Borat, "repórter do Cazaquistão", proibido nos cinemas russos

A comédia do britânico Sacha Cohen foi considerada "ofensiva para certas nacionalidades e religiões"

As autoridades russas acham que um filme que apresenta os seus vizinhos do Cazaquistão como um povo incestuoso e anti-semita, que gosta de beber urina de cavalo fermentada e de violar as suas mulheres - que são, aliás, quase todas prostitutas -, pode ser ofensivo para alguns espectadores. Por isso, a agência federal para a Cultura e o Cinema não autoriza a estreia na Rússia de Borat: Aprender Cultura da América para Fazer Benefício Glorioso à Nação do Cazaquistão, do cómico britânico Sacha Baron Cohen, que está a fazer delirar os americanos. A estreia do filme na Rússia estava prevista para o próximo dia 30 em 300 salas por todo o país. Se a proibição se mantiver, o filme do repórter cazaque Borat, a personagem de ficção criada por Sacha Baron Cohen, será uma das primeiras películas não-pornográficas a ser proibida na Rússia desde o fim da União Soviética, sublinhava ontem o diário Moscow Times.
Numa altura em que o Presidente Vladimir Putin e a sua administração são acusados de um crescente autoritarismo, a representante na Rússia da 20th Century Fox, distribuidora do filme, tentou acalmar a polémica. "Não se trata de uma proibição", disse Marina Bodiaguina ao jornal Kommersant. "Fomos nós próprios que tomámos a decisão de não projectar o filme [depois de conhecerem a posição da agência federal para o Cinema]. Mas isso não quer dizer que não possa ser visto na Rússia. Será lançado em DVD."
No fim-de-semana passado, quando se estreou nos EUA, Borat tornou-se um sucesso imediato, fazendo 26,49 milhões de dólares (20,73 milhões de euros) nos primeiros três dias, e batendo o recorde de receitas para filmes estreados em menos de mil salas. Não se esperava: a expectativa era que Borat ficasse nos primeiros cinco lugares, mas muito atrás de The Santa Clause 3: The Escape Clause. Mas, apesar de se ter estreado em 3458 salas, The Santa Clause ficou em segundo lugar nas receitas, com 20 milhões de dólares (15,6 milhões de euros).
Mas se os americanos deliram com o retrato xenófobo que Sacha Cohen faz da antiga república soviética, os responsáveis russos não vêem razões para rir. "O filme contém material que alguns espectadores podem considerar ofensivo para certas nacionalidades e religiões", explicou Iuri Vasiuchkov, chefe do organismo que atribui as licenças de distribuição, citado pelo Moscow Times.

Estratégia do CazaquistãoIsto não significa que os russos não possam ver as aventuras do repórter Borat Sagdiev por terras da América. Antes mesmo de ser lançado em DVD, o filme pode ser descarregado, ilegalmente, da Internet, e Borat é já um fenómeno de sucesso na blogosfera, com centenas de clips no YouTube.
No Cazaquistão o filme não foi proibido, mas o porta-voz da embaixada cazaque, Denis Tsariov, ouvido pelo mesmo jornal russo, disse achar difícil "encontrar uma distribuidora disposta a estreá-lo". Há uns meses, um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros cazaque tinha também dito que esperava que "as distribuidoras mostrassem responsabilidade e não exibissem o filme [que é] insultuoso para o povo do Cazaquistão e pode levar as pessoas a criticar o Governo por permitir este tipo de coisas". No entanto, o Governo daquele país garante não ter pedido a Moscovo que proibisse o filme.
A reacção inicial do Cazaquistão quando o conteúdo do filme se tornou conhecido foi de fúria, e a primeira medida tomada foi o encerramento do site de Cohen, www.borat.kz, o que o obrigou a criar outro, www.borat.tv. Mas rapidamente as autoridades cazaques mudaram de estratégia.
Em Setembro, antes de uma visita aos Estados Unidos do Presidente Nursultan Nazarbaiev, o Governo comprou um suplemento de quatro páginas, a cores, no New York Times, para apresentar a ex-república soviética como um país com uma economia estável, capacidade de atrair investidores estrangeiros, e uma capital cosmopolita e moderna.
No mês seguinte, o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Rakhat Aliev, convidou Cohen a visitar o país. "Acho que ele iria descobrir muitas coisas", disse, "entre as quais que as mulheres guiam carros, o vinho é feito de uvas e os judeus são livres de frequentar as sinagogas". E ainda acrescentou: "Temos que ter sentido de humor e respeitar a liberdade criativa dos outros."

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