Torne-se perito

Insulto sem castigo nem palavrões nas actas

a O incidente entre José Eduardo Martins (PSD) e Afonso Candal (PS), que acabou quinta-feira com insultos do social-democrata ao deputado socialista, não vai ter consequências internas e as frases polémicas nem sequer vão figurar nas actas da reunião, que ontem estavam ainda a ser transcritas pelos serviços da Assembleia da República (AR). Tanto a direcção da bancada do PS como a do PSD e a própria mesa da AR se certificaram de que as frases não seriam transcritas na acta. Aliás, a regra desde a década de 80 - depois de uma troca de palavras azedas entre Francisco Sousa Tavares e Jerónimo de Sousa - é que o Diário da Assembleia não transcreve palavras obscenas ou asneiras, por ser "um jornal oficial". E, de facto, na versão a que o PÚBLICO teve ontem acesso, as palavras polémicas alegadamente ditas - "vai para o c..." - não aparecem. Até porque os funcionários terão tido dúvidas sobre o que realmente foi dito.
A opção de não transcrever é pouco pacífica, pelo menos para Almeida Santos, ex-presidente da AR. Ouvido pelo PÚBLICO, disse que o presidente do Parlamento não tem qualquer disposição legal para impedir o registo nas actas, mas admitiu tratar-se de censura. "Isso é censura", afirmou, lembrando que enquanto presidiu à AR nunca aconteceu "nada de muito grave".
O debate era sobre os painéis solares e o CDS anunciou que iria pedir explicações sobre o alegado favorecimento da Martifer e da Bosch, acusando o Governo de "pôr em causa a livre concorrência" e de ter criado um autêntico "duopólio". Afonso Candal pediu a palavra para defender o Executivo das críticas do CDS. A vozearia era muita e Candal ironizou com a preocupação de Eduardo Martins "com os contribuintes".
"Um trocadilho inqualificável" com "contribuintes e interesses" que o levou "a perder as estribeiras", como Eduardo Martins admitiu ontem de manhã. Desculpas, pediu-as a todos os deputados, excepto a Candal, a quem fez um desafio e uma acusação. O desafio foi concretizar a "insinuação". "Não se deixam passar em claro as ofensas à honra", afirmou, garantindo que, enquanto advogado, nunca misturou os planos profissional e político. E acusou Candal, que ontem recusou ter feito qualquer insinuação, de fazer uma "campanha negra" contra si.
O líder da bancada do PSD, Paulo Rangel, lamentou o sucedido, mas garantiu que o episódio não terá consequências para o deputado social-democrata, uma vez que já há um pedido de desculpas. Confrontado com o facto de Eduardo Martins não ter pedido desculpas ao deputado do PS, Rangel parece ter ficado convencido do contrário. "Já pediu desculpas. [O caso] faz parte de alguns excessos que se encontram no Parlamento. Não é desejável que aconteçam, mas acontecem", disse. Na bancada do PS, lamenta-se o sucedido, mas o assunto também vai "morrer por aqui", nas palavras de um seu vice-presidente.
A questão dos insultos reabriu o debate sobre os limites da linguagem no Parlamento, não havendo nem no regimento nem no Estatuto dos Deputados qualquer referência directa a essa questão. Como admitiu o vice-presidente da AR Guilherme Silva: "Há a exigência de regras de urbanidade e bom senso." com São José Almeida, Sofia Rodrigues e Maria José Oliveira

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