Bancos usaram Davos para pedir uma regulação mais branda

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Evento contou com uma grande presença de banqueiros JOHANNES EISELE/AFP

Com a confiança em alta, banqueiros voltaram ao Fórum Económico Mundial para dizer que há riscos em impor regras apertadas ao sector

Em Janeiro de 2009, os banqueiros evitaram pôr os pés em Davos, para não ouvir que eram os culpados pela crise financeira que acabara de rebentar. Um ano depois, o Fórum Económico Mundial debatia a regulação financeira e os grandes bancos tentaram passar despercebidos. Este ano, os banqueiros regressam em força a Davos e a confiança injectada pela recuperação mundial foi tal que puseram os seus interesses na agenda, alertando que a nova regulação do sistema financeiro pode prejudicar os bancos e a própria economia.

Se, no Fórum Económico Mundial do ano passado, parecia ter havido algum entendimento entre banqueiros e reguladores após meses e meses de recriminação mútua, a edição de 2011 veio pôr a nu as divergências.

Enquanto os reguladores ainda dizem que há muito trabalho pela frente - nomeadamente medidas preventivas sobre os bancos considerados demasiado grandes para falir -, os banqueiros deixaram o aviso: se a regulação for muito apertada, a capacidade de os bancos emprestarem dinheiro fica comprometida, o que terá consequências sobre o consumo, sobre o investimento e sobre o crescimento mundial.

Um dos episódios mais referidos em Davos foi o protagonizado pelo Presidente francês, Nicolas Sarkozy, que voltou a criticar de forma acesa os "culpados" da crise. Questionado pelo presidente executivo do JP Morgan, Jamie Dimon, sobre a regulação do sistema financeiro, Sarkozy aproveitou para lançar farpas aos banqueiros. "Grandes instituições financeiras, nas quais pensávamos que podíamos confiar, fizeram coisas que desafiam o senso comum", atacou Sarkozy. "O mundo ficou com dez milhões de desempregados, que não tiveram culpa e pagaram por tudo", salientou.

Numa sessão anterior do fórum, o presidente do JP Morgan tinha dito que era injusto colocar todos os bancos no mesmo cesto. Mas outros banqueiros foram mais longe, dizendo que as novas regras de regulação podem prejudicar a economia.

Aversão ao risco

"Os governos querem crescimento e, como não têm dinheiro para serem eles próprios a estimulá-lo, precisam mais do que nunca dos bancos para executar esse papel, mas, ao mesmo tempo, as autoridades querem mais capital nos bancos", disse em Davos Gray Parr, do banco de investimento Lazard. "Neste momento, já atingimos um rácio de capital que, para muitos bancos, pode criar um obstáculo ao crescimento futuro", acrescentou o presidente do banco italiano Intesa Sanpaolo, Corrado Passera.

Peter Sands, presidente da Standard Chartered, também aproveitou o fórum de Davos para deixar uma crítica aos reguladores: "Não é claro por que é que alguns reguladores, que já aí estavam antes da crise, acham agora que têm as soluções certas."

Além das declarações oficiais e à imprensa, os responsáveis de grandes bancos (JP Morgan, UBS, Credit Suisse, Barclays, Lloyd"s ou Nomura) tiveram dois encontros à porta fechada, um entre eles e outro com reguladores. Numa das reuniões houve mesmo uma intervenção do secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, a quem os bancos pediram uma maior clareza nas reformas regulatórias.

Se as ideias de Geithner forem as mesmas de um dos seus antecessores, Larry Summers (até há pouco tempo conselheiro económico de Obama), é bem provável que as preces dos banqueiros sejam ouvidas. Num almoço do Credit Suisse em Davos, Summers pediu cautela na imposição de regras mais apertadas aos bancos e afirmou que "é mais provável que o mundo venha a sofrer de excessiva aversão ao risco nos próximos anos do que o contrário".

Um executivo de topo da Goldman Sachs aproveitou mesmo a presença em Davos para alegar que as novas regras de regulação poderiam provocar a próxima crise, ao desviar actividades de risco para o sistema financeiro "sombra" - os hedge funds (fundos de investimento). Mas, numa altura em que a comissão de inquérito norte-americana para investigar a crise financeira mostrou que o Goldman foi um dos principais dinamizadores dos esquemas arriscados que puseram o sector à beira do colapso, os avisos do banco correm o risco de cair no vazio.

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