Ameaçada maior população de cavalos-marinhos do mundo

Ria Formosa sofre efeitos da extracção de areias e circulação de embarcações de recreio

A sobrevivência dos cerca de dois milhões de cavalos-marinhos da Ria Formosa, uma das mais densas populações do mundo, está a ser ameaçada pela destruição do seu habitat, segundo alertam especialistas.Um estudo realizado ao longo dos últimos cinco anos sob a direcção da bióloga canadiana Janelle Curtis concluiu que a extracção de areias, a dragagem descuidada dos canais e a circulação descontrolada de embarcações de recreio estão a destruir vastas áreas de ervas marinhas, o habitat por excelência daquela espécie.
A investigação, realizada no ambiento do projecto internacional Seahorse, baseou-se na análise a 700 cavalos-marinhos e permitiu distinguir duas espécies: o Hippocampus Guttulatus, a mais comum, e o Hippocampus Hippocampus, com cerca de 200 mil exemplares. Os cavalos-marinhos concentram-se essencialmente nas chamadas "pradarias" de ervas marinhas, uma espécie de floresta subaquática onde se escondem dos predadores e se alimentam de pequenos crustáceos.
Segundo Janelle Curtis, a permanente extracção de areias na Ria Formosa é a maior ameaça às populações de cavalos-marinhos e a outras espécies que ali habitam. "Estou muito preocupada com os efeitos que a actividade possa causar a longo prazo ", disse, alertando que o seu impacto na biodiversidade da ria requer "uma rigorosa e imediata avaliação científica".
A dragagem descuidada dos canais é outro dos problemas na conservação dos habitats dos cavalos-marinhos, segundo Ester Serrão, da Faculdade de Ciências do Mar e Ambiente da Universidade do Algarve. "Quando se fazem dragagens ao fundo da ria, devem deixar-se manchas de ervas nas pontas dos canais, uma vez que as que são arrancadas pela raiz já não voltam a crescer".
A mesma bióloga explicou que as ervas não voltam a crescer porque na Ria Formosa predomina o género masculino daquele tipo de planta marinha, que não tem capacidade de produzir sementes. A direcção do Parque Natural da Ria Formosa também está atenta ao problema. Segundo uma técnica do organismo, Isabel Pires, foram proibidas dragagens ou instalação de viveiros nas zonas de maior concentração de cavalos-marinhos.
A revisão do Plano de Ordenamento da Orla Costeira Vilamoura-Vila Real de Santo António está igualmente a ter em conta a preservação dos habitats dos cavalos-marinhos, acrescentou Isabel Pires. Outra ameaça à espécie é o tráfego descontrolado de barcos e a falta de sinalização adequada dos canais que faz com que, por vezes, as hélices dos barcos "lavrem" o fundo da ria, sobretudo quando a maré está baixa, arrancando partes consideráveis de ervas.
"Quando se mergulha na ria vêem-se autênticas auto-estradas no meio das pradarias por causa das hélices", diz Ester Serrão, defendendo que a circulação de barcos a motor seja proibida em determinadas zonas. Os cavalos-marinhos são animais que gostam de "namoriscar", mantendo rituais amorosos que incluem a mudança de cor e uma dança "nupcial" entre o macho - que gera os bebés - e a fêmea. O calor, a oxigenação constante da ria através da entrada da água do mar e o facto de ser extremamente rica em nutrientes pode justificar a extensão da população da espécie na Ria Formosa, um "tesouro nacional" que nem sempre parece ter a atenção merecida. Marta Duarte, Lusa

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