Frank Gehry inaugura "barco mágico" em Los Angeles

Passados 15 anos sobre a aprovação do projecto do arquitecto Frank Gehry para o Walt Disney Concert Hall de Los Angeles, há, finalmente, uma data marcada para a abertura do auditório. No próximo dia 23 de Outubro assistir-se-à ao final feliz de um processo que tem sido minado de dificuldades - o típico "Hollywood ending", com estrelas à mistura, para a inauguração de uma obra que começou orçada em 111 milhões de euros e que, com um atraso de seis anos, acabou por custar mais de 304 milhões.O Walt Disney Concert Hall de Los Angeles era "a pedra no sapato" de Gehry. Há uns meses, com a obra finalmente prestes a ser concluída, o arquitecto que está a desenvolver o projecto de requalificação do Parque Mayer em Lisboa (deverá incluir palcos de apresentação teatral, zonas residenciais e espaços comerciais, mas o projecto final só será apresentado no final do próximo ano) já não conseguia esconder a ansiedade. Conta a útima edição da "Newsweek" que Gehry, um dos mais reconhecidos arquitectos do mundo, chorou quando em Junho a acústica foi testada pela futura residente do espaço, a Orquestra Filarmónica de Los Angeles, e, depois de interpretado o arranque da "Sinfonia Júpiter", de Mozart, o maestro Esa-Pekka Salonen disse: "Ficamos cá".Destinado a receber ainda o Coro de Los Angeles, o auditório vem assim juntar-se ao Ahmanson Theater, ao Mark Taper Forum e ao Dorothy Chandler Pavilion (onde até há dois anos se realizava a cerimónia da entrega dos Óscares). O complexo constituído pela soma destes espaços vizinhos no cimo de Bunker Hill, na Grand Avenue, muito perto da mítica Sunset Boulevard, é o epicentro cultural da cidade - o Los Angeles Music Center. O novo auditório será, esperam os múltiplos patrocinadores, o novo marco da cidade, algo que faça por Los Angeles o que a Opera House fez por Sydney.Uma pele metálicaFrank Gehry, velejador apaixonado, recorre ao vocabulário naútico para explicar a obra: diz que é a imagem de um momento de "wing on wing", quando um barco recebe o vento de popa, enfunando em toda a sua dimensão tanto a grande vela principal como a pequena vela da proa. É um edíficio como "um barco mágico", diz o arquitecto.Para um edifício que, segundo o estipulado no programa da altura, deveria ser construído em pedra de calcário, o projecto do Walt Disney Concert Hall conheceu alterações radicais: com um auditório com 2265 lugares, exteriormente é um nucleo dinâmico de várias volumetrias diferentes em que imperam contrastes entre linhas curvas e fluidas e duras linhas rectas. É uma obra integralmente revestida a aço inoxidável. E é devido a essa "pele" metálica que, ao longo do dia, o aspecto da construção se vai alterando: com o sol a pique, o edificio é totalmente prateado; ao pôr do sol, recebe tons rosados e dourados. Mas, apesar de uma indiscutível grandiosidade, hoje a obra não deverá causar o impacte que teria provocado se, como previsto, tivesse ficado concluída há seis anos. Foi ultrapassada pelo mediático Guggenheim de Bilbau, um edificio também revestido a metal (titânio) que se inaugurou, precisamente, em 1997 - data inicialmente apontada para a inauguração do Walt Disney Concert Hall.A iniciativa partiu de Lillian Disney, a viúva do mágico da animação. Numa homenagem ao marido, mas também num gesto de fé no dinamismo criativo e cultural da Los Angeles do século XXI, em 1987 Lillian doou 55 milhões de euros para que a cidade tivesse um novo espaço exclusivamente dedicado à música clássica. No ano seguinte, o projecto de Ghery foi escolhido num concurso internacional em que deixou para trás 71 outros candidatos. Mas foi quase imediatamente aí que começaram os problemas. Dificuldade de angariação de fundos e custos galopantes quase fizeram com que o projecto fosse abandonado. A obra foi encetada e depois interrompida por um período de cinco anos. Gehry redesenhou o projecto pelo menos três vezes, e esteve a ponto de desistir. "Em 1996, o projecto estava morto, pronto para ser enterrado", contou ao "New York Times" Eli Broad, um dos principais investidores. "As pessoas da cidade acharam que era um buraco negro que nunca seria construído". Entretanto, Diane Disney Miller, a única filha sobrevivente do casal Disney, toma uma atitude: investe na obra 15 milhões de euros do legado da mãe, entretanto falecida."Seja como for", diz Gehry, "foi construído, e isso é um milagre". Aos 74 anos, o arquitecto ressalva: "Uma vez que nos estamos a aproximar do capítulo final, quero fazer tudo o que tenho a fazer."

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