Torne-se perito

A nova e maior ameaça

Enquanto se discute se a deserção de líderes jihadistas enfraquece a Al-Qaeda, uma corrente islâmica mais perigosa, ainda que apolítica e menos violenta, está a ressurgir - o salafismo

a Os analistas não chegam a um consenso sobre se o poder da Al-Qaeda está ou não a diminuir com a revolta de ideólogos como o Dr. Fadl. Mas Raouf Ebeid, director do Political Islam Online, um respeitado site de recolha, tradução e análise de informações sobre o mundo muçulmano, alerta para uma realidade que deveria merecer mais atenção: se os jihadistas estão em declínio, o salafismo está em ascensão."De momento, a doutrina salafista é não-violenta na sua natureza e, tal como os taliban, concentra-se mais nos aspectos religiosos da sociedade", disse Ebeid ao P2. "Estes aspectos implicam, porém, uma acentuada restrição da liberdade das mulheres e das minorias, assim como a total rejeição do Ocidente. Não é possível a convivência com outras culturas."
Ebeid, americano de origem egípcia, sabe do que fala. Afinal, ele trabalhou durante três anos para a SAIC (Science Apllications International Corporation), a mais importante companhia de fornecimento de serviços dos Estados Unidos (desde a construção civil às redes de comunicações e sistemas de informação), que tem entre os seus principais clientes os serviços secretos norte-americanos. A sua função, como ele próprio descreve, era "analisar e avaliar meios islâmicos extremistas, supervisionando o desenvolvimento de um processo linguístico automático para extrair e decifrar mensagens em árabe".
"Não sei o que acontecerá se todo o Médio Oriente começar a adoptar uma cultura de estilo saudita", observa Ebeid. A tendência está a generalizar-se: os salafistas ganharam a maioria dos lugares no parlamento do Kuwait. Lideram a Irmandade Muçulmana na Jordânia. É a sua ideologia que o Hamas está a aplicar na Faixa de Gaza. E avançam também no Egipto, no Paquistão e no Afeganistão.
"Na Arábia Saudita, o extremismo é mitigado por uma excessiva riqueza, um governo pró-ocidental e um rei que faz o seu melhor (com pouco êxito) para controlar o aparelho religioso", acrescenta Ebeid. "Não podemos esperar o mesmo tipo de resultado em lugares como o Egipto e a Jordânia. Talvez o que esteja para vir não seja um novo Bin Laden, mas poderemos acabar com países totalmente religiosos e antagonistas do Ocidente. Nesse caso, será difícil evitar um confronto em larga escala entre o Ocidente e o mundo muçulmano."
"Ainda que, por um lado, seja difícil avaliar as perspectivas a longo prazo para a jihad [face à rebelião na Al-Qaeda], há provas amplas de que o fanatismo ideológico não violento está em aumentar nas sociedades muçulmanas", adianta Ebeid. "Embora os académicos possam discordar sobre as características que definem o movimento salafista há um número crescente de pessoas que se identificam com uma ou outra corrente do salafismo (...) e todas têm uma coisa em comum: um islão rígido e conservador."
Há várias fases até chegar à violência, explicou também ao P2 o analista egípcio Khalil al-Anani, investigador na Brookings Institution. "Uma pessoa começa por ser conservadora, depois transforma-se em salafista, depois em extremista, depois em radical e finalmente torna-se violenta." Para Anani, o que se assiste agora é à "segunda fase salafista, e isto acontece porque os islamistas moderados estão em declínio devido às perseguições de regimes autoritários no mundo árabe".
Ebeid e Anani notam que os actuais líderes árabes não se importariam de ver o salafismo propagar-se "das montanhas do Afeganistão às margens do Nilo" porque não ameaça os seus regimes. A Irmandade egípcia, por exemplo, quer participar no processo político, mudando a sociedade, ao contrário do salafismo, que advoga o isolamento face à modernidade, centrando-se numa estrita prática religiosa e além-morte.
Antídoto ou acelerador
Peter Mandaville, director do Center for Global Studies, professor na Universidade de George Mason (próximo de Washington), concorda que o salafismo está em progressão, mas adverte que "seria errado igualar este facto com a crescente ameaça do islão militante".
Autor de Global Political Islam, um livro que a revista The Economist descreveu como "uma obra bem documentada sobre as origens do islamismo mainstream", Mandaville sublinha ao P2, por e-mail, que "a ênfase nas bases fundamentais do islão permite que o salafismo se propague globalmente como uma versão seguramente autêntica do islão". Isto atrai jovens que "tentam encontrar um sentido na vasta informação divergente e por vezes contraditória sobre o islão que lhes chega de todos os lados".
Para Mandaville, "o salafismo poderá ser tanto o antídoto para a militância islâmica como a sua chave de ignição".
O académico americano-libanês Walid Phares, autor de várias obras sobre terrorismo, como War of Ideas: Jihadism against Democracy, recusa fazer distinções entre correntes. Todos são salafistas, diz ao P2: a Al-Qaeda, os wahabitas sauditas e a Irmandade egípcia. O movimento nasceu nos anos 1920 e o seu objectivo "é restaurar o califado, ou império islâmico, do Atlântico à China". E o fim do salafismo, conclui, só virá "quando acontecer uma revolução no mundo árabe e muçulmano que aceite o liberalismo, o pluralismo e a democracia".

Os analistas não chegam a um consenso sobre se o poder da Al-Qaeda está ou não a diminuir com a revolta de ideólogos como o Dr. Fadl. Mas Raouf Ebeid, director do Political Islam Online, um respeitado site de recolha, tradução e análise de informações sobre o mundo muçulmano, alerta para uma realidade que deveria merecer mais atenção: se os jihadistas estão em declínio, o salafismo está em ascensão.
"De momento, a doutrina salafista é não-violenta na sua natureza e, tal como os taliban, concentra-se mais nos aspectos religiosos da sociedade", disse Ebeid ao P2. "Estes aspectos implicam, porém, uma acentuada restrição da liberdade das mulheres e das minorias, assim como a total rejeição do Ocidente. Não é possível a convivência com outras culturas."
Ebeid, americano de origem egípcia, sabe do que fala. Afinal, ele trabalhou durante três anos para a SAIC (Science Apllications International Corporation), a mais importante companhia de fornecimento de serviços dos Estados Unidos (desde a construção civil às redes de comunicações e sistemas de informação), que tem entre os seus principais clientes os serviços secretos norte-americanos. A sua função, como ele próprio descreve, era "analisar e avaliar meios islâmicos extremistas, supervisionando o desenvolvimento de um processo linguístico automático para extrair e decifrar mensagens em árabe".
"Não sei o que acontecerá se todo o Médio Oriente começar a adoptar uma cultura de estilo saudita", observa Ebeid. A tendência está a generalizar-se: os salafistas ganharam a maioria dos lugares no parlamento do Kuwait. Lideram a Irmandade Muçulmana na Jordânia. É a sua ideologia que o Hamas está a aplicar na Faixa de Gaza. E avançam também no Egipto, no Paquistão e no Afeganistão.
"Na Arábia Saudita, o extremismo é mitigado por uma excessiva riqueza, um governo pró-ocidental e um rei que faz o seu melhor (com pouco êxito) para controlar o aparelho religioso", acrescenta Ebeid. "Não podemos esperar o mesmo tipo de resultado em lugares como o Egipto e a Jordânia. Talvez o que esteja para vir não seja um novo Bin Laden, mas poderemos acabar com países totalmente religiosos e antagonistas do Ocidente. Nesse caso, será difícil evitar um confronto em larga escala entre o Ocidente e o mundo muçulmano."
"Ainda que, por um lado, seja difícil avaliar as perspectivas a longo prazo para a jihad [face à rebelião na Al-Qaeda], há provas amplas de que o fanatismo ideológico não violento está em aumentar nas sociedades muçulmanas", adianta Ebeid. "Embora os académicos possam discordar sobre as características que definem o movimento salafista há um número crescente de pessoas que se identificam com uma ou outra corrente do salafismo (...) e todas têm uma coisa em comum: um islão rígido e conservador."
Há várias fases até chegar à violência, explicou também ao P2 o analista egípcio Khalil al-Anani, investigador na Brookings Institution. "Uma pessoa começa por ser conservadora, depois transforma-se em salafista, depois em extremista, depois em radical e finalmente torna-se violenta." Para Anani, o que se assiste agora é à "segunda fase salafista, e isto acontece porque os islamistas moderados estão em declínio devido às perseguições de regimes autoritários no mundo árabe".
Ebeid e Anani notam que os actuais líderes árabes não se importariam de ver o salafismo propagar-se "das montanhas do Afeganistão às margens do Nilo" porque não ameaça os seus regimes. A Irmandade egípcia, por exemplo, quer participar no processo político, mudando a sociedade, ao contrário do salafismo, que advoga o isolamento face à modernidade, centrando-se numa estrita prática religiosa e além-morte.

Antídoto ou aceleradorPeter Mandaville, director do Center for Global Studies, professor na Universidade de George Mason (próximo de Washington), concorda que o salafismo está em progressão, mas adverte que "seria errado igualar este facto com a crescente ameaça do islão militante".
Autor de Global Political Islam, um livro que a revista The Economist descreveu como "uma obra bem documentada sobre as origens do islamismo mainstream", Mandaville sublinha ao P2, por e-mail, que "a ênfase nas bases fundamentais do islão permite que o salafismo se propague globalmente como uma versão seguramente autêntica do islão". Isto atrai jovens que "tentam encontrar um sentido na vasta informação divergente e por vezes contraditória sobre o islão que lhes chega de todos os lados".
Para Mandaville, "o salafismo poderá ser tanto o antídoto para a militância islâmica como a sua chave de ignição".
O académico americano-libanês Walid Phares, autor de várias obras sobre terrorismo, como War of Ideas: Jihadism against Democracy, recusa fazer distinções entre correntes. Todos são salafistas, diz ao P2: a Al-Qaeda, os wahabitas sauditas e a Irmandade egípcia. O movimento nasceu nos anos 1920 e o seu objectivo "é restaurar o califado, ou império islâmico, do Atlântico à China". E o fim do salafismo, conclui, só virá "quando acontecer uma revolução no mundo árabe e muçulmano que aceite o liberalismo, o pluralismo e a democracia".

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