Joe Sacco no buraco negro de Gaza

Foto

Costuma dizer-se que Joe Sacco (nascido em Malta, em 1960, e há muito residente em Portland, Oregon, EUA) inventou a reportagem de guerra em BD. Foi o que fez, por exemplo, em "Palestina" (publicado em Portugal), ou em "Safe Area Gorazde" (ainda por publicar em Portugal, mas com uma edição brasileira, "Área De Segurança Gorazde - A Guerra da Bósnia Oriental 1992-1995", pela Conrad do Brasil).

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Costuma dizer-se que Joe Sacco (nascido em Malta, em 1960, e há muito residente em Portland, Oregon, EUA) inventou a reportagem de guerra em BD. Foi o que fez, por exemplo, em "Palestina" (publicado em Portugal), ou em "Safe Area Gorazde" (ainda por publicar em Portugal, mas com uma edição brasileira, "Área De Segurança Gorazde - A Guerra da Bósnia Oriental 1992-1995", pela Conrad do Brasil).

No seu mais recente trabalho, "Footnotes in Gaza" (2009), Sacco vai mais fundo, em direcção a um buraco negro da História: dois massacres acontecidos em 1956 na Faixa de Gaza, que iam ser esquecidos como notas de rodapé. No primeiro, Khan Yunis, o exército israelita terá morto 275 palestinianos de forma rápida. No segundo, Rafah, mais de 100 palestinianos terão ficado sem vida ao longo de um dia em que muitas outras pessoas foram espancadas e maltratadas. Joe Sacco entrevistou dezenas de sobreviventes e testemunhas, cruzou fontes documentais e orais, e depois passou seis anos a desenhar e a escrever. "Footnotes in Gaza" é não apenas reportagem de guerra, mas também jornalismo de investigação. Um grande livro: para quem não entende como os palestinianos vêem os israelitas; para quem quer saber o que vai na cabeça dos que estão vivos; para quem se interessa pela memória humana. Sem nunca se fechar ao presente, Sacco mostra como o passado é o futuro. Entrevista ao telefone, a partir de Portland.

Porque escolheu esta história, especificamente? Porque não era tão conhecida?

Em 2001 fui a Gaza com um amigo jornalista, Chris Edges, para a revista "Harper". E se esta parte da história tivesse ficado na reportagem que foi publicada talvez eu não tivesse feito o livro. Pensaria: "Bem, pelo menos isto foi contado." Mas, fosse por que razão fosse, a revista deixou cair a parte do relato histórico em favor do que se estava a passar em Gaza. Eu detesto ver a História perder-se. Havia gente viva que ainda se lembrava destes episódios e praticamente nada tinha sido escrito. Pensei: "Isto não pode ficar perdido. Há muita história sobre este conflito, lemos tanto sobre ele, porque é que estes dois massacres não existem no registo geral?" Então achei que era um desafio jornalístico realmente bom, que valia mesmo a pena. Incidentes como estes constroem a História do conflito. Afectam a forma como gerações inteiras o vêem, o que as pessoas que viveram estes incidentes pensam dos israelitas, como educam as crianças, o que lhes dizem.

Os palestinianos que encontra vão-lhe perguntando: porque é que está preocupado com 1956 quando a minha casa está a ser demolida ou o meu marido está a ser morto? É uma tensão que também reflecte a do leitor. Mas o incrível do livro é como 1956 volta à vida, e ao mesmo tempo se abre a todas as histórias do presente.

Sim, houve pessoas que continuaram a pôr em causa eu estar a focar-me em episódios históricos. Mas como eu disse a uma delas: um dia a sua história também será esquecida. O interessante sobre a experiência palestiniana é que são camadas de história, incidentes uns em cima dos outros. O que se passa no presente importa mais às pessoas que estão a viver as coisas agora, claro, do que o que aconteceu no passado, mas é um "continuum" de acontecimentos.

O que faz neste trabalho é congelar um momento, e ao mesmo tempo isso é um pretexto para tudo vir ao de cima.

Sim, quis mostrar que, ao mesmo tempo, muitas coisas estavam a ser atiradas para cima de mim. Muitas coisas vêm ao de cima, é quase esmagador.

O momento no passado é uma porta para o presente e para o futuro. De certa forma, um buraco negro.

É exactamente isso. Estou a tentar ver o que foi específico num momento, mas reconheço que até para os palestinianos... não é que seja irrelevante, simplesmente há demasiadas coisas com que têm de lidar no presente. Os palestinianos ainda não tiveram uma pausa para olhar a História.

Mesmo que as pessoas não estejam interessadas no caso palestiniano, podemos ver este livro como um trabalho sobre a memória. O que aprendeu sobre a forma como as pessoas se lembram das coisas, e sobre o tipo de coisas de que se lembram?

Ao falar com estas pessoas mais velhas, o que ficou claro é que geralmente são os momentos mais agudos que recordam. É mais fácil lembrarem-se de dois segundos dolorosos do que, por exemplo, de dez horas de espera, sentadas no chão, com a cabeça dobrada. Por isso tenho toda a sequência dos homens a serem espancados com paus [pelos soldados israelitas] ao passarem o portão, porque quase toda a gente com quem falei se lembra disso. Aconteceu a todos. E é isso que sobresssai. Frequentemente, era a primeira coisa de que me falavam. E depois era preciso voltar atrás e dizer-lhes que gostava de ouvir a história desde o princípio.

A sequência das pauladas é muito forte, com muitos testemunhos. É quase inacreditável, em função do que sabemos sobre o conflito. Porque é que aquilo estava a acontecer? Não achou bizarro?

Achei bizarro, e tentei mostrar o contexto. Que havia guerrilheiros de Gaza a entrar [em Israel] e que os israelitas estavam a retaliar. Havia muita tensão e claramente os israelitas estavam frustrados com [a sua incapacidade para neutralizar] a guerrilha. Mas é sempre difícil para mim perceber a psicologia de espancar as pessoas ou de as matar desta forma. Consigo explicar muito do "background", mas não a psicologia.

Sim, a tensão é muito clara, não me refiro ao que levou ao massacre. Mas é estranho ver aquela longa sequência de pauladas. Aqueles soldados não parecem israelitas. Parece um tal desperdício de energia e de força sem que aparentemente haja um objectivo racional.

Talvez. Mas hoje podemos dizer exactamente o mesmo. Há algum motivo racional para manter o bloqueio a Gaza quando o Hamas é poderoso exactamente por causa do bloqueio, e pode trazer dinheiro e o que precisa com os túneis? Se o objectivo de Israel é danificar o Hamas, não há lógica para o bloqueio. Se olharmos para a História, vemos que há muitos actos irracionais. Quando desumanizamos outras pessoas, podemos realmente tratá-las muito mal. Conhecendo a história entre israelitas e palestinianos, surpreende-me a escala do que aconteceu em Khan Yunis e Rafah em 1956, mas em 1948 houve outros massacres, aldeias inteiras limpas do mapa, como Deir Yassin.

O que é brutal neste trabalho é os detalhes serem tão esmagadores. Como não vimos muito do que aconteceu no passado, estas imagens surreais, irracionais, tornam a história incrível.

Eu acho que esta é uma história extraordinária. Quando comecei a compreender o que se passou, foi uma surpresa [verificar que] nenhum outro repórter ou historiador tinha olhado para aquilo. O documento da ONU que dedica alguns parágrafos a estes casos torna claro que havia largo número de civis mortos. E quando estava a ouvir as histórias, a primeira vez que percebi que as pessoas estavam a levar pauladas no portão.... De alguma forma, alvejar pessoas na rua é mais compreensível. Dar-lhes pauladas na cabeça parece um passo além do que estou habituado a ler.

Quanto tempo ficou lá?

Foram quatro viagens a Gaza. A primeira com Chris, da qual sobra muito pouco no livro, talvez um capítulo. Depois, a primeira viagem grande de duas semanas, para ter a certeza de que conseguia fazer a história, para encontrar o meu guia, Abed, que se tornou meu amigo. Fiquei em Khan Yunis essas duas semanas, e a maior parte da história de Khan Yunis reuni-a então. Depois parti, e voltei mais dois meses para Rafah.

Estamos a falar de que ano?

As viagens principais foram de Novembro de 2002 a Março de 2003.

Abed é extraordinário. Ficou tão envolvido na história como você? São como companheiros.

E fomos. Foi muito mais do que alguém que traduzia palavras. Ele é um tipo muito esperto, teve uma boa educação, e muito rapidamente se tornou tão... não quero dizer obcecado, mas concentrado no que estávamos a fazer. Compreendeu que eu realmente queria a história a sério, não queria tretas. Portanto, começou a dizer-me quando desconfiava de uma história, ou se uma pessoa se contradizia. Era muito bom nisso, como um barómetro. Porque eu não compreendo a língua, ele era aquele que podia olhar para as pequenas subtilezas do que as pessoas estão a dizer, e perceber se estavam só a tentar agradar-nos. Foi um filtro importante.

Quanto tempo passou depois a escrever e desenhar?

Seis anos. Mas pelo meio fiz algumas peças jornalísticas que me roubaram um mês aqui e ali, estive no Iraque. Nos últimos quatro anos não fiz mais nada se não trabalhar no livro.

Quantas horas de gravação trouxe?

Uh! Não sei. Há muitas gravações, 70 ou 80. Levei seis semanas a desgravar tudo. Não quis entregar isso a ninguém. É importante ouvir outra vez, é uma forma de rememorar. Porque sabia que era uma matéria muito sensível, gravei quase todas as conversas.

E quantas fotos para depois desenhar tudo? Estamos a falar de centenas de pessoas.

Algumas centenas, não sei quantas.

Comparado com tudo isso, escrever um livro parece fácil.

Fui aos arquivos da UNRWA [a agência da ONU para os refugiados palestinianos] em Gaza, e eles têm um arquivo fotográfico e passaram-me todas as imagens de como eram os campos de refugiados nos anos 50. Especificamente Khan Yunis e Rafah.

Mas há também todas as caras das pessoas que entrevistou.

Pareceu-me importante que, quando alguém aparece a falar outra vez, aparecesse a cara. Porque quando estou a ler um livro com nomes árabes, ou quaisquer outros nomes, às vezes esqueço qual foi a pessoa que disse aquilo há dez páginas, especialmente num livro com muita gente. É mais fácil reconhecer uma cara do que um nome árabe.

Tudo isso implicou grande quantidade de trabalho manual, num tempo em que tudo é digital, rápido. Tomou-lhe seis anos de vida, com tudo feito à mão. É raro.

Obrigado. Mas ainda agora li um livro sobre Miguel Ângelo, e ele só demorou quatro anos a fazer a Capela Sistina! [risos].

Hoje, é quase subversivo.

É a única forma que conheço de fazer as coisas. Por princípio, não gosto de atalhos. Desenho tudo à mão, gosto do cheiro a tinta, gosto do som da caneta no papel.

Faz à mão todas as palavras do texto, também?

Sim.

Nos agradecimentos, diz que a sua agente o ajudou na crise de meio-livro, quando não sabia se tinha de vender as suas coisas no e-bay. Como se sobrevive quando se passa seis anos a fazer um álbum destes?

Houve tempos difíceis, mas esta não foi a vez mais difícil. Com os trabalhos que fiz pelo meio ganhei uma boa quantidade de dinheiro. No livro sobre a Bósnia ["Safe Area Gorazde", 2000] não tinha mesmo dinheiro, não sabia como ia pagar a renda do mês seguinte. Este não foi nem de longe tão difícil, porque já tenho um pouco de reputação, e, a meio, se precisava de trabalho, podia ir ter com a minha agente, dizer-lhe: "Tenho esta ideia, podes encontrar-me uma revista que esteja interessada?". E ela tratava de tudo. Há 15 anos isso não era sequer uma opção. Ninguém estava interessado.

A certa altura, no livro, define-se como "um homem dos jornais" por natureza. E "Footnotes in Gaza" revela uma fantástica fé no jornalismo.

Estudei jornalismo na universidade, e realmente queria escrever notícias, era a minha motivação. Não era escrever "features", ou críticas.

Perante a actual desconfiança em relação aos jornalistas, é muito revitalizante.

É o que sinto. Acho que há espaço para jornalismo de investigação. E no fim de contas é o que isto é. E acho que as pessoas querem este tipo de coisas. Não quero saber o que dizem os "focus groups". Podem pensar que as pessoas só conseguem ter atenção a 150 palavras sobre qualquer assunto. Não acredito realmente nisso. Há um público para isto. Temos de pôr algum esforço na forma como contamos a história, para manter o leitor interessado, mas acho que há um desejo de ler estas coisas.

Como nos livros anteriores, o autor está sempre dentro da história, o que permite aos leitores projectarem-se na sua honestidade. Quase no fim, pensa com vergonha, ao olhar para um homem que acaba de lhe contar coisas terríveis, que se "perde alguma coisa ao longo do caminho", ao reunir e dissecar todas aquelas provas. O que é que se perde?

Entramos na história porque realmente estamos interessados nela e nas pessoas, acreditamos que aquilo realmente importa. Mas qualquer jornalista, ao tentar reunir os elementos o melhor possível, acaba por não ter espaço para pessoas que não se lembram, que se perdem; está a tentar ter factos, a confrontá-las, e há algo quase impiedoso nisso.

É necessário. Às vezes sentimos que temos uma grande história, estamos quase eufóricos, mas a grande história é sobre algo horrível.

Exacto. É a essência das dúvidas que os jornalistas têm no terreno.

Há planos para traduzir "Footnotes in Gaza" em árabe ou hebraico?

Há um editor árabe que o vai publicar, no Líbano. A minha agente conseguiu isso. Em hebraico não creio, mas claro que estaríamos interessados.

Acha que este livro seria bem vindo em Israel?

Sinto que em Israel há mais debate, mais consciência deste tipo de coisas do que, por exemplo, nos EUA. Tive boa atenção crítica nos EUA, mas em geral as pessoas são muito cautelosas quanto ao que dizem sobre Israel, enquanto em Israel são mais livres. Acho que o público israelita estaria disposto a receber isto. Eles sabem que estas coisas estão a acontecer. É uma guerra brutal, e eles percebem isso. Não é que não estejam conscientes da sua história. Mas foi muito difícil fazer pesquisa da perspectiva israelita. Tive Mordechai Bar-On [um antigo braço direito do então ministro israelita da Defesa, Moshe Dayan] a explicar a posição israelita, contratei dois investigadores para trabalharem nos arquivos israelitas, falei com muita gente que esteve no comando em 1956.

Porque foi difícil?

No fim de contas, trata-se de um massacre. E é difícil pôr as pessoas a falar disso. Não estou sequer a sugerir que as pessoas com quem falei sabiam do que aconteceu, porque podem acontecer muitas coisas numa guerra que se move rapidamente. Acontecem e afastamo-las do espírito. Mordechai Bar-On diz: "Sim, ouvi falar de uns 100 palestinianos civis mortos, mas não sei bem onde. Há tanta coisa a acontecer".

É uma abstracção.

É. Estamos a falar de um conflito com décadas, em que aconteceram muitas coisas destas. E quando contratamos investigadores... Se for eu, sei que posso ir até ao limite; se contrato alguém tenho de confiar, não sei quanto trabalho vai fazer.

Mas gostaria que este livro chegasse a um público israelita, e que alguns historiadores israelitas decidissem fazer mais investigação.

Teve leitores israelitas a escrever-lhe?

Não tive muita reacção de leitores em Israel. Tive de leitores judeus na América. Fiz algumas apresentações do livro, e em três ou quatro ocasiões aconteceu haver gente a levantar-se e a falar de outras coisas. Até citavam o Holocausto. Não se referiam aos factos que trago ao de cima. Acho que os motivos eram sinceros, mas basicamente estavam a mudar de assunto. Mas também tive boas reacções de judeus.

Sente alguma mudança na visão "mainstream" sobre este conflito? Porque desde 2003 muitas coisas mudaram, mesmo na América. Diria que a visão "mainstream" está um pouco mais à esquerda?

Acho que sim, um pouco. Os americanos ainda questionam muitos motivos palestinianos, até certo ponto ainda associam os palestinianos a terrorismo, mas acho que estão um pouco mais desconfortáveis em relação a Israel, especialmente desde o ataque a Gaza em 2008-09, e este ataque recente à frota [turca]. A minha sensação é que muitos americanos estão mais cautelosos em relação a Israel e não tão dispostos a acreditar na posição israelita. Onde as coisas não mudaram foi ao nível da política americana. No Senado, no Congresso. Os políticos parecem sempre estar presos à posição israelita.

Obama está a fazer alguma diferença?

[Pausa] Quase qualquer posição será melhor do que a de Bush, mas acho que Obama tem sido muito decepcionante. Não podemos só olhar para os anos Bush, que parecem perversos comparados com a tendência geral americana, que tem sido realmente de apoiar a política israelita e proteger Israel das sanções da ONU. O relatório Goldstone, por exemplo [sobre a guerra em Gaza 2008-2009]: a administração Obama veio muito rapidamente dizer que não era um relatório equilibrado. Isto é a administração Obama. Acho que nisso revelaram a habitual cobardia americana.

A Gaza do livro de certa forma já não existe. Desde 2007, a luta entre o Hamas e a Fatah é muito forte. Voltou?

Não, tento manter-me a par com as pessoas de lá, vou lendo. É outra parte do problema: a luta entre Hamas e Fatah realmente complica tudo. Se temos os palestinianos divididos, ainda temos menos chances de chegar a algum lado.

Desde que lá esteve houve a retirada dos soldados e dos colonos do interior de Gaza, e a divisão Fatah-Hamas. É incrível como as coisas se movem tão rápido e ao mesmo tempo não mudam de todo.

É a ironia da situação. Posso ler este livro e pensar: tantas coisas mudaram. Mas este conflito parece interminável.

"Não há dúvida sobre quem está a vencer, a questão é quão longe levarão os israelitas a sua vitória, e quanto podem os palestinianos aguentar a sua derrota", escreve no livro. Podia escrever isto hoje, e ainda mais.

Sim, ainda mais! Talvez as coisas mudem. Quem pensaria que a URSS colapsaria, que o "apartheid" acabaria? Mas este conflito parece ser realmente difícil.

Ficou pior e pior?

Pior e pior. Há a divisão de que falámos. E, claro, o projecto de colonatos [em Jerusalém e na Cisjordânia] continua. Não haverá paz enquanto os colonos continuarem a tomar terra.

Quando volta de um investimento de tempo tão grande naquele lugar, sente que é muito difícil falar com os seus amigos americanos sobre o que se passa lá?

É difícil explicar porque provavelmente não sou bom a explicar. Quando volto, as pessoas perguntam que tal foi, eu começo a contar, e ao fim de uns minutos elas distraem-se. Porque falo com toda a paixão, e para quem ouve é um pouco excessivo. É melhor comunicar com o meu trabalho. Tenho suficiente experiência para manter o leitor comigo. É mais difícil manter comigo um amigo.

No livro há todos estes momentos de descompressão, como a matança do touro, as festas, o riso. Mas porque é nunca vemos os seus olhos, só os óculos, opacos?

[Hesitação] Soa um pouco pateta, mas uma das razões por que comecei a fazer BD autobiográfica foi querer mostrar alguns aspectos meus, mas não todos. Não mostro os meus sentimentos pessoais, a não ser que isso seja importante para a história.