Torne-se perito

Português recebeu um rim no dia em que o homem chegou à Lua

Estavam Neil Armstrong e Buzz Aldrin a pisar a Lua, a 20 de Julho de 1969, e Alexandre Linhares Furtado, dos Hospitais Universitários de Coimbra, fazia o primeiro transplante em Portugal. Era de um rim, de um dador vivo. Depois, até à primeira transplantação de coração portuguesa, há 20 anos, tudo se limitava a rins e córneas, conta Rui Bento, director, nos anos 80 e 90, do Serviço de Cirurgia Cardiotorácica do Hospital de Santa Marta (Lisboa). Mas os resultados dos rins, até aos anos 80, não eram grande coisa, porque os imunossupressores, que evitavam a rejeição, eram insuficientes, refere o nefrologista Domingos Machado, coordenador da Unidade de Transplantação Renal do Hospital de Santa Cruz (Oeiras) e ex-presidente da Sociedade Portuguesa de Transplantação.
O primeiro programa português de transplantes - renal - arrancou em 1980, com Linhares Furtado a colher dois rins. Um transplantou-o em Coimbra, o outro seguiu para o Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa, onde João Rodrigues Pena o transplantou. Começava aí a segunda época de transplantes no país. Aos rins, seguir-se-ia o coração.
Cerca de um mês após o primeiro transplante cardíaco, a equipa de Bento avançava para o segundo, com uma particularidade: o doente ficava com dois corações, aquele com que nasceu e um transplantado, a trabalharem em paralelo.
O transplante cardíaco em paralelo foi feito pela primeira vez em 1974, por Barnard, o sul-africano que transplantou o primeiro coração, em 1967, e com quem Bento trabalhou. Pensava-se que, em certas situações, o coração doente podia recuperar e um segundo ajudá-lo-ia, para depois ser retirado, ou pelo menos podia manter vivo o doente se o seu coração falhasse. Mas esta prática foi abandonada em favor da substituição do coração, porque não tinha assim tantas vantagens. Cá, só um doente teve dois corações. "Viveu pouco tempo", diz Rui Bento.
Mas por que levou quase 20 anos a fazer-se um transplante cardíaco em Portugal? "Quando vim, em 1970, foi para fazer cirurgia cardíaca. Só quando a cirurgia cardíaca evoluísse em Portugal se pensaria em fazer transplantes, que são a última coisa a fazer a um doente", diz.
Fígado e pulmões foram a sequência no país, onde Bento foi pioneiro no primeiro transplante simultâneo de coração e dois pulmões, em Maio de 1991. O doente, de 18 anos, viveu três anos, até não conseguir debelar uma infecção viral. T.F.

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