O MySpace é um dos sites mais populares no mundo. O Hi5 é um dos mais visitados em Portugal.
Não sabe o que são? Pergunte ao seu filho. Parte diário, parte clube social, têm a fama que têm,
sobretudo entre os adolescentes, porque permitem multiplicar amigos

Por Kathleen Gomes

Se as palavras MySpace ou Hi5 não lhe dizem nada, então considere isto como cientificamente comprovado: você não é um adolescente. Até se pode sentir como um, mas, sobre isso, os adolescentes, os que estão na idade de o serem, só terão, provavelmente, uma coisa a dizer: lol. O MySpace e o Hi5 são redes - onde os membros criam a sua própria comunidade de amigos -, mas a sua forma mais parece uma espiral. As possibilidades são infinitas, e o velho ditado segundo o qual "os amigos dos amigos meus amigos são" talvez nunca tenha feito tanto sentido. Na verdade, ele não chega para abarcar a dimensão do fenómeno em causa. E, para sermos precisos, teríamos de o adaptar aos novos tempos: "Os amigos dos amigos meus amigos são - desde que também tenham uma página no MySpace ou no Hi5."
Especificando: criar uma página pessoal, com perfil desejavelmente detalhado, desde as preferências musicais à orientação sexual, é condição sine qua non para aceder a esses sites. A partir daí, pode convidar os seus amigos a criarem também uma página, e os seus amigos trarão amigos, que, por sua vez, trarão amigos. Difícil é ver o fim da cadeia. Se tem poucos amigos, isso passará à história porque o MySpace e o Hi5 permitem-lhe contactar outras pessoas com quem tenha afinidades e interesses comuns. Amantes de kizomba ou do Canal História, admiradores do Japão (e de mulheres japonesas), body-builders, nadadores olímpicos, fãs do José Cid, génios matemáticos: os vossos semelhantes estão à distância de um clique.
Alguém disse que sites como o MySpace ou o Hi5 são como blogues simplificados para as massas: uma forma de expressão pessoal, em registo mais ou menos diarístico, interactivo, ou, se se preferir, comentado. A revista Business Week foi ao ponto de descrever o MySpace como "um clube nocturno aberto 24 horas por dia, sete dias por semana".
Panorama geral do que ocupa os adolescentes nesses sites: exacerbações amorosas (toda a gente diz que se ama, de forma superlativa), declarações pungentes de amizade tiradas de um qualquer poster de feira com pôr do Sol ("porque os amigos fazem parte do mundo que eu, tremulamente, construí, e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida"), provocações, private jokes, resíduos públicos de conversas privadas (o "dono" da página decide o que torna público ou não), uma ou outra inconfidência (por vezes, sobre terceiros).

Uma forma de aparecer.comNum cenário (português) onde A Lua de Joana impera como livro preferido e, não raras vezes, orgulhosamente o único, Rita (nome fictício), 17 anos, estudante na Escola Secundária de ensino artístico Soares dos Reis, no Porto, destaca-se pela diferença no MySpace: a lista de leituras quase ascende à meia centena, de Dostoievski a Al Berto. E, já que estamos a falar de preferências: João César Monteiro não é das mais comuns.
Os amigos e amigas dela também estão no MySpace. O que talvez a tenha convencido a aderir também, "há uns 11 meses", apesar de estar "um pouco relutante" porque "é uma frivolidade". Rita, que aceitou falar com o PÚBLICO por e-mail, não poupa o MySpace: "Sei perfeitamente que é uma forma de aparecer, show off e todos os que participam só posers, querendo passar uma imagem que, muitas vezes, não corresponde à realidade." Para ela, que tem 481 "amigos" no MySpace, da Islândia ao Texas, "a única utilidade é conhecer bandas novas". Banda que se preze está no MySpace - da mais desconhecida à mais popular, proporcionando downloads das suas músicas em primeira mão, e explorando o filão da proximidade com os fãs (bem vistas as coisas, um site como o MySpace é a melhor pesquisa de mercado).
Guilherme Calvão, 17 anos, em fase de provas físicas de acesso à Universidade de Desporto, estava "precisamente" a consultar o Hi5 quando o PÚBLICO ligou. "Viciado, viciado, não me considero. Mas não passo dois dias sem lá ir." Guilherme, que mora em Vila Real de Santo António, tem 128 "amigos" na sua página do Hi5, incluindo um tal de "Mourinho", residente em Londres, e assalariado do Chelsea... (sim, é um logro, como a maioria das páginas de famosos). Mas não é isso que Guilherme quer dizer quando afirma que o que gosta no Hi5 é de "procurar fotografias de pessoas conhecidas". Conhecidas dele, isto é, familiares. "Pratico natação, de competição mesmo, e quando vou a provas vejo quem nada bem, quem nada mal." Depois, bem, depois, acontece reconhecê-los no Hi5. "Estou a explorar as fotografias e, de repente: "Conheço esta cara de algum lado..." Vou ver e também é nadador."
Guilherme não conheceu propriamente a namorada no Hi5, mas quase. Tinham amigos em comum, estiveram juntos um dia na praia. Mais tarde, ela redescobriu-o no Hi5. Perguntamos se devemos acreditar nalguma coisa do que Guilherme escreveu no seu perfil do Hi5. Quer dizer, gostava mesmo de conhecer Santana Lopes? "Gostava, eu sou santanista." É mesmo ultraconservador? "Ninguém há-de acreditar, pelas minhas fotografias, que eu sou ultraconservador... É uma forma de ter piada. Como dizer que gosto da música dos Delfins."

A pior maneira. E a melhorFaltava dizer, e não é coisa tão menor quanto isso: as páginas do Hi5 e do MySpace contêm fotografias dos seus utilizadores, submetidas ao escrutínio dos outros, das mais cândidas às mais provocantes, em cenário de férias ou sozinhos em casa, aproveitando a ausência dos pais.
A distância torna, talvez, as pessoas mais desinibidas. "As pessoas podem dizer coisas que não diriam frente-a-frente, estão mais à-vontade", resume Rita. Tito de Morais, fundador do projecto MiudosSegurosNa.Net, um serviço de apoio sobre segurança infantil na Internet, é frequentemente procurado por pais e professores, notando que nos últimos dois meses houve "um acréscimo muito significativo" de consultas relacionadas com comunidades on-line. Os pais têm noção de que esta realidade existe, e que os seus filhos fazem parte dela?
"Sou tentado a dizer que a maior parte não têm noção. E começam a saber que existe da pior maneira." Porque a exposição pessoal nesses espaços, pode, por vezes, ser demasiada, porque as fotografias não correspondem à imagem que têm dos filhos ou porque, sim, por vezes, há conversa de engate.
Pai de um adolescente e de um pré-adolescente, Tito de Morais sugere: "O que temos de fazer é adoptar alguns comportamentos que temos cá fora, mas que, por ser a Internet, parece que há um interruptor cerebral que se desliga e a gente pensa que é de outra maneira. Se o meu filho me diz "vou a casa do Manel", eu vou querer saber quem é o Manel, e onde é a casa dele. Se pergunto quem é o Manel, é lógico que também queira saber quem são as pessoas que estão na lista de contactos dele no MySpace ou no Hi5. Se começarmos a tratar estas questões aos seis ou aos nove anos, quando eles têm os primeiros contactos com a Internet, quando eles tiverem 16 é natural nós estarmos envolvidos. Se o fizermos só agora é uma intrusão."
Perguntamos a Guilherme se os pais sabem do Hi5. "Hmmm... Não sei, devem saber. Nunca lá foram, mas..."
Rita? "Os meus pais não sabiam até ao dia em que recebi esta mensagem do PÚBLICO, pelo que lhes contei. Eles acharam estranho e acham que é uma brincadeira."
Não era, lol (acrónimo de laugh out loud, gargalhada sonora).

www.myspace.comwww.hi5.com