Bilhete de Colares

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Comecei a reler os Bilhetes de Colares de José Cutileiro, um escritor que admiro quase tanto como Vasco Pulido Valente, em ambos os sentidos.

Li-os todos quando saíram, mas não reconheci nenhuma frase: cada uma era uma bomba de prazer. Na edição da Assírio & Alvim são delícias inusitadas. E avisos: "Ninguém compra o jornal para ler elogios seja de quem for. A gente compra um jornal para se confortar com a desgraça dos outros. Já alguma vez se ouviu falar de uma coluna de bendicência?"

Estou tramado. É que, entretanto, viemos morar para Colares e, de repente, tudo tem mais graça e tem mais sentido do que tinha. Quando o heterónimo A.B. Kotter realça que, não obstante ter conta no banco da Rainha da Inglaterra (o Coutts) e na loja de quem a acusa de ter mandado matar o filho e a princesa Diana (o Harrod"s), também tem conta no Banco Espírito Santo e no Bananeiro, é preciso conhecer a Várzea de Colares para perceber que são duas lojas quase ao lado uma da outra, separadas apenas pela ribeira de Colares, cheias de patinhos.

E perto do quiosque onde Kotter compra o Daily Telegraph. O Bananeiro é o nome local da loja que dá pelo nome de Pomarinho de Colares, por ter sempre estonteantemente boas bananas da Madeira.

José Cutileiro é um dos mais sábios portugueses. Ensina sem ser chato; esclarece enquanto pensa e põe a dúvida. Faz rir e pensar e ter inveja. É preciso lê-lo cada vez que se muda de ano e morada - porque se ganha sempre.

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