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Jovens adoptados usam Facebook para falar com pais biológicos

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As consequências dos contactos não planeados são preocupantes THIERRY ROGE/REUTERS

No Reino Unido já houve vários casos. Em Portugal, oficialmente, ainda não é conhecido nenhum, mas a questão já é discutida

Nuns casos, foram os pais biológicos que os detectaram através do Facebook, mas a maior parte das vezes foram os próprios jovens, adolescentes ainda menores adoptados, que, sabendo o primeiro e último nome dos pais biológicos, os encontraram. Não será a primeira vez que se ouve esta história, mas a diferença é que já não é preciso sair do quarto, ir a outra cidade ou descobrir uma morada para encontrar alguém: com poucos dados, estamos todos à distância de um clique, mesmo separados por muitos quilómetros.

Embora em Portugal, segundo o presidente do Instituto da Segurança Social, Edmundo Martinho, não tenha ainda sido reportado qualquer caso semelhante, no Reino Unido já foram identificados vários. De acordo com um artigo publicado em The Guardian por Eileen Fursland, jornalista e escritora com dois livros sobre o tema (Facing up to Facebook: a Survival Guide for Adoptive Families e Social Networking sites and Adoption), há inúmeras situações de jovens que contactaram os pais biológicos e outras, em menor número, em que foram os pais a procurar os filhos que deram para adopção, através do Facebook.

Verdades incómodas

No artigo, há vários testemunhos destes contactos e os assistentes sociais mostram-se preocupados com as consequências que contactos não planeados podem ter, a nível emocional, não só para o jovem, como para toda a gente envolvida. A descoberta de verdades incómodas, reveladas sem preparação, e a gestão de sentimentos contraditórios são algumas dos efeitos que, sem mediação, podem ser difíceis de controlar.

Um assistente social citado no artigo diz que em North Yorkshire já há dezenas de casos de crianças a seguir o rasto dos pais biológicos e que, todas as semanas, recebe telefonemas de pais adoptivos em pânico por se aperceberem que os filhos têm mantido esse contacto.

A adolescência, sobretudo entre os 14 e 15 anos, parece ser a idade mais vulnerável a este tipo de aproximações.

No Reino Unido, já houve mesmo uma conferência intitulada Facing up to Facebook à qual foram mais de cem assistentes sociais, interessados em perceber como proteger as crianças e adolescentes e como aconselhar as famílias nestes casos. Para Outubro, está a ser planeada uma outra conferência em Manchester.

Acompanhamento

Tanto no Reino Unido como em Portugal, o jovem é acompanhado durante o processo de descoberta das suas origens. Embora a legislação portuguesa não o regulamente "de forma expressa", é "prática dos serviços de adopção, o enquadramento psicológico dos jovens adultos que solicitam a consulta dos seus processos de adopção": "Em regra, após a autorização concedida pelo tribunal para consulta quer do processo judicial quer do processo administrativo de adopção, o interessado é acompanhado nessa pesquisa por um técnico do serviço de adopções", esclarece Edmundo Martinho por e-mail.

A ausência destes cuidados, quando o contacto é feito através de redes sociais como o Facebook, é uma das principais preocupações dos técnicos. "De qualquer forma", acrescenta Edmundo Martinho, "nos programas de formação para a adopção, os candidatos a pais adoptivos recebem informação" sobre as formas de "trabalhar a revelação da situação de adoptado com os seus filhos, de modo a preparar uns e outros para a eventualidade de qualquer tentativa de encontro da parte dos pais biológicos", aprendendo ainda maneiras de "acompanhar os menores nas suas perguntas e investigações sobre as suas origens".

Potenciar o risco

Embora reconhecendo que "o Facebook e de uma maneira geral as redes sociais potenciam o risco de se estabelecer um contacto não planeado e não autorizado entre pais biológicos e crianças adoptadas", Edmundo Martinho defende que, se "os pais e filhos tiverem uma adequada preparação para lidar com as histórias de vida passadas, essa circunstância não apresenta maior perigosidade do que muitos outros contactos" estabelecidos através da Internet.

"Não penso que esta questão tenha autonomia relativamente aos outros riscos já suficientemente identificados da utilização da Internet por crianças e adolescentes e para os quais os pais devem receber a necessária preparação, para estarem atentos e poderem controlar a utilização das redes sociais por filhos adolescentes, e minimizar esses riscos", diz o presidente do Instituto de Segurança Social.

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