PS passou da retaliação à censura policial, acusa o deputado Paulo Rangel
Manuel alegre exorta socialistas a defenderem liberdade sindical e a não deixarem repetir episódios como o da Covilhã
a A pedido do PSD, do BE, do PEV e do PCP, e com o acordo do PS e CDS, o ministro da Administração Interna, Rui Pereira, vai à AR dar explicações sobre o caso na terça-feira. Mas foi uma unanimidade muito polémica, esta obtida na Comissão de Assuntos Constitucionais antes do plenário. Antecipando o debate, Luís Montenegro (PSD) frisou a "enorme gravidade do caso" e das reacções da governadora civil, ao considerar a operação como de rotina, e criticou a condição colocada pelo ministro de ter primeiro a conclusão do inquérito. "Mas agora um ministro condiciona a actuação do Parlamento? Onde está a autonomia do PS?", questionou.
"O que importa saber é quem deu ordem e o que lhe vai acontecer", frisou António Filipe (PCP), concordando com Montenegro que não são precisas mais de 24 horas para apurar o que aconteceu. PEV e CDS juntaram-se-lhes nos argumentos.
O verniz estalou quando Ricardo Rodrigues confirmou as suspeitas do PSD: "O PS está de acordo com a vinda do ministro", mas apenas depois de conhecer o inquérito.
Foi preciso o presidente da comissão, Osvaldo Castro, garantir que a audição estava pré-agendada para terça-feira para acalmar os ânimos. Depois do plenário, a data foi confirmada.
Paulo Rangel disse que "desde o re-styling Sócrates, o PS não pode dar cartas em matéria de liberdade".
a "O PS deu um passo de gigante" com o episódio da visita policial ao Sindicato de Professores da Região Centro à Covilhã na véspera da ida do primeiro-ministro à cidade e da manifestação prevista para essa altura. Transitou da lógica da reacção para a lógica da prevenção" de comportamentos indesejados, o que é já uma "censura a priori e reveste uma natureza eminentemente policial". A acusação, feita ontem pelo deputado do PSD Paulo Rangel no Parlamento, não deixou ninguém indiferente. E deu mote a um debate quente de hora e meia.
"Algo está podre na República Portuguesa", afirmou o mesmo parlamentar que, nas comemorações do 25 de Abril, tinha alertado ali mesmo para a "claustrofobia democrática" e "anestesia cidadã" que pressentia. Só depois disso se conheceram os casos Charrua e do centro de Saúde de Vieira do Minho, ontem recordados por vários partidos da oposição. Mas este é diferente, frisa Paulo Rangel: "O primeiro-ministro e o Governo PS subiram um perigoso degrau no clima de condicionamento, de atrofia da liberdade cívica".
Rangel, escolhido para fazer esta intervenção pelo novo líder do PSD, não poupou a bancada socialista pela complacência com casos como o da Covilhã. "O teste decisivo é saber respeitar a liberdade quando se é poder com maioria absoluta. De uma vez por todas têm de decidir de que lado estão."
O debate já tinha começado antes, com uma intervenção de Ana Drago (BE) em que constatara a "nova medida de segurança, as visitas policiais preventivas às iniciativas de protesto social". Imputara responsabilidades ao primeiro-ministro: "Quando classifica a luta política e o protesto como insultos". E exortara os dirigentes do PS, "que tanto repetem que não recebem lições de democracia de ninguém", a provarem "ao que estão".
Manuel Alegre respondeu ao desafio. Lembrou que foi o PS que liderou o combate à unicidade sindical do pós-25 de Abril e deixou claro que, no caso da Covilhã, não se deve deixar margem para "sombras ou equívocos", porque "a liberdade sindical é inseparável da liberdade política". "Espero que sejam apuradas responsabilidades e que este caso fique completamente esclarecido", para que "não volte a repetir-se, a bem da democracia".
António Filipe (PCP) juntou-se ao coro e lembrou que já foram aplicados 103 dias de prisão a militares por terem participado em acções de protesto ou prestado declarações sobre elas. "É a teoria do insulto: o primeiro-ministro considera que todas as críticas políticas são insultos passíveis de investigação criminal", juntou. "É a concepção à Luís XIV para quem o Estado é ele".
Diogo Feio (CDS-PP) preferiu falar de uma "nova era, a era dos inquéritos a cair em saco roto", para exigir que as investigações neste caso não demorem tanto como as do caso da invasão da propriedade privada em Silves, em Agosto: "Alguém sabe dos resultados?" "É a táctica dos processos de averiguações", concordou Rangel, "que dissemina, prolonga e reforça o clima de intimidação".
Pelo PS, Ricardo Rodrigues fez ataque partidário: "Ó senhor deputado Paulo Portas, o senhor a defender a liberdade!" E deixou a pergunta: "Devemos fazer um julgamento popular ou esperar pelo inquérito?"
No fim, Portas pediu defesa da honra para sublinhar que enquanto ministro da Defesa nunca mandou "fotografar ou identificar manifestantes".