Torne-se perito

EUA estendem luta contra o terrorismo ao Sahel

Desde a guerra do Afeganistão que os Estados Unidos referem a fuga de membros da Al-Qaeda para países africanos onde instituições débeis e territórios semidesérticos favorecem o desenvolvimento de infra-estruturas de treino e redes de recrutamento. Depois de um esforço inicial para levar forças e garantir o apoio das autoridades no Corno de África, as preocupações ampliaram-se mais recentemente para a zona do Sahel (a região da fronteira sul do Sara) e para os países do Magrebe.Três dias antes dos ataques de Madrid, onde entre os suspeitos já foram entretanto detidos três marroquinos, o vice-comandante do Comando Europeu americano - que cobre toda a África excepto o Corno - sublinhava o interesse da Al-Qaeda na região. "Temos de tratar disto. À medida que os cercamos eles estão a migrar para África", disse a um grupo de jornalistas o general Charles Wald.Segundo Wald, que acaba de concluir uma viagem com paragens em onze países africanos, o interesse da Al-Qaeda no Sahel é uma certeza adquirida. No terreno estão já cerca de 200 membros das forças especiais norte-americanas divididos em equipas que actuam no Mali e na Mauritânia. Esta presença é o princípio da concretização da Iniciativa Pan Sahel, lançada por Washington no final do ano passado para equipar, treinar e coordenar as forças de segurança dos quatro países da região - para além, do Mali e da Mauritânia, o Chade e o Níger.Entre os indícios que levaram Washington para a área esteve o sequestro, na Primavera de 2003, de 32 ocidentais no Sul da Argélia pelo Grupo Salafita para a Prédica e o Combate (GSPC), incluído pelo Pentágono na lista de movimentos vinculados à Al-Qaeda. O desenvolvimento do sequestro, com parte dos reféns a serem transferidos para o Mali pôs em evidência a facilidade com que o grupo se move pelo deserto do Sara e pelas suas fronteiras porosas.O comando europeu tem indicações de que alguns terroristas foram enviados para o Iraque a partir do norte e ocidente de África, onde a Al-Qaeda se tenta estabelecer e começou a tentar recrutar nos últimos dois anos. E as autoridades acreditam que existem células da rede na Mauritânia.Em Dezembro, o Departamento de Estado norte-americano avisou os seus cidadãos para não viajarem para o Norte do Mali, descrevendo a aérea como "santuário" para o GSPC. Forças de segurança de Washington citadas pela Reuters indicam que um grupo de militantes ligado à Al-Qaeda tem recrutado membros em mesquitas na mesma zona."O facto de que estão ali é uma indicação de que no futuro, e provavelmente já agora, têm a intenção de actuar no Norte de África - no Sahel e no Magrebe - assim como na África Oriental", sustentou Wald. "Estão à procura de um lugar onde possam fazer o mesmo que no Afeganistão e no Iraque. Necessitam de um sítio propício para treinar-se, equipar-se, organizar-se e recrutar", explicou. E, diz o general, os exércitos de grande parte destes países são relativamente pobres e mal equipados, enfrentando dificuldades para monitorizar os vastos territórios que devem controlar.Para poderem fazer frente a esta deslocação, os EUA estão "a desenvolver um esforço para obter acesso sem restrições aos territórios do Norte de África", confirmou há dias o chefe do comando europeu, general James Jones. Antes da guerra no Iraque, o Pentágono conseguiu isso mesmo no Corno de África, assegurando a colaboração total da Eritreia, da Etiópia e do Djibuti, onde conta manter por vários anos os 1000 soldados que integram o esforço de vigilância ao Golfo de Áden e às águas da Somália.O Comando Europeu já propôs alargar a iniciativa Sahel para incluir Marrocos, Tunísia e Argélia, países com que já existe em alguma medida cooperação militar. Para lá do Sahel, é com a Argélia que essa colaboração está mais adiantada e aqui, os americanos também querem aprender, já que o exército tem uma larga experiência na repressão contra o terrorismo islamista. "Estamos interessados em poder aterrar os nossos aviões nas bases argelinas e em treino conjunto", confirma o general Wald.Para além da expansão ao Magrebe, o comando quer estabelecer várias bases de manutenção em aeroportos em áreas remotas de diferentes países. "As áreas [em África] são muito extensas, é preciso estar apto a responder depressa quando as informações chegam", sustenta Wald. A ideia é formar equipas de cerca de 200 soldados a mobilizar para cada base.Em causa em cada um destes países podem estar células da Al-Qaeda ou grupos autónomos que seguem o seu exemplo. Apesar de Washington já ter ligado os ataques de Madrid à rede de Bin Laden, ligação sublinhada ontem à CNN pelo sub-secretário da segurança interna, Asa Hutchinson, os peritos insistem cada vez mais em referir-se a um movimento global onde se multiplicam muitos pequenos grupos."Estamos a lidar com uma ideologia. É um movimento global composto pela Al-Qaeda e por muitos grupos afiliados", sustentou em declarações à televisão americana MJ Gohel, especialista em terrorismo do Ásia-Pacific Foundation, um "think tank" sedeado em Londres. Atacar os EUA e os seus aliados exerce "uma atracção emocional" e "a possibilidade de que alguns indivíduos se agrupem para passar à acção subsistirá sempre", defende Maha Azzam, do Royal Institute of International Affairs, ouvido pela AFP.A reivindicação dos atentados em Espanha pode dar a impressão de um rede estruturada mas os peritos refutam-na. Depois da destruição da sua base no Afeganistão, a Al-Qaeda "não tem nem uma estrutura nem uma organização mas um nome, um apelo", insiste Barthélemy Courmont", investigador do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas de Paris.

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