Hungria quer que as mães de menores tenham direito a dois votos nas eleições
O partido no poder e com maioria parlamentar diz que é preciso adequar as decisões políticas às gerações futuras. A ser aprovada, será uma lei sem precedentes numa democracia
No mundo democrático impera a regra "um indivíduo, um voto". Na Hungria, o partido no poder quer mudar a equação para "uma mãe, dois votos". A polémica proposta que discrimina os que optaram por não ter filhos foi apresentada pelo partido Fidesz - União Cívica Húngara, que desde que chegou ao poder, no ano passado, já abriu várias frentes de conflito.
"Vinte por cento da sociedade húngara é constituída por crianças. É um grupo considerável que fica de fora de tudo. O interesse das gerações futuras não é tido em conta na tomada de decisões", disse um representante do partido, o deputado József Szájer, explicando a opção.
Não se trata de uma novidade absoluta. Outros países já debateram as vantagens e desvantagens de dar mais do que um voto a quem tem filhos até aos 18 anos, uma fórmula conhecida por Sistema Demeny (de Paul Demeny, demógrafo americano que apresentou a teoria em 1986).
"Sabemos que, à primeira vista, esta é uma ideia invulgar - disse József Szájer -, mas nos anos 50 os negros não podiam votar e há cem anos também parecia invulgar as mulheres votarem."
Demeny argumentava que as crianças não podiam ser descartadas da realidade política durante 18 anos e que cabia aos pais velarem pelo seu futuro. Por isso, e para "tornar o sistema político mais adequado às gerações futuras", o demógrafo avançou a hipótese de cada filho significar meio voto. Se os pais tivessem opções políticas opostas, o total dos votos obtidos com os filhos seria dividido entre os dois progenitores.
Os filhos dos roma
O que o partido conservador e populista no poder na Hungria quer é diferente - quer atribuir apenas um voto extra, seja qual for o número de filhos, e apenas às mães. Isto para evitar um aumento muito considerável de votos entre a população roma (cigana), o grupo com maior taxa de natalidade na sociedade húngara. Uma possibilidade que foi mais mal recebida pela opinião pública do que a atribuição de dois votos a cada mãe de menores de 18 anos. "Espero que esta solução contribua para que esta seja uma lei de consenso", disse Szájer.O Fidesz considerou inscrever esta regra na nova Constituição, que foi ontem aprovada no Parlamento de Budapeste (ver caixa).
Mas a "questão roma" levou a que o partido do Governo optasse pela apresentação, muito em breve, de um projecto de lei.
Em 2003 e 2007 a Alemanha pôs em debate público a adopção do Sistema de Votação Demeny de forma a adequar melhor as suas políticas ao futuro. Em 2000, o Japão, país com uma das sociedades mais envelhecidas do mundo, já o tinha feito.
Em ambos os casos, o plano foi abandonado, porque, feitas as contas, foram encontrados mais contras do que prós: não há forma de garantir que os pais estão mesmo a usar o seu direito a votos extras em benefício do futuro dos filhos; tendencialmente, as políticas adoptadas iriam esquecer as necessidades da população mais idosa, com desvantagens no tecido social.
O Fidesz está convicto de que os benefícios minimizam os riscos e que conseguirá aprovar a lei. Até porque, no Parlamento, a maioria dos votos lhe pertence.