Ir a uma sessão de cinema imersivo é "fazer parte" do que se vê

Durante três dias, o Festival Europeu de Cinema Imersivo de Espinho mostra aos portugueses filmes sob uma cúpula, a 360 graus

A A imagem não é um plano que está à nossa frente; é todo um cobertor que nos envolve: vamos caminhando dentro dela, à cadência nervosa ditada pela música. Mais do que seguir a câmara, são os nossos próprios olhos que arquitectam as sequências centrípetas para as quais somos absorvidos. Estar dentro da acção, mais do que observá-la, é a experiência proposta pelo Festival de Cinema Imersivo - Imersive Film Festival (IFF), o primeiro evento na Europa dedicado a esta área cinematográfica, que começou sexta-feira e termina hoje no Planetário do Centro Multimeios de Espinho. Com filmes projectados numa cúpula a 360 graus, o público fica rodeado de imagens e sons, o que o deixa "imerso na estória e o transporta para outro lugar", explica o astrónomo António Pedrosa, director do Planetário e também do IFF. O burburinho dentro da cúpula é revelador. Todos se sentiram elevar-se das cadeiras - inclinadas, de modo a ter uma imagem o mais hemisférica possível - mas, afinal, as sensações enganam: permaneceu-se sempre no mesmo sítio. "Parece que fazemos parte daquilo que estamos a ver; envolve muito mais do que um ecrã normal de cinema", diz Ana Nascimento, depois de assistir à primeira sessão do IFF, que foi uma espécie de best of do Dome Fest, festival norte-americano pioneiro na exibição de cinema imersivo.
Sílvia Sousa não sabia "muito bem para o que vinha", mas garantiu que não ia "sair desiludida". Ainda está "meia tonta" com a celebração sinestésica em que acabou de participar. "Sente-se liberdade, confusão, tudo misturado", revela, surpreendida. "Como será que isto é feito? É uma coisa que nos transcende", questiona.
A produção de filmes imersivos difere muito da tradicional. A captação é feita através de câmaras com lentes de grande angular, conhecidas como "olho-de-peixe", que registam a imagem a 180 graus. A edição, bem como a projecção exigem também um equipamento muito específico.

Narrativas ainda por afinarPara Nelly Lau, directora assistente do Digital Studio do Planetário de Pequim, na China, o cinema imersivo é o "cinema do futuro". A apresentação "especial" dos filmes permite mostrar "à audiência um ambiente muito real", considera a realizadora de Interstellar, um dos filmes em competição no IFF. Para além disso, o cinema imersivo serve também para "introduzir a astronomia [um dos temas mais trabalhados neste segmento da indústria cinematográfica] às pessoas": como elas "não podem estar no Universo, trazemo-lo até elas", afirma. Apesar de ser "uma ferramenta fenomenal" no campo científico, o cinema imersivo ultrapassa o carácter educativo: é também uma "arte", salienta António Pedrosa.
No entanto, é preciso apurar as narrativas, ainda muito ingénuas. "Narrativas mais construídas podem levar-nos a uma concepção bem mais próxima da realidade", acredita Fernando Galrito, director da Mostra - Festival de Cinema de Animação de Lisboa. Ainda assim, o cinema imersivo exprime, para o cineasta, "novos formatos" que possibilitam criar filmes cada vez mais impressionistas.

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