Águas ácidas de antiga mina espanhola matam milhares de peixes no rio Chança

Escorrências contaminadas podem ter chegado à barragem que abastece cidade de Huelva. Exemplares de uma das espécies mortas só existem na zona do Guadiana

Nos últimos dias, o troço do rio Chança que corre próximo da povoação de Corte do Pinto foi afectado por escorrências provenientes da antiga mina de cobre espanhola de Vuelta Falsa.A intensidade da chuva que caiu na margem esquerda do Guadiana arrastou para o curso de água substâncias sulfurosas que provocaram a morte de milhares de diferentes espécies de peixes: achigã, saramugo, bordalo, escalo, barbo e chichito. O saramugo está classificado como espécie "em perigo" em Portugal e em Espanha, nos livros vermelhos dos vertebrados.
Este ponto da fronteira entre os dois países é de resto o único local do planeta em que vive o pequeno peixe, que raramente atinge os sete centímetros de comprimento. No território nacional é possível encontrá-lo nalguns afluentes do Guadiana (nas sub-bacias do Caia, Xévora, Álamo, Degebe, Ardila, Chança, Carreiras, Vascão, Foupana e Odeleite).
O grau de corrosão destas escorrências produzidas nas escombreiras - que são os entulhos resultantes da exploração mineira - mata qualquer espécie de peixe, dado o seu elevado grau de acidez. As escombreiras da antiga mina de cobre de Vuelta Falsa, contemporânea da mina portuguesa de S. Domingos, estão localizadas na margem do rio Chança, com a agravante de um afluente seu atravessar o interior das escórias contaminadas.
Quando chove com muita intensidade no Verão, como aconteceu nos últimos dias, o leito quase seco do rio Chança é repentinamente percorrido por uma torrente caudalosa. As águas contaminadas com derivados de enxofre desaguam nas derradeiras zonas húmidas que são vitais no período estival para a preservação das espécies de peixes, sobretudo as mais vulneráveis, como o saramugo. Numa fracção de minutos um dos maiores pegos do Chança foi transformado numa pestilenta lagoa de águas ácidas. O pego é o sítio mais fundo do rio, onde permanece água quando ele seca.
Ontem o pego apresentava-se colorido de várias tonalidades - vermelho, roxo, laranja, amarelo e verde - e nele boiavam, mortos, milhares de pequenos peixes, ao mesmo tempo que os cheiros metálicos impregnavam o ar. Primeiro aparece a cor verde, sinal que a água está a perder o oxigénio, explica um residente nas proximidades. Quando tal acontece, o peixe apanha-se com facilidade, mas está irremediavelmente condenado. Depois surgem as outras tonalidades, que acabam por deixar o fundo do pego completamente negro, desprovido de vida animal.
O que aconteceu no troço do rio Chança, a cerca de dez quilómetros da povoação de Corte do Pinto, é um desastre ambiental recorrente, garante o mesmo morador. "É uma situação que contribui para a degradação da qualidade da água bruta" retida na barragem espanhola do Chança, acrescenta. A partir da sua albufeira é assegurado o consumo humano na cidade espanhola de Huelva e da povoação portuguesa do Pomarão. Também os animais são afectados pela ausência de um sistema de retenção das escorrências produzidas na antiga mina de Vuelta Falsa, localizada em plena zona de pastoreio. Um rebanho de cabras desceu ansioso uma encosta íngreme, do lado espanhol, para beber água no pego que afinal estava contaminado.
Ontem não foi possível questionar nenhuma entidade sobre um problema ambiental que não é novo, mas que até ao momento não teve solução.

Sugerir correcção