Equipa(s) da casa

Quem não acorreu ao Estádio do Bessa na noite de sábado, encontrou semelhante orgulho portista na Casa da Música. A razão é simples: a Orquestra Nacional do Porto (ONP) e o Coral de Letras - dois importantes símbolos para o público da cidade - contracenaram na Sala Suggia. Se o programa era contrastante - incluído no ciclo Música e Revolução com a Sinfonia nº 3, op. 55, Heróica, de Beethoven na primeira parte e, na segunda, a Cantata para o 20º Aniversário da Revolução de Outubro, op. 74, de Prokofiev - , a prestação da orquestra não o foi menos.
A forma ambiciosa como Martin André iniciou a sinfonia fazia temer o pior, dando a sensação de estar a jogar no limite de velocidade da ONP. Contudo, o nível geral da execução foi bastante positivo, transparecendo o interessante projecto musical que o maestro tem para a obra (que dirigiu de cor), tal como o domínio sobre a orquestra com que tem trabalhado.
Levando-se ou não em conta a ideia, por muitos defendida, da acústica da Sala Suggia ser um desastre para algumas situações, aponte-se a dificuldade que os violoncelos tiveram em fazer-se ouvir. Exceptuando-se este pormenor, que se fez sentir logo desde o primeiro andamento, provocando algumas quebras nos momentos em que os violoncelos têm um papel de destaque, os vários naipes apresentaram-se em equilíbrio durante a sinfonia.
Se no segundo andamento, as cordas (sobretudo violinos) tornaram um pouco difícil o entendimento das frases (aspecto que acabou por se diluir ao longo do mesmo), o oboé terá certamente conseguido suspender algumas respirações na plateia, tal foi a beleza dos seus solos.
Mas o melhor estaria precisamente no terceiro andamento, que provou ser um harmonioso diálogo da orquestra, exibindo cordas plenas de garra, e um trabalho de trompas digno de nota.
O quarto e último andamento marcaria por uma indiscutível precisão rítmica (incluindo nos pizzicati, que superaram quaisquer expectativas), embora acompanhada por uma duvidosa afinação.
Já na segunda parte, o cenário transformar-se-ia. Uma orquestra muliplicada, repleta de reforços, apoiada por um coro resultante da reunião de dois agrupamentos distintos e ainda por um grupo de metais, demonstraria um trabalho bastante diferente: regra geral, muito som e pouca subtileza seriam as características mais evidentes da interpretação da cantata de Prokofiev, um verdadeiro colosso em termos de volume sonoro, quase assustador, quer pela dor física que chega a provocar num espaço com as dimensões da Sala Suggia, quer pela força do texto e escrita coral.
Curiosidades a acrescentar: a presença da divulgada atracção, o jornalista Carlos Fino, resumiu-se à declamação de três ou quatro frases em russo dirigidas ao coro; o evento foi imensamente aplaudido entre bravos de uma claque trajada; à saída do auditório, uma sensação de silêncio corrompido pelo som que fica na memória invadia os ouvidos, algo semelhante ao que se experimenta à saída de uma discoteca.

Diana Ferreira

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