Ter máquinas de bolas com chocolates pode ser crime

O proprietário de um armazém foi recentemente detido e todo o material foi apreendido pela ASAE

a As máquinas de bolas que dão di-reito a chocolates, habitualmente instaladas em cafés e restaurantes, podem ser consideradas ilegais e os seus proprietários ou responsáveis pela sua exploração acusados de cri-
me de jogo ilícito. Num armazém no Centro do país, todo o material foi apreendido pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) com a justificação de que não era possível ao cliente perceber qual o chocolate a que teria direito antes de introduzir a moeda de 50 cêntimos. Há, no entanto, acórdãos dos tribunais que contrariam este entendimento.
As máquinas de cápsulas que contêm senhas correspondentes a chocolates ou a outro tipo de brindes, que saem mediante a introdução de uma moeda de 50 cêntimos ou um euro, são aparentemente inócuas, mas a sua má utilização pode levar os seus proprietários a tribunal.
Com a parte superior da estrutura em acrílico transparente, este tipo de máquinas tem habitualmente uma janela interior que permite ver
qual a cápsula que vai sair. Lá dentro está uma senha com uma cor que corresponde a determinado chocolate. Se a janela estiver obstruída (por um autocolante, por exemplo), a máquina é considerada um jogo de fortuna e azar. E a sua comercialização é crime.
Foi o que aconteceu recentemente num armazém do Centro do país. O proprietário foi detido e o material (máquinas e cartazes de exposição dos chocolates) apreendido pela ASAE, que considerou haver prática de jogo de fortuna e azar, considerado crime. A justificação é que o jogador se limita a introduzir a moeda sem poder escolher o prémio da sua preferência, neste caso um chocolate.
A situação é confirmada pela Inspecção-Geral de Jogos, chamada a pronunciar-se em 2006 sobre este tipo de máquinas, e pela própria ASAE, em resposta a um pedido de informação de uma empresa sobre a legalidade das mesmas máquinas, segundo documentos a que o PÚBLICO teve acesso.
O entendimento da ASAE parece ser diferente em relação a outras máquinas semelhantes como as de bolas com brindes infantis, em que muitas vezes também não é possível saber qual a cápsula que vai sair antes de meter a moeda no mecanismo. Como explicou ao PÚBLICO um responsável de uma empresa de máquinas de diversão, que não se quis identificar, a diferença entre as duas reside no valor dos brindes. Nas máquinas de
bolas para crianças, considera-se que todos brindes têm um valor se-
melhante, enquanto nas dos chocolates entende-se que há diferenças de valor nos prémios.
Dúvidas na regulamentação
Quanto à legalidade das máquinas de bolas correspondentes a prémios como chocolates ou outras pequenas utilidades domésticas, a mesma fonte explica que só é considerado jogo de fortuna e azar quando o "cliente não sabe o que vai sair".
Mas há dúvidas sobre a regulamentação aplicável e a apreensão deste tipo de máquinas "é frequente". Os próprios tribunais têm entendimentos diferentes da ASAE sobre o assunto. É o caso de dois recentes acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra. Num dos casos, datado de Maio de 2007, o tribunal absolveu o proprietário de uma máquina e o dono do restaurante onde ela se encontrava do crime de exploração de jogo ilícito por considerar que é indi-
ferente o prémio atribuído (dentro dos que estão expostos no cartaz), desde que esteja sempre garantido ao cliente que coloca a moeda.
"A máquina é constante e contínua na atribuição de um prémio ou, como se diz na gíria, "sai sempre". Esta continuidade na atribuição de um prémio, apenas variando na qualidade e a natureza do mesmo, retira à máquina apreendida a natureza de "fortuna e azar" (...)", lê-se na sentença. À luz da lei, os jogos de fortuna e azar "são aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte", de acordo com o Decreto-Lei n.º 422/89.
Num outro caso, os arguidos con-
denados em primeira instância também foram absolvidos pelo Tribunal da Relação de Coimbra. Em causa estavam duas máquinas, uma com prémios de chocolates, outra que da-
va direito a pequenas utilidades. O tribunal considerou não existir qualquer factor significativo de perícia, sorte ou azar, "uma vez que o expositor fornece, em toda e cada uma das activações efectuadas, um dos produtos expostos e devidamente identificados".
"Pode sair este ou aquele chocolate, aquele porta-chaves ou aquele isqueiro. Mas sempre um produto exposto de valor e utilidade semelhantes e individualizado pela cor da bola ou da letra/número que a bola contém", segundo o acórdão.
O PÚBLICO tentou contactar a ASAE, mas não obteve resposta até ao fecho desta edição.
2007
Tribunais têm tido entendimentos diferentes: em 2007 o proprietário de uma máquina foi absolvido

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