Património centenário da Sociedade Martins Sarmento continua desconhecido

Os monumentos nacionais e imóveis de interesse público centenários a cargo da SMS nunca contaram com o apoio
do Estado

A Sociedade Martins Sarmento (SMS), instituição vimaranense criada para promover a instrução popular e homenagear o conhecido arqueólogo natural de Guimarães Francisco Martins Sarmento (1833-1899), possui um dos museus arqueológicos mais antigos de Portugal, uma biblioteca de livros centenários que ultrapassa os cem mil volumes, entre os quais uma 1ª edição de Os Lusíadas, mais de uma dezena de imóveis de interesse público e a publicação de uma das mais antigas e prestigiadas revistas portuguesas de carácter científico. Com 124 anos de idade, aniversário assinalado ontem, o património da Sociedade é valorizado apenas pela comunidade científica e desconhecido até a nível local. Patrocinada desde a sua fundação por homens abastados, hoje a SMS continua a não receber qualquer apoio do Estado. Vive de rendimentos herdados do seu patrono, créditos bancários e dedicação de voluntários. Com o Governo de José Sócrates, espera conquistar notoriedade, meios e profissionalização.
Nascida em 1881, pelas mãos de "ilustres vimaranenses" preocupados com a pouca instrução escolar, a SMS manteve sempre o "bairrismo quase doentio" dos seus fundadores e beneméritos, nota o actual presidente da instituição, Amaro das Neves. Cidadãos de famílias abastadas, os pais da primeira instituição cultural vimaranense sem fins lucrativos engrandeceram-na, mas também impediram a sua projecção. Sem poder contar com a "boa vontade de homens ricos" que outrora a financiaram, a Sociedade enfrenta hoje uma realidade problemática: muitos encargos e poucos recursos. O legado de Martins Sarmento "é a nossa grande virtude e o pior problema", resume Amaro das Neves.

Um património vasto e valioso
Testamentária de vários vimaranenses, um dos quais o escritor Raul Brandão, a SMS alcançou "um nível difícil de sustentar, mas crítico de travar", acrescenta o presidente. Sem receber "rigorosamente apoio nenhum" por parte do Estado, apenas o resultante de um protocolo com a autarquia, conservar, restaurar e fazer a manutenção do vasto acervo que possui e dos projectos que alimentou "não é coisa pouca", acentua. Além de fundos documentais, a associação detém o edifício onde está sediada, que ocupa um antigo claustro gótico e o jardim de um extinto convento, albergando também o museu arqueológico. Os castros de Briteiros e de Sabroso, candidatos a património da humanidade, mais de dez monumentos arqueológicos, desde Bragança até Barcelos, e o Museu de Cultura Castreja completam a lista de bens imóveis que supervisiona. E, em cofre bancário, estão guardados vários "tesouros".
Fruto de uma recente relação com a Universidade do Minho (UM), de onde saiu a primeira unidade cultural da academia em Guimarães, a Casa de Sarmento, surgiram alguns laços entre a Sociedade e a comunidade. Os trabalhos levados a cabo por um dos responsáveis da Unidade de Arqueologia da UM, Francisco Sande de Lemos, notabilizaram sobretudo a citânia de Briteiros, visitável através de uma viagem virtual disponível no site da unidade. Desta parceria resultou também a digitalização e publicação on line de todos os volumes da Revista de Guimarães, editada desde 1884.
De acordo com Amaro das Neves, o resultado é positivo, mas "insuficiente". Posta de parte pelos anteriores governos, as esperanças de granjear o "reconhecimento do Estado" cresceram a partir das últimas legislativas. A ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, está atenta ao problema e prometeu discuti-lo numa reunião a realizar a "curto prazo". O principal obstáculo parece ser o enquadramento da instituição nos moldes de financiamento do Estado, dada a sua diversidade, assinala o presidente. Para o próximo ano, o Orçamento de Estado não contempla qualquer verba para a SMS. O gabinete de imprensa do Ministério da Cultura adiantou apenas que a relação com a instituição de Guimarães será estudada depois de realizado o referido encontro.

Sugerir correcção