António Olaio por António Olaio revela um Salazar entre 100 obras

A exposição, que hoje se inaugura no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, reúne trabalhos realizados entre os anos 80 e a actualidade

I think differently, now that I can paint foi o título escolhido por António Olaio (Sá da Bandeira, Angola, 1963) para a exposição que é hoje inaugurada no Centro Cultural Vila Flor (CCVF), em Guimarães. A mostra, comissariada pelo próprio artista, inclui cerca de uma centena de trabalhos - pintura, desenho, vídeo, instalação -, realizados desde meados dos anos 80 até ao presente. A selecção de obras respeitou um critério de actualidade, ou seja, qualquer uma das criações apresentadas podia, segundo a ideia do seu autor, ter sido feita hoje.António Olaio sublinha que, sendo ele próprio o comissário da sua mostra, esta não possui um ponto de vista relativo, distante: "A minha exposição é um somatório de coisas, não sendo esta situação entendida num sentido pejorativo." Para sublinhar essa dimensão, o ex-vocalista dos Repórter Estrábico explica que de há vinte anos para cá a sua obra não sofreu qualquer evolução: "Existe uma sincronia entre aquilo que fiz na década de oitenta, aquilo que faço hoje e imagino com os trabalhos que possa vir a fazer no futuro."
Essa visão da sua obra resultou numa exposição onde se pode encontrar a pintura quadro In Coimbra Law is red, de 1988, apresentado pela primeira vez em Blaupunkt Blues (Galeria Roma e Pavia, Porto, 1989). Nesse quadro vê-se uma imagem de Salazar, contudo o artista sublinha não só a ausência de uma dimensão política nessa tela, mas também que nunca seria capaz de fazer um retrato do ditador: "Era algo horrível de se realizar; nessa obra represento um retrato, assumindo este enquanto ready-made." E acrescenta: "O interesse estético da pintura é constatar que Salazar fez um curso vermelho, pois, em Coimbra a cor do curso de direito é o vermelho; a cor do Salazar é incólume ao vermelho, ele mantêm-se pétreo."
O título da exposição realizada em 1989, Blaupunkt Blues, é igualmente o do mais recente vídeo de António Olaio - são incluídos seis na mostra - e também o do seu próximo disco, que conta com a participação do seu habitual colaborador, o músico João Taborda. Todas estas associações surgem de uma espécie de "delírio conceptual" no âmbito do qual o artista encara a possibilidade de "voltar a pegar nos mesmos pontos de partida para fazer coisas diferentes".
Durante a montagem de I think differently, now that I can paint, António Olaio tomou a decisão de deixar abertas as janelas do CCVF, uma opção que, na sua opinião, foi das melhores da exposição: "Explorei o intervalo entre as janelas, assim distanciamo-nos da ideia do museu como bunker, pois a arte não precisa de ser neutralizada pelo sítio onde é mostrada; desse modo, as pessoas também não se sentem obrigadas a olhar só para os quadros, existe um exterior." Essa solução permite igualmente "voltar a uma ideia superada pelo modernismo, a do quadro enquanto janela".
Falta o título da exposição, que, para António Olaio, tem uma componente "mais cómica do que irónica, mas, ao mesmo tempo, [acredita] mesmo nisso, o conceptual a fazer as pazes com o artesanal."

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