A O professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC) Manuel Costa Andrade lamentou ontem que o penalista Figueiredo Dias, que ontem "deu" a sua última aula, não tenha sido auscultado no processo de revisão do Código Penal e do Código de Processo Penal. "Se eu fosse seleccionador nacional, escolheria os melhores jogadores e não outros", criticou o penalista, à margem da cerimónia que marcou a despedida de Figueiredo Dias da actividade lectiva.Depois de 47 anos de docência universitária, a última aula de Figueiredo Dias foi dada por Costa Andrade, seu discípulo. De acordo com a tradição da FDUC, um professor que atinja o limite legal de idade deve dar a última lição através do seu discípulo mais velho. "É nessa condição que estou aqui hoje. (...) Mas não vou fazer de Figueiredo Dias. Falarei apenas dele", declarou logo Costa Andrade.
Perante um auditório repleto de alunos e de professores da FDUC, Costa Andrade elogiou a "investigação e ensino" de Figueiredo Dias e lembrou a sua "influência" na arquitectura penal portuguesa."Revisitou, desconstruiu e refez a arquitectura basilar da doutrina do crime", disse, apontando como princípios fundamentais dessa doutrina a "preservação da dignidade humana, a salvaguarda da liberdade e a realização da justiça".
O enorme "apego" de Figueiredo Dias à "investigação, aos alunos e às aulas" bem como a sua "busca obsessiva do recolhimento", "votando tempo sem tempo à reflexão", foram outras das características frisadas .
Considerando que o pensamento jurídico do catedrático da FDUC é uma "referência para a doutrina portuguesa e estrangeira", Costa Andrade referiu ainda uma das citações preferidas de Figueiredo Dias:
"Do ponto de vista do direito penal, cada um tem o inalienável direito de ir para o inferno à sua própria maneira, contanto que no caminho não mate nem roube ninguém."
Figueiredo Dias que, segundo a tradição, não pôde estar presente na última aula, visitou a sala do conselho científico, onde a sua imagem faz parte da recente galeria dos professores jubilados. "E agora o que vai ser? Vai ser o que tem sido, menos as aulas", declarou.