Torne-se perito

O próximo ano trará uma pequena revolução à Igreja Católica em Portugal

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Cardeais em Fátima durante a visita do Papa Bento XVI, a 13 de Maio ENRIC VIVES-RUBIO

Presidência do episcopado pode ir para bispo do Porto. Patriarca só deverá sair em 2013. Cinco dioceses com mudanças anunciadas. Uma pequena revolução no catolicismo português

Um ano de mudanças profundas no topo da hierarquia católica marcará 2011. Substituições de bispos anunciadas em várias dioceses (com Lisboa e Coimbra à cabeça) acontecerão a par de diversas iniciativas que a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) lançou e que pretendem, até final do ano, redefinir dinâmicas e estruturas da Igreja Católica em Portugal.

No início de Maio, renova-se a presidência da Conferência Episcopal Portuguesa: D. Jorge Ortiga, arcebispo de Braga, foi eleito pela primeira vez para o cargo em 2005, chegando em Abril ao fim do segundo mandato, não podendo ser reconduzido.

O bispo do Porto, D. Manuel Clemente, pode vir a ser o próximo presidente da CEP. Assim ele o queira. Há três anos, o próprio recusou ser vice-presidente, depois de inicialmente apontado numa votação indicativa dos seus pares, argumentando com a recente chegada ao Porto e a imensidão da tarefa de adaptação.

A favor de Clemente, 62 anos, com formação de historiador, joga a sua cultura e a proximidade humana. Os que já há três anos defendiam a sua candidatura dizem que o bispo do Porto tem capacidades intelectuais e pessoais reconhecidas também fora da Igreja e uma capacidade de entusiasmar outros que poderia dar à CEP um novo dinamismo. A notoriedade pública redobrada no último ano, quer pela nomeação como Prémio Pessoa de 2009, quer pela publicação de várias obras sobre o catolicismo e a cultura portuguesa, confirmaram estes argumentos.

Contra ele, dizem observadores com quem o PÚBLICO falou, poderia estar apenas o facto de os outros bispos preferirem alguém que não seja já protagonista do palco mediático.

António Marto, 63 anos, bispo de Leiria-Fátima, é outra hipótese forte para o lugar, tendo em conta o prestígio de que goza entre o episcopado. Antigo aluno do actual Papa Bento XVI, Marto é um homem da teologia - chegou a ser vice-director da respectiva faculdade na Universidade Católica. Contra ele tem o facto de não ter tanta apetência pelo espaço mediático e ser menos "político".

Patriarca mais dois anos

Nas dioceses, há pelo menos cinco mudanças em perspectiva, a mais importante das quais é Lisboa. Em Fevereiro, o patriarca de Lisboa atinge os 75 anos, idade apontada pelo direito canónico para que um bispo apresente ao Papa o pedido de resignação.

Sabe-se, no entanto, que D. José Policarpo ficará no cargo pelo menos mais uns dois anos. O próprio já terá recebido essa indicação do Papa Bento XVI. Além de já o ter dito a vários padres, o patriarca afirmou há dez dias, em entrevista à Visão, que "ainda é cedo" para o "totopatriarca". Também o núncio do Vaticano em Lisboa já terá comunicado ao cardeal e a várias outras pessoas que D. José ficará pelo menos até 2013.

Na sucessão do patriarca já se fala de nomes: Manuel Clemente, António Marto e Carlos Azevedo, bispo auxiliar de Lisboa e presidente da Comissão da Pastoral Social, estão entre eles. O arcebispo de Évora, D. José Alves, pode ser outra hipótese - mas o nome pode também surgir de algum dos novos auxiliares que venham a ser nomeados, tendo em conta os dois ou três anos que faltam até à decisão final.

Na referida entrevista à Visão, o patriarca "queima" dois dos nomes nas suas preferências (mesmo sabendo que a decisão passa sobretudo pelo núncio do Vaticano em Lisboa): Carlos Azevedo e Manuel Clemente. Sobre o bispo do Porto afirma o cardeal, a propósito do Prémio Pessoa: "Que D. Manuel o merece está fora de questão. Eu desconfio mais da intenção de quem o escolheu, como premiado, do que da simplicidade com que ele o aceitou."

Carlos Azevedo é criticado indirectamente pelo patriarca, quando este se distancia claramente da nota dos bispos publicada antes do Natal e na qual se tecem duros reparos ao poder político. O autor principal do texto terá sido D. Carlos Azevedo. "Esse não é o meu estilo. A nota aprovada roça muito a crítica política", afirma o patriarca sobre o documento.

Repensar a acção da Igreja

Já à espera de sucessor estão os bispos de Coimbra, Bragança e Lamego, que completaram 75 anos em 2010. Vila Real, cujo bispo perfaz a idade canónica para a resignação em Maio próximo, tem já o substituto designado. O actual titular, Joaquim Gonçalves, teve problemas cardíacos há três anos que o obrigaram a um transplante.

A escolha do nome para Coimbra, que deverá ser feita já em Fevereiro, pode recair em Carlos Azevedo. O bispo da Pastoral Social foi objecto de um "boato", como dizem algumas vozes, de que iria para um cargo em Roma, tendo em conta o sucesso da coordenação da visita do Papa a Portugal, por ele assegurada.

A par destas substituições, as dioceses de Lisboa e Porto esperam também a nomeação de, pelo menos, um bispo auxiliar cada - em Lisboa, um dos auxiliares morreu em Setembro e, no Porto, um outro completou 75 anos este mês. Em Lisboa, fala-se de dois nomes - que não colhem a simpatia de vários membros do clero e de leigos ouvidos pelo PÚBLICO: Nuno Brás, actual responsável da equipa formadora do Seminário dos Olivais, e Francisco Tito Espinheira, vigário-geral do patriarcado.

Em paralelo a estas mudanças na hierarquia, a CEP promoverá a realização de uma sondagem nacional sobre a Igreja e o catolicismo, bem como um recenseamento do número de pessoas que vão às missas de domingo.

Para dentro da Igreja, com o objectivo de colocar paróquias, grupos e movimentos a debater o futuro, a Conferência Episcopal apresentou em Junho um documento de trabalho intitulado Repensar juntos a pastoral da Igreja em Portugal. Até Março próximo, a CEP pretende que o máximo de estruturas católicas que assim o entendam dêem a sua opinião sobre o texto, que para já apresenta apenas enunciados genéricos: formação cristã, empenho criativo, nova evangelização, novas formas de exercício do ministério sacerdotal e reorganização das comunidades cristãs (mas sem falar da eventual reorganização das dioceses ou paróquias).

Em Novembro, a partir das respostas recebidas, a CEP definirá orientações comuns para todas as dioceses. Em 2014, será avaliado o caminho percorrido.

A pequena revolução está lançada, resta saber onde irá parar.

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