Imagens de satélite provam a existência de ondas gigantescas

As ondas gigantes, que se pensava serem apenas um mito de marinheiros e pertencerem ao imaginário, são afinal bem reais. O projecto científico MaxWave, pioneiro na União Europeia, onde também participaram investigadores portugueses, conseguiu provar que há ondas monstruosas a elevarem-se até à altura de um edifício de dez andares e que são uma das principais causas do afundamento de grandes navios.Apesar de haver o registo, nas duas últimas décadas, do afundamento de mais de 200 superpetroleiros e navios porta-contentores com cerca de 200 metros de comprimento, por causa do mau tempo, a questão não suscitava grande interesse na comunidade científica. "Em média, dois grandes navios afundam-se todas as semanas, mas as causas nunca são estudadas com o mesmo pormenor de um desastre de avião. Atribuem-se simplesmente ao mau tempo", conta o coordenador do projecto europeu, Wolfgang Rosenthal, do centro de investigação alemão GKSS, num comunicado da Agência Espacial Europeia (ESA). Carlos Guedes Soares, da Unidade de Engenharia e Tecnologia Naval do Instituto Superior Técnico, em Lisboa, um dos investigadores portugueses envolvidos no projecto, diz que o ponto de viragem aconteceu a 1 de Janeiro de 1995: uma onda gigantesca danificou a plataforma petrolífera Draupner, no Mar do Norte, onde 27 metros acima do nível do mar ainda se registaram estragos. E um dispositivo laser na plataforma registou uma onda com 26 metros de altura. Foi o "momento de impacte", como lhe chama Guedes Soares. Não há registos deste género de ondas ao largo da costa portuguesa, nem de qualquer caso envolvendo um navio nacional. Em Dezembro de 2000, a União Europeia deu início ao projecto científico MaxWave com o intuito de confirmar a existência destas "ondas anormais", como as designa o investigador português. Saber a frequência com ocorrem, analisar as suas implicações e efeitos nos navios e plataformas petrolíferas e o que as origina eram ainda os objectivos do projecto.Com a duração de três anos, o projecto, entre outras coisas, analisou imagens obtidas pelos satélites ERS-1 e ERS-2, lançados pela ESA em 1991 e 1995, respectivamente, e que ajudaram a estabelecer a existência generalizada das ondas anormais. Pensava-se que estas ondas só ocorriam uma vez em cada dez mil anos. Mas a equipa do MaxWave identificou, num período de apenas três semanas, mais de dez ondas individuais acima dos 25 metros de altura em todo o mundo, refere o comunicado da ESA. "Chegámos à conclusão interessante de que, apesar de não serem muito frequentes, também não são tão raras quanto isso", confirma Guedes Soares. A equipa de investigação portuguesa dedicou-se a estudar registos da medição de ondas por bóias colocadas em alto mar e de sensores nas plataformas petrolíferas. "Conseguimos números mais apreciáveis do que pensávamos", conclui o investigador. Este estudo mostrou também o efeito destruidor das ondas nos navios e nas plataformas, permitindo aos investigadores calcular e prever o esforço a que as estruturas seriam submetidas. Para o efeito, houve a preocupação de reproduzir estas ondas anormais em tanques preparados para este tipo de fenómenos na Alemanha. O facto de as ondas aparecerem com relativa frequência teve implicações também a nível económico e de segurança, uma vez que os navios e as plataformas petrolíferas actuais são construídos para suportar onda com a altura máxima de 15 metros. "O que tem de ser repensado", acrescenta Guedes Soares. Daí que este tipo de investigação pode contribuir para recomendar alterações na concepção dos navios, por exemplo.Por apurar ficou o que origina estas ondas anormais, embora apareçam principalmente em zonas propícias a fortes correntes oceânicas, como o Mar do Norte, ou em zonas onde ocorram frentes e depressões atmosféricas. Guedes Soares refere que os estudos sobre a origem das ondas anormais têm de continuar, mas a equipa está ainda à procura de fontes de financiamento. "Os próximos projectos irão tentar perceber o que constitui estas ondas anormais, para as podermos prever." Um projecto nesta área ainda em curso, o WaveAtlas, referido no comunicado da ESA, termina em 2005 e utiliza imagens captadas durante dois anos por satélite, para criar um atlas mundial de ocorrências de ondas anormais e efectuar análises estatísticas. Estas imagens poderão também ser úteis noutras áreas, porque permitem ver outros elementos como blocos de gelo flutuantes, manchas de petróleo e a localização de navios.

Sugerir correcção