Matança do porco em Barrancos invocando fins didácticos

É a terceira vez que a Confraria dos Gastrónomos de Beja concretiza o abate sem que a GNR tenha recebido instruções para intervir

Apesar das dúvidas sobre a legalidade da matança do porco alentejano, a Confraria dos Gastrónomos do Distrito de Beja (CGDB) insiste em levar por diante a iniciativa. Escolheu desta vez Barrancos para, juntamente com outras 25 confrarias congéneres oriundas de vários pontos do país e de Espanha, consumar uma prática tradicional, que é justificada por razões didácticas e culturais.Em 2004, foi Panóias/Ourique o local escolhido. Nessa altura o governador civil de Beja, João Paulo Ramôa, autorizou a matança, depois de consultar juristas e o Ministério Público. Mas a CGDB teve de assegurar que a legislação comunitária não seria beliscada pelo abate, que, por razões de higiene e segurança sanitária, só pode fazer-se nos matadouros certificados.
No entanto, a Directiva Comunitária nº196/2000 autoriza a matança do porco fora dos locais previstos na lei, quando estejam em causa objectivos culturais e pedagógicos. É esta a finalidade que a CGDB alegou, ao pedir autorização para a iniciativa de Barrancos. Prevê que venham a participar no encontro que se realiza hoje, pelas 14h30, cerca de 300 pessoas.
José Cândido, presidente da Associação de Criadores de Porco Alentejano (ACPA), que colabora na iniciativa com a peça para abate, refuta as acusações de infracção à lei, frisando que o objectivo "tem fins pedagógicos e didácticos, pois pretende apenas descrever a forma tradicional de abate do porco alentejano". O presidente da ACPA garante que "a carne não será degustada sem observação prévia de um médico veterinário" e que todos os passos da matança serão explicados aos presentes. Cândido sustenta a matança do porco pela necessidade de preservar as tradições próprias do mundo rural, "que eram prática corrente até há meia dúzia de anos".
O comandante do destacamento da GNR sediado em Moura, alferes Lérias, disse ao PÚBLICO, que já contactou a confraria e a Câmara de Barrancos, para os informar de que têm de cumprir os requisitos legais. "Ambas as entidades garantiram que será cumprida a legislação em vigor", salientou.
A directiva comunitária determina que, antes de ser abatido, o animal tem de ser observado pelo veterinário. Neste caso será o da câmara. Segue-se o leilão do animal entre os sócios da confraria para que tenha um dono. Este pode então pedir ajuda a quem quiser para o abate e para distribuir a carne pelos familiares de quem ficou com o suíno.
A legislação impõe ainda que não haja comércio da carne ou pagamento de qualquer entrada para a refeição. No essencial, são as mesmas exigências colocadas ao consumo de carne proveniente dos touros mortos durante as festas de Barrancos.
A CGDB garantiu ao alferes que "o porco já tem proprietário", mas o comandante da GNR de Moura advertiu que "o fruto da matança não pode ser consumido". Em seu lugar terá de ser consumida a carne de outro suíno abatido no matadouro de Beja.
A GNR não recebeu instruções para intervir ou vigiar o acto, nem montou nenhum dispositivo especial. Mas, se houver infracções ao legislado, as "patrulhas na rua actuarão de imediato", salientou o alferes Lérias.

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