao processo, o cenário mais provável neste momento torna Portugal no primeiro país do mundo que terá um TGV em via única - em vez de uma via ascendente e outra descendente para que os comboios circulem nos dois sentidos, far-se-á uma linha de via única entre o Caia e Poceirão, com um pequeno troço em via dupla, entre Évora e Vendas Novas, para permitir cruzamentos.

Além disso, a estação de Évora, no valor de 100 milhões de euros, e que contemplava um edifício desenhado por Souto Moura, será suprimida, sendo substituída por um projecto de menores dimensões.

A linha para mercadorias, em bitola (distância entre carris) ibérica, será construída entre Évora e a fronteira espanhola ao lado da linha de alta velocidade (em bitola europeia), tal como sempre esteve previsto.

Em Caia, Évora, Vendas Novas e Poceirão, serão montados intercambiadores que permitirão, aos comboios que ali circulem, adaptarem os seus rodados à bitola europeia ou ibérica, para haver maior flexibilidade na exploração.

Esta solução permitirá poupar entre 300 a 400 milhões de euros num projecto orçado em 1,4 mil milhões de euros. Parece pouco, mas é precisamente na componente do financiamento do Estado português que esta poupança se repercute.

Na verdade, a eliminação de uma das linhas no corredor de alta velocidade reduz em muito pouco os custos porque as expropriações, terraplenagens, pontes, viadutos e trincheiras serão feitas como se se tratasse de uma via dupla (que acabará sempre por ter de ser construída no futuro). A poupança limitar-se-á à menor quantidade de carris, balastro, postes e catenária, à não construção da estação de Évora, mas também a menores encargos financeiros, uma vez que o peso do financiamento da banca comercial será menor (o grosso do empréstimo para o projecto advém do BEI).

O sucesso desta solução - que não inclui o troço Poceirão-Lisboa, este sim relegado para as calendas desde o Governo anterior, sobretudo devido ao custo da Terceira Travessia do Tejo - dependerá das condições de exploração da linha de alta velocidade em via única. A via única reduz a capacidade de exploração da linha, mas isso não é particularmente grave se só ocorrer neste troço português (nos 400 quilómetros de trajecto espanhol até Madrid, é sempre em via dupla) e num cenário em que haverá apenas meia dúzia de comboios por dia em cada sentido.

Por outro lado, como a linha de alta velocidade também está apta para o tráfego de carga, Passos Coelho poderá dizer que está a ser coerente com a sua promessa de construir uma linha em bitola europeia para mercadorias.

Do ponto de vista político, a solução que agora está em cima da mesa deverá ser apresentada não como a prossecução do projecto de Sócrates, mas sim como uma vitória negocial e técnica do Governo que permitiu não desperdiçar fundos comunitários, construir a linha para mercadorias e, por acréscimo, a linha do TGV.

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