Noise japonês e austríaco em Serralves

Keiji Haino e o projecto Fuckhead hoje e amanhã no ciclo paralelo à exposição O Corpo Como Utensílio. O Corpo Como Matéria

Vestido sempre de negro, de óculos escuros, o japonês Keiji Haino (Chiba, 1952) é o protagonista de mais um concerto do ciclo O Corpo Como Utensílio. O Corpo Como Matéria, paralelo à exposição homónima patente na biblioteca do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, no Porto. O espectáculo de hoje (Haino actua amanhã na ZDB, em Lisboa) irá incluir diversos momentos, nos quais o guitarrista irá não só interpretar temas noise e black blues, mas também improvisar uma banda sonora para a curta-metragem At Land (1944), realizada por Maya Deren.A escolha de Haino para o ciclo deveu-se ao facto de os seus concertos possuírem um intensidade "expressiva, gestual e mesmo visceral", como nota Pedro Rocha, programador de música da Fundação de Serralves. E acrescenta que a própria escolha dos instrumentos - o theremin digital, o air synth e o air FX - acentua essa dimensão performativa, na qual o corpo está em permanente interacção com o som.
Nome maior da constelação noise, que vai de Merzbow aos Sunn o))), artista de culto, Haino é um intérprete versátil, tendo incursões em várias áreas da música actual: rock, improvisação free, minimalismo, etc. Do início do seu percurso, pode destacar-se a influência quer do teatro da crueldade, de Antonin Artaud, quer dos Doors - conta-se que a audição de When The Music"s Over terá mudado a sua vida.
Em 1978, Haino funda os Fushitsusha, um grupo rock, e, em 1998, os Aihiyo, banda de covers que transformava originais dos Rolling Stones os dos Ronettes numa espécie de "psicadelismo de garagem". Faust, Boris, Jim O"Rourke, Derek Bailey, Peter Brotzmann, Lee Konitz, Bill Laswell, Napalm Death e Fred Frith são alguns dos nomes com os quais o guitarrista japonês tem colaborado.
Segundo Keith Cahoon, embora toque mais de oitenta instrumentos, Haino considera-se a si mesmo um cantor, "isto apesar de a maior parte do público considerar o seu trabalho vocal próximo do grito". O crítico musical acrescenta ainda o facto de o guitarrista ter gravado mais de cinquenta álbuns em diversas editoras, como a Tzadik, de John Zorn, a Table of Elements, os Disques du Soleil, a Avant ou a PSF.
O filme que é exibido durante a sua interpretação, At Land, é a segunda curta-metragem de Maya Deren, na qual esta aborda criticamente os rituais sociais. Nesta obra, a natureza é confrontada com a civilização: a cineasta rasteja sobre uma mesa onde decorre um jantar, justapondo estas imagens a outras de uma situação idêntica passada numa paisagem natural. Uma peça de xadrez, um passeio ao lado de John Cage, a paisagem marítima, são outros elementos de uma obra onde sobressai também a beleza da protagonista.
O ciclo O Corpo Como Utensílio. O Corpo Como Matéria prossegue amanhã com um concerto dos Fuckhead, projecto ligado aos artistas multimédia Didi Bruckmayer e Michael Strohman, herdeiros do Wiener Aktionismus (Accionismo vienense). Pedro Rocha sublinha que, neste espectáculo, "o universo do hard-rock se mistura quer com o da ópera, sobretudo no que respeita à teatralidade e o emprego melodramáticos das vozes, quer com o da música electrónica". É a promessa de "um universo de delírio" pleno de "intensidade e matéria orgânica".

O Corpo Como Utensílio. O Corpo Como Matéria
Hoje - Keiji Haino
Amanhã - Fuckhead
PORTO Auditório do Museu de Serralves. Telf. 226156500. Às 22h00. Bilhetes a 7,50 euros

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