Torne-se perito

25 de Abril de 1976 O dia da revolução da cor na televisão portuguesa

Parte da emissão sobre
as eleições legislativas
e um documentário
sobre Lisboa trouxeram
a cor à RTP

Era dia de eleições. A 25 de Abril de 1976 Portugal escolhia os representantes para a Assembleia da República. Mas dois anos depois da revolução dos cravos, a televisão portuguesa preparava-se para outra revolução: passar a emitir a cores o que, desde 1957, ano do seu nascimento, só fazia a preto e branco. A primeira experiência rumo a esse caminho deu-se faz hoje 30 anos, com a transmissão de um documentário sobre Lisboa realizado por Alfredo Tropa. Não havia ainda televisores a cores nos lares portugueses, mas alguns sortudos puderam ver parte da emissão sobre as eleições (ver págs. 12/13 nesta edição), já com cor, em locais públicos.Os portugueses ainda não sabiam o que a RTP andava a preparar. Nos televisores que tinham em casa apenas era possível ver a emissão a preto e branco. Mas preparava-se uma revolução de cor. Eládio Clímaco lembra o "frenesim" que foi a primeira experiência a cores da RTP: "Foram cerca de 30 minutos de um documentário narrado por mim e realizado pelo Alfredo Tropa."
Estava-se em dia de eleições e Eládio Clímaco era um dos locutores de serviço. "Mas Joaquim Letria era o locutor principal", lembra uma das vozes mais populares da televisão portuguesa, que recorda como tudo desde então começou a mudar na maneira como se fazia televisão. "Finalmente havia cor. Já não era possível pensar nas cores que se vestiam como tons escuros ou claros. Começámos a aprender que não era possível usar branco ou preto, as riscas e alguns tons de vermelho também não. A caracterização mudou radicalmente. Os pós que se usavam para o brilho da cara eram em tons avermelhados. Deixou de se poder usar isso e começaram a usar-se os bejes. Tínhamos de vestir roupa mais fotogénica. Aquilo que foi a mudança da cor nunca mais se vai repetir", descreve Eládio Clímaco sobre a mudança radical que se iniciou na RTP em 1976.
Ismael Augusto, hoje conselheiro da RTP na área da engenharia, era então director técnico e recorda também como tudo de repente estava a mudar, 19 anos depois da primeira emissão regular de televisão em Portugal. "Aquilo foi uma alteração extraordinária. O preto e branco baseava-se só no brilho. Com a cor, os cenários e os cenografistas passaram a ter um papel muito diferente, eram muito mais importantes, passou-se a ter mais cuidado com o guarda-roupa. Introduziu-se o conceito de temperatura de cor, já para não falar na realização e montagem de imagem, que foram completamente alteradas."
Nuno Teixeira, realizador da RTP naquela época, frisa ainda uma certa mudança na maneira de realizar: "Passou a haver um maior perfeccionismo na construção da imagem como um todo, surgiram preocupações que não existiam com o preto e branco", recorda.

Europa a duas velocidadesA televisão a cores tinha nascido nos Estados Unidos em 1954, três anos antes de a RTP iniciar a sua emissão regular, em 1957. A televisão portuguesa já vinha a estudar a passagem do preto e branco para a cor há algum tempo. França usava um sistema de gravação em cor, o Secam (do francês séquentiel couleur avec mémoire). Mas estava isolada na Europa. A Alemanha, por outro lado, vinha gradualmente a convencer os outros países da Europa a aderirem ao seu sistema, o PAL (Phase Alternate Line).
Em 1976, o primeiro teste da RTP foi realizado com material cedido pelos franceses. Mas a televisão pública portuguesa acabou por se render ao PAL e em 1977 comprou o seu sistema novo de gravação com cor: "A primeira gravação a cores feita pela RTP foi um espectáculo de Chico Buarque, chamado Fado Tropical. Depois veio o Festival da Canção, gravado no estúdio 1 do Lumiar. E a primeira peça de teatro, A Maluquinha de Arroios, foi gravada em 1978 e tinha uma cor muito garrida."
Em 1979, a RTP faz a primeira transmissão a cores de um programa integral e ao mesmo tempo emite para a Europa através da Eurovisão. O programa que fez história foi uma emissão dos Jogos Sem Fronteiras, e realizou-se na Praça de Touros de Cascais, com apresentação de Eládio Clímaco e Fialho Gouveia - vozes que ficaram para sempre ligadas aos Jogos. Esta emissão antecipou o arranque das emissões regulares a cores na televisão portuguesa, a 7 de Março de 1980, dia do aniversário da RTP. Só depois disso, gradualmente, as famílias foram substituindo os televisores a preto e branco pelos aparelhos a cores.
Hoje a revolução que se pode esperar da televisão está no bolso de todos, em cada telemóvel. Ismael Augusto, actual consultor da RTP na área da engenharia, defende que a grande mudança que a cor trouxe à televisão é algo que nunca mais se vai repetir na história da televisão: "A mudança com a cor foi fortíssima. A passagem para o digital, por exemplo, foi menos violenta. Talvez se venha a sentir algo na mesma dimensão com a passagem para a alta definição." Mas a revolução na TV hoje já não se faz pelo hardware mas sim pelo software. "Estamos a assistir hoje a outra grande mudança. As tecnologias de informação têm uma grande presença e vão trazer muita coisa nova", lembra sobre as emissões de televisão por telemóvel: "É a verdadeira ubiquidade da televisão, a TV em directo", diz Ismael Augusto sobre a nova maneira de pensar e transmitir a televisão, que será decerto algo em que os responsáveis vão pensar de modo prioritário nos próximos tempos.

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