Torne-se perito

Bassorá, a cidade que perdeu a glória

É quase como uma ruína, mas olha para o futuro

Bassorá já foi uma grande cidade. Hoje, é uma cidade grande com pouca glória e muitos planos. Tem 3,5 milhões de habitantes. Tem a maior parte do petróleo do Iraque. Tem o maior porto do país e é atravessada pelo Shat-al-Arab, onde se encontram o Tigre e o Eufrates, os rios que viram nascer as primeiras civilizações e nunca tiveram tão pouca água.

A segunda maior cidade do Iraque foi pilhada e bombardeada na invasão de 2003. Em 2004, teve atentados, poucos. Em 2005, foi palco de batalha entre milícias xiitas e tropas estrangeiras. O Governo derrotou as milícias. Os britânicos saíram em 2007. As batalhas que sobram são políticas e fazem-se quase sem disparos.

Mas a cidade quase parece uma ruína. Há bairros com casas destruídas e lixo no chão e cabras a roer o que podem. A corniche (marginal) perdeu o brilho. Tem cafés e a City of Games com uma roda gigante, mas, quando falta a electricidade, até a roda se apaga. Nas ruas do centro, há edifícios sem paredes onde polícias se abrigam à noite.

No fim de Junho, já estavam mais de 50 graus e, sem electricidade - a rede pública só garante seis horas por dia -, não funcionam frigoríficos nem ventoinhas. Para não ficarem loucos, os habitantes decidiram protestar. A polícia matou dois a tiro. "Eu fui uma das primeiras manifestantes, mas, quando vi que não havia mais mulheres, voltei para casa", diz Fatimah Khadum, directora da ONG Iraqi Al-Firdaus Society.

Fatimah, casada e com três filhos, não conta com o Governo nem com o conselho de província nem com o município. "Não tenho nenhum optimismo. Até agora, não há Governo, e os projectos que existem estão parados. Nem serviços básicos há, e, quando as pessoas se manifestam pacificamente, eles matam-nas."

Projectos para Bassorá há muitos e muito se fala do dinheiro que o petróleo trará. O professor Masjid al-Masthar não nasceu em Bassorá, como Fatimah. Nasceu na província da Babilónia e viveu toda a vida em Bagdad. Chegou a Bassorá em 2007, depois de um grupo de extremistas sunitas lhe raptar e matar um filho. Era director do Departamento de Inglês da Universidade de Mustansiriya, agora ensina na de Bassorá. Vive com a mulher e com a filha mais nova na casa ao lado da filha mais velha, casada, com três filhos. "Aqui, a vida é simples. As pessoas são cordiais."

Masthar conheceu o inferno em Bagdad. Amealhou dez mil dólares dos 100 mil que lhe pediam, e para nada, o filho já era um cadáver. Para este professor quase na reforma, a invasão trouxe um bom ordenado e depois o inferno. Em Bassorá tem paz, e isso chega-lhe, com ou sem reconstrução. "Eles precisam de professores e aceitaram-me logo. As condições de segurança são melhores, as oportunidades também. Falam muito de encorajar o investimento. Agora começaram a construir a Cidade do Desporto, em 2013 a cidade vai receber os Jogos Asiáticos."

Para ter sempre ar condicionado na casa do bairro de classe média de Junaira, Mashtar conta com a rede nacional, mais um gerador de rua e um de casa, instalado no pequeno jardim onde os dois netos mais pequenos chapinham numa piscina insuflável. "No tempo de Saddam, cada casa tinha uma televisão. Agora há casas com seis ou sete. As estradas são as mesmas, pequenas, e agora há mais carros. O que é que o Governo pode fazer?" Do jardim do professor, Bassorá é um pequeno paraíso cheio de futuro. S.L.

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