Jovens agentes da PSP dormem em carros e pensões "mal frequentadas"

Pensões frequentadas por delinquentes e prostitutas, interiores de carros ou corredores de esquadras são alguns dos locais onde agentes recém saídos da Escola de Polícia têm de dormir porque a PSP não lhes está assegurar o prometido alojamento.Um jovem agente da 5ª divisão da PSP, que pediu o anonimato, contou ter sido confrontado, no primeiro dia de serviço, com a falta do alojamento que lhe haviam garantido quando acabou o curso. O jovem vivia em Viseu, mas foi colocado em Lisboa, como acontece "obrigatoriamente com todos, porque há falta de polícias"."Acabei o curso numa sexta-feira e segunda-feira entrei logo ao serviço. Estava descansado porque, na Escola de Polícia, assinámos um papel em como durante 15 dias tínhamos alojamento garantido pela PSP, até arranjarmos casa", disse. "No final desse primeiro dia de trabalho, carregados de malas, esperávamos que nos indicassem onde iríamos ficar, quando o comandante da esquadra se virou para nós e disse que tínhamos que nos desenrascar, porque não havia condições para nos alojarem", acrescentou.O agente confessou que esteve para desistir da polícia e voltar essa mesma noite para Viseu. Acabou por lhe valer um amigo residente em Lisboa que o deixou ficar em sua casa até arranjar alojamento.No entanto, contou, nem todos tiveram a mesma sorte: dos 50 destacados para aquela divisão, alguns ficaram em pensões "muito mal frequentadas e situadas em zonas problemáticas, outros tiveram que ficar a dormir nos corredores da esquadra".Apesar de várias tentativas, só conseguiu arranjar casa ao fim de um mês. "O aluguer das casas é muito caro e no primeiro mês só ganhamos 677 euros. Além disso, quase todos os senhorios querem alugar sem recibo, e quando sabem que somos polícias não alugam", afirmou. Neste momento, divide casa com três amigos num "bairro complicado" (a antiga Curraleira), o que o "obriga a desfardar-se na esquadra e ir para casa vestido à civil para evitar problemas".Maria Rosa Freitas, que pertence também à 5ª divisão, passou por dificuldades idênticas nos seus primeiros dias em Lisboa. Segundo contou, saiu da escola e foi estagiar para o Porto, tendo depois regressado a Lisboa para começar logo a trabalhar.Em cima da hora, e esperando também que lhe estivesse garantido alojamento, Maria Rosa Freitas viu-se sem um lugar para dormir, sem um amigo que lhe emprestasse casa e com a dificuldade acrescida de ser mulher. "Na primeira noite dormi dentro do carro. Procurei casas e encontrei um quarto que uma senhora alugava por 150 euros, com direito a três banhos por semana", contou. "Tive que desistir, era impossível, porque na minha profissão chego a ter que tomar três banhos por dia", acrescentou.Maria Rosa Freitas acabou por ficar alojada numa pensão "mal frequentada" na Almirante Reis. "Para as mulheres na polícia, é mais difícil juntarem-se e dividirem um apartamento, como fazem a maior parte dos homens, porque somos poucas", disse.Agora está na Penha de França, "numa casa pequena, cheia de humidade e sem condições", que divide com uma colega. "A casa só tem dois quartos e uma casa de banho pequena que foi adaptada de um antigo pátio, mas mesmo assim cada uma paga 175 euros por mês", queixou-se, referindo que, em média, uma casa custa 600 euros, encargo difícil de sustentar para duas pessoas que ganham pouco.Camaratas com cobertores nas janelasQuanto ao alojamento prometido pela polícia, Maria Rosa Freitas disse que "havia umas camaratas antigas", mas que "o número é muito reduzido e nunca se criaram mais". "Em contrapartida, cada vez há mais polícias", acrescentou, referindo conhecer casos de agentes que desistiram da profissão, "porque de facto as condições que enfrentam, no início, são das piores".As poucas camaratas de que a polícia dispõe não tem condições, sendo as de Alcântara as piores, adiantou esta agente. Outro colega confirmou esta ideia, dando o exemplo do caso de Chelas, perto da zona J, onde há "camaratas de polícia com cobertores na janela".O presidente da Associação Socio-Profissional da Polícia (ASSP), Alberto Torres, também corroborou esta preocupação. "Quando os jovens saem da escola em Torres Novas, são quase todos colocados em Lisboa. Nos primeiros tempos têm dificuldades de alojamento, sendo que muitos acabam por ficar em sítios onde dormem prostitutas e todo o tipo de marginalidade".De acordo com este responsável, a PSP tem o compromisso de assegurar alojamento por 15 dias, mas não o consegue fazer para "tanta gente". "Da escola saem, por vezes, mais de mil polícias e a PSP procura alojá-los em quartéis militares desactivados, que frequentemente não têm as condições necessárias".Alberto Torres lembrou que os serviços sociais da PSP tinham um projecto de construção de dois edifícios nas áreas de Lisboa e Porto para alojar esses novos agentes.No entanto - queixou-se - "o Ministério da Administração Interna, no ano passado, retirou abusivamente dos serviços sociais da PSP mais de seis milhões de euros de quotizações dos profissionais". Segundo Alberto Torres, "num despacho do início de 2003, o Governo considerava essas verbas como excedentes. O dinheiro foi para a Direcção-Geral do Tesouro".

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