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Heroes: uma série sobre "pessoas cujas vidas foram viradas do avesso"

"O novo Perdidos" é uma das grandes apostas da NBC. Já ganhou fãs em todo o mundo

a Há qualquer coisa nas histórias de super-heróis em que inesperadas mutações dão poderes sobre-humanos a pessoas comuns. E, até agora, o formato por excelência destas narrativas sobre um futuro nada distante tem sido a banda desenhada. Mas a TVI mostra, a partir de hoje, um dos sucessos do ano da televisão americana, Heroes, uma série um pouco noir sobre as tais pessoas normais, anti-heróis, que se tornam heróis e, claro, vilões. A estação de Queluz tem nas mãos uma série "muito bem feita", diz Vanessa Tierno, do departamento de compras internacionais da TVI, e que "tem sido a grande revelação nos Estados Unidos, não só para televisão, mas também para os novos media", com declinações para os telemóveis e para a Internet. Há histórias de banda desenhada on-line que continuam e aprofundam a trama televisiva, há jogos e até o Heroes 360, que convida os espectadores a ver os episódios com o computador ligado para competirem pelo título de fã mais fanático.
Heroes é uma das sensações da temporada 2006/07, que está a chegar ao fim nos Estados Unidos. Está entre as séries estreadas no final de Setembro de 2006 que já têm uma segunda época prometida, sendo uma aposta da NBC, até aqui não muito bem sucedida no capítulo da ficção televisiva. A série de multiprotagonistas está parada até dia 23, mas quando está no ar é seguida por mais de 14 milhões de americanos, aos quais se juntam milhões de britânicos e os ciberespectadores de todas as nacionalidades que pirateiam episódios na Internet.
"É uma série que tem grande potencial para os jovens, é a história de vários heróis, mas que são homens normais. É uma mistura de banda desenhada com a actualidade", descreve Vanessa Tierno. Tim Kring, o criador da série (Crossing Jordan, Providence), conseguiu uma espécie de mistura entre X-Men e Voo 93. Porquê? É preciso esperar alguns episódios para perceber qual o nível de ameaça e de perigo que espreitam a galeria de personagens - porque há inúmeros protagonistas, alguns melhores actores do que outros, como assinala a crítica norte-americana. Deles destaca-se Masi Oka, de origem japonesa, que personifica o contraponto cómico, Hiro, e foi o único nomeado do elenco para um Globo de Ouro.
Todos os sábados, a TVI vai passar dois episódios de Heroes a partir das 14h00. É que "a série tem uma grande continuidade de episódio para episódio e os fins-de-semana são dias em que há maior disponibilidade dos espectadores" para os seguir. Aviso à navegação: Heroes tem uma intriga serial, mas não é linear. Há um mistério permanente e outros que surgem, e como uma das personagens principais, o japonês Hiro, consegue contornar as linhas do espaço e do tempo, tudo é relativo. Qualquer semelhança com Perdidos não é pura coincidência.
"Efeito Perdidos"
Heroes chegou quando Perdidos entrava na terceira temporada, mas não convenceu logo ao princípio. Mas tem características que, segundo a revista Time, são herdadas do "efeito Perdidos". Os grandes canais americanos perceberam que o filão morava numa intriga recheada de personagens, vários sinais de mistério e ícones de mitologia (o que nos Ficheiros Secretos, por exemplo, era a trama de pano de fundo sobre a existência de extraterrestres, o Garganta Funda e a busca de Fox Mulder), com avanços e recuos e em que um grupo de estranhos se junta por força das circunstâncias. Como exemplos dessa herança, a Time enquadrava em Outubro passado Heroes (NBC) e Jericho (CBS, a estrear na SIC).
Tim Kring criou a série sem ser, na verdade, um verdadeiro conhecedor de banda desenhada. Jeph Loeb, que trabalhou nos maiores títulos de BD do mundo, desenhando o Super-Homem e Batman, estava na equipa de escrita de Perdidos no final da segunda temporada da série e interessou-se pelo projecto Heroes, no qual Kring se propunha "escrever a primeira abordagem moderna sobre a mitologia da banda desenhada". Hoje, está muito satisfeito por ter trocado Perdidos por Heroes, sobretudo porque continua a trabalhar principalmente sobre personagens e não apenas superpoderes. "Heroes não é sobre os poderes ou sobre o vilão da semana. Trata de pessoas cujas vidas foram viradas do avesso".
Ligação à BD
Mas as tais vidas que foram viradas do avesso também nunca tinham sido muito direitinhas. É difícil julgar os heróis, é impossível saber se são bons ou maus, o que joga perfeitamente com o facto de cada um deles procurar a sua própria identidade. E, como que honrando as previsões dos críticos norte-americanos, que lhe chamavam "o novo Perdidos", Heroes tem uma trama em constante avanço, com personagens novas a surgir a um ritmo cadenciado, mas sem a sensação de perda ou enfado de que os espectadores de Perdidos se queixam nesta terceira temporada.
Não sendo uma série sobre superpoderes, também os tem, mas não precisa de grandes efeitos especiais. Ainda assim, é épica q.b. Sem revelar muito da intriga, há uma personagem essencial para o reforço da ligação à BD: Isaac Mendez, um pintor. A sua arte está nas bancas de jornais, em formato de livro de quadradinhos, mas também em telas ou no chão do seu atelier. E cada quadro, cada cena, é uma explosão (mais ou menos literal) que parece saída da Marvel ou da DC Comics.
O realizador Greg Beeman, que ficou apaixonado pelo episódio-piloto e pediu a Kring para trabalhar na série, é agora co-produtor executivo e um dos mais activos realizadores da série. Para ele, o que Heroes traz de novo é "a combinação da mitologia" com "um elenco excitante". Quis trabalhar na série porque ela representa a oportunidade que um fã eterno de Guerra das Estrelas, Homem-Aranha e BD em geral esperava para "fazer o tipo de trabalho visualmente desenhado" que adora. "E, claro, há a acção e os efeitos especiais".
E a globalização também passa por aqui. Os Heroes estão espalhados pelo mundo. Estão na Índia, no Japão, pelos Estados Unidos, uns estão presos, outros vão ser presos, alguns têm trabalhos monótonos, outros vivem sob o holofote dos media, uns são polícias, outros traidores. Vivem numa moldura interétnica e babélica.

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