Vaticano prepara "circular" aos bispos com "programa eficaz" sobre pedofilia

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Foi a primeira vez que a pedofilia foi discutida a tão alto nível TONY GENTILE/REUTERS

Documento deverá falar do exemplo do Papa "na escuta e no acolhimento das vítimas", e na "atenção que deve ser tida na selecção e formação de futuros padres e religiosos"

O Vaticano está a preparar uma "circular" aos bispos católicos de todo o mundo onde será definido um "programa coordenado e eficaz" contra a pedofilia praticada por clérigos, anunciou ontem à noite a Santa Sé, no fim de uma reunião que juntou o Papa e 150 cardeais, entre os quais os 24 que hoje serão investidos por Bento XVI.

Na intervenção ao final da tarde, o cardeal William Levada, que substituiu o Papa na Congregação para a Doutrina da Fé, referiu que a carta será enviada às conferências episcopais de cada país. O documento, de acordo com a AFP, incluirá "directivas para um programa coordenado e eficaz" contra a pedofilia.

De acordo com a síntese fornecida pelo Vaticano, Levada evocou "o exemplo" do Papa "na escuta e no acolhimento das vítimas", falou da "colaboração com as autoridades civis" e da "atenção que deve ser tida na selecção e formação dos futuros padres e religiosos" - tema em que Bento XVI e o Vaticano têm insistido.

Foi o primeiro debate alargado sobre o tema, a este nível. Em Abril de 2002, João Paulo II reunira os cardeais dos Estados Unidos para debater a vaga de escândalos naquele país e estudar medidas a tomar. Em Fevereiro deste ano, Bento XVI convocara os bispos irlandeses com o mesmo fim.

Ontem, foi sugerido encorajar as conferências episcopais a "desenvolver planos eficazes, articulados, completos, de protecção de menores", mesmo em países onde a questão não se manifestou de forma dramática.

Há um ano, a revelação de abusos sexuais cometidos por padres na Irlanda trouxe uma cascata de novos casos na Alemanha, Holanda e Bélgica. Nestes países, a própria Igreja Católica criara comissões para averiguar a situação.

E fora do Ocidente?

Antes, sobretudo ao longo da década de 90 do século XX, já tinham sido denunciados casos nos EUA, Canadá, Austrália, México e Áustria. O cardeal norte-americano Bernard Law, de Boston, foi o primeiro responsável católico forçado à demissão, depois de ter protegido vários padres pedófilos. Nos EUA, a Igreja teve que pagar dezenas de milhões de dólares para indemnizar vítimas.

O cardeal André Vingt-Trois, arcebispo de Paris, referiu que foi sugerido por vários participantes que se verifique o que se passa também nos países não ocidentais. É preciso "consultar as conferências episcopais desses países, para ver o que se passa", afirmou.

A questão da liberdade religiosa foi também tema de debate, tendo em conta o massacre de 46 cristãos (incluindo dois padres) em plena missa, a 31 de Outubro, no Iraque, e a condenação à morte da cristã Asia Bibi.

No seu discurso de abertura, o Papa referiu-se também à laicização das sociedades ocidentais, que ameaça "destruir a liberdade religiosa, propondo-a como uma "verdadeira "ditadura"".

Ontem foi ainda anunciado que o Papa deverá efectuar em 2011 a terceira visita à Alemanha, seu país natal. A viagem incluirá Berlim, Friburg im Brisgau (Sudoeste) e Erfurt, onde nasceu o iniciador da Reforma protestante, Martinho Lutero.

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