De órfãos a príncipes e em luta pela herança de uma família histórica

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Os dois irmãos com os pais, Frank Pogson e Orietta Doria Pamphilj dr

Antes de irem para os palácios dourados dos Doria Pamphilj, Jonathan e Gesine viviam num orfanato inglês. Hoje preparam-se para disputar o direito a uma fortuna com séculos

Archibald e Mary, dois órfãos britânicos, foram adoptados na década de 1960. Nada de novo, se a mulher que os adoptou não descendesse de uma das mais nobres famílias italianas, com uma fortuna que está hoje avaliada em mil milhões de libras britânicas (924 milhões de euros). As duas crianças cresceram, tiveram descendência, e debatem-se agora em tribunal pela herança multimilionária, que inclui um palácio no centro de Roma e uma das maiores colecções privadas de arte do mundo.

No epicentro do folhetim estão o príncipe Jonathan Paul e a princesa Gesine (Archibald e Mary de nascença), que, apesar de não terem nascido em berço de ouro, cresceram num universo dourado.

A mãe adoptiva de Jonathan e Gesine, a princesa Orietta Doria Pamphilj, nasceu na Grã-Bretanha mas era descendente de uma das mais nobres famílias italianas. Sem filhos biológicos, a princesa visitou um orfanato londrino, na década de 1960, e decidiu adoptar o pequeno Archibald. Um ano depois, ela e o marido (Frank Pogson, da Marinha britânica) levaram Mary para casa.

Depois de o casal Doria Pamphilj as ter retirado do orfanato, as crianças foram criadas como irmão e irmã, entre palacetes sumptuosos e pinturas a óleo.

De órfãos a príncipes, Jonathan Paul e Gesine herdaram, após a morte da mãe adoptiva, 14 títulos nobiliárquicos, dois palácios - um dos quais no centro de Roma, na Via del Corso, residência oficial da família - e uma colecção de arte que inclui trabalhos de artistas como Rafael, Ticiano, Caravaggio e um retrato do Papa Inocêncio X, da autoria de Velázquez.

Os filhos de Jonathan

Mas a história anda longe de ser um conto de fadas. É antes digna de uma longa-metragem de Almodóvar. Após a morte da mãe adoptiva, em 2000, as diferenças entre Jonathan Paul e Gesine vieram ao de cima. A princesa é uma mulher profundamente católica, casada com um historiador de arte e mãe de quatro filhas. Jonathan Paul é um homossexual assumido que celebrou em Inglaterra uma união civil com o brasileiro Elson Edeno Braga. O casal recorreu depois a duas barrigas de aluguer e tem agora duas crianças: Emily, de três anos, e Filippo Andrea, de dois.

É precisamente aqui que começa a polémica: a princesa Gesine considera que Emily e Filippo não são oficialmente filhos do seu irmão, pelo que não deverão ser herdeiros legítimos da fortuna Doria Pamphilj. Temendo a delapidação do património familiar, Gesine recorreu à justiça, há dois anos, a fim de regular a questão.

Gesine, que alegadamente não aprova o estilo de vida do irmão, confirma ter pedido à justiça que regule a paternidade das duas crianças (uma delas nascida na Ucrânia e outra nos Estados Unidos), a fim de prevenir que, daqui a alguns anos, haja um "saque" aos palácios e outras propriedades.

"Aquilo que o tribunal tem de decidir é a paternidade das duas crianças. De acordo com as leis italianas, não há nenhum vínculo oficial entre eles - só porque diz que são seus filhos, isso não significa que sejam", indicou Gesine, citada pela imprensa britânica, que tem dedicado algumas páginas a esta "novela".

"As mulheres que deram à luz não renunciaram à sua maternidade e ninguém me garante que daqui a dez anos elas não apareçam com toda a papelada a reclamar parte da herança", disse a princesa, citada pelo Times. Ao diárioThe Telegraphacrescentou ainda: "As barrigas de aluguer não fazem este tipo de coisas por bondade - elas fazem isso por dinheiro e este é um negócio lucrativo e, portanto, poderão facilmente aparecer e reclamar a sua parte."

Depois de tentar em privado resolver o diferendo com o irmão, Gesine decidiu recorrer à justiça: "Eu não concordo com as barrigas de aluguer - as pessoas têm direito a ter crianças, mas as crianças também têm direito a ter pais. Tudo isto tem causado muita tensão entre mim e o meu irmão e a nossa relação tem sofrido (...). De início tentei resolver as coisas só entre mim e ele, mas isso não resultou e por isso recorri aos tribunais, e agora terão que ser eles a resolver."

Espera-se um veredicto para o final deste mês. O caso, de acordo com Gesine, é inédito em Itália.

Na passada segunda-feira, Jonathan Paul - que se tem mantido prudentemente afastado dos media - declarou apenas que deseja "salvaguardar o desenvolvimento e a serenidade das crianças". "Não há mais nada a acrescentar", concluiu.

Para além do palácio em Roma, a família, a que pertencem figuras como Andrea Doria, o célebre almirante genovês do século XVI, e o Papa Inocêncio X, possui ainda, em Génova, a Villa Del Principe, um palacete do século XVI que contém tapeçarias raras e obras de Ticiano e de Sebastiano del Piombo. Grande parte da colecção da família, que foi amplamente restaurada a mando da princesa Orietta e do seu marido, está dispersa pelas centenas de salas do palácio da Via del Corso e aberta ao público. Quem quiser ver o retrato de Inocêncio X pintado por Velázquez ou a célebre Saloméde Ticiano tem de ir até lá.

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