Parque de Serralves "reinventa" a sua paisagem

Ano: 2005. Lugar: Parque de Serralves. As acácias vermelhas já não estão no Parterre central do jardim frontal à casa do antigo conde de Vizela. As árvores já não tapam o olhar. O roseiral perdeu um acrescento a norte e está mais próximo do original. A velha mata foi rejuvenescida. O galinheiro mudou de lugar. As ervas aromáticas ainda estão lá. O saibro rosa no chão foi reforçado. Os antigos tanques de drenagem estão diferentes. Para já, este passeio pelos jardins de Serralves é ainda uma ficção, mas estas são algumas das mudanças anunciadas. O denominado "Projecto de Recuperação/Valorização do Parque de Serralves", da autoria dos arquitectos Claúdia Taborda e João Mateus, é apresentado hoje publicamente, numa cerimónia que vai contar com a presença do ministro das Cidades, Ordenamento do Território e do Ambiente, Amílcar Theias.O Parque de Serralves vai "reinventar" a sua paisagem. O tempo não perdoou o património vivo e verde que mora no centro do Porto e a natureza envelheceu. Anuncia-se a transformação do lugar. Victor Beiramar Diniz, director do Parque, promete algumas alterações mas sublinha que "as mudanças não serão muito visíveis e serão mais a nível estrutural". A intervenção vai reforçar o chão, reformular o sistema de drenagem, retirar alguns elementos mais recentes e, na medida do possível, devolver o espaço à paisagem original. "Não é uma revolução", assegura Victor Beiramar Diniz, adiantando que "há espaços que vão ser alterados mas, acima de tudo, há uma grande vontade de manter as suas características essenciais". A intervenção deverá arrancar em Agosto e, apesar do prazo de execução apontar para a sua conclusão em 2005, trata-se de um plano projectado para os próximos 15 a 20 anos. Segundo explica aquele responsável, o toque na pele de Serralves será gradual e visível. "Uma das nossas intenções é que o fechar de uma zona para obras não implique que as pessoas não a possam ver. Em cada espaço vai haver informação sobre o que está a ser feito. Nós pretendemos que isto seja mais uma forma de conhecimento para o nosso público", explica.No entanto, é certo que "o visitante vai notar diferenças". É que, à parte de algumas pequenas adaptações que foram feitas nos últimos anos e da construção do Museu, a execução deste projecto representa a primeira intervenção profunda no espaço desenhado pelo arquitecto francês Jacques Gréber em 1932 (concluído em 1940). O acesso às áreas intervencionadas será vedado por fases, sem afectar a programação habitual no parque. O texto que justifica a obra fala na "necessidade de implementar um plano de Recuperação e Valorização, de modo a conservar a integridade de ordem física - espaço e tempo - e a identidade - de ordem cultural do Parque". Um imperativo sustentado na transformação da paisagem, resultado da alteração da sua função original. "Estamos a falar de um parque que foi construído há 70 ou 80 anos para usufruto de uma família, uma coisa perfeitamente exclusiva e privada, e agora é um parque aberto ao público e bastante inclusivo", nota Victor Diniz, acrescentando que "o número de visitantes do parque tem aumento exponencialmente, todos os anos, e esse impacto nota-se, oviamente, ao nível das estruturas, do pavimento e outras questões". A passagem do tempo e das gentes teve consequências. "Há sistemas neste momento no parque que estão em franco desequilíbrio - alguma vegetação, os pavimentos e a drenagem. Estamos a chegar perto de alguns limites de alarme e queremos, precisamente, evitar a ruptura". Afinal o que é que vai mudar no parque? Para já, fica a garantia que não há zonas sagradas ou intocáveis e que "nada será construído". "Vai ser tudo mexido. Em maior ou menor grau, mas vai ser tudo mexido. Estamos a falar de uma intervenção estrutural que precisa de abarcar o sistema todo", começa por referir o director do Parque, justificando que "um parque, um jardim, é constituído a partir de material vivo que nasce, cresce, envelhece e morre". Uma das zonas onde a intervenção será mais sentida e visível é também uma das mais emblemáticas: O Parterre central, situado em frente à antiga casa da quinta do Conde de Vizela. "Em termos de imagem, vão desaparecer as sálvias (plantas vermelhas), porque são uma introdução posterior, e vão desaparecer as plantas que hoje em dia estão a ocupar espaço que eram de tanques do sistema de água que compreendiam os tanques laterais", adianta Victor Diniz. Neste caso, o visitante poderá acompanhar, também, a reposição do "espírito da plantação original", fazendo regressar o tempo em que o olhar, hoje bloqueado pela copa das árvores, chegava mais longe. As sombras vão mudar no Parque de Serralves. O roseiral, que foi intervencionado há pouco tempo, é outra das áreas onde a mudança será notada. Uma das diferenças concretas será a eliminação do acrescento no lado norte do roseiral, numa tentativa de repor o desenho original. A mata de Serralves é apontada como um dos exemplos mais flagrantes do actual desequilíbrio natural do espaço. "Vamos promover a sua regeneração natural, na tentativa de prepará-la para mais umas quantas décadas de vida saudável", diz Victor Diniz, esclarecendo que há espécies "que estão a atingir os seus limites de idade e que já apresentam doenças ou perigo de queda". Por outro lado, a execução das obras vai possivelmente despertar os sentidos para algumas zonas adormecidas - ou seja, menos visitadas. "Seguramente que a intervenção no arvoredo do século XIX e no arvoredo de Serralves vão chamar a atenção para o lugar, nem que seja pela mera sinalização da obra". Mas nem tudo é eliminação ou substituição. Por um lado, há coisas que não vão sair do sítio - como a plantação de ervas aromáticas -, por outro, há estruturas que simplesmente vão mudar de lugar - como o galinheiro que passará a ficar situado junto à quinta das crianças. A viagem ao futuro do Parque de Serralves começa hoje.(Caixa)Número de Visitantes em 2002Bilhetes só Parque: 20 mil Bilhetes Museu e Parque: 112 milAcessos Gratuitos (Serviço Educativo): 55 milTotal: +/- 180 mil pessoasA base de dados elaborada no âmbito de um projecto para a gestão informatizada da flora do Parque de Serralves inclui quatro mil exemplares arbóreos e arbustivos. O trabalho, exaustivo, foi levado a cabo pela Associação para a Formação Profissional e Investigação da Universidade de Aveiro em colaboração com o departamento de Biologia e também será apresentado hoje. Trata-se de um levantamento apoiado num sistema de informação geográfica (SIG). Victor Beiramar Diniz, director do Parque, salienta a importância desta "ferramenta" em todo o processo da preparação da operação de recuperação do parque. "Vai permitir saber os dados sobre cada árvore, espécie, dimensões, idade, programar tratamentos, registar intervenções. Um ficheiro", observa, acrescentando que "mais tarde, esta informação será disponibilizada ao público". O trabalho que referencia quatro mil especimens nos 18 hectares do parque resultou na elaboração de 200 textos e imagens e na criação de dois herbários clássicos e um digital, este último para acesso ao público.Vai ser ao som dos bombos e tambores que o ministro das Cidades, Ordenamentodo Território e Ambiente, Amílcar Theias, vai ficar a conhecer o "Projecto de Recuperação e Valorização do Parque de Serralves". Enquanto na Biblioteca, numa cerimónia solene o director do Parque, Victor BeiramarDiniz e os dois arquitectos paisagistas Cláudia Taborda e João Mateus,estiverem a explicar de que forma se vai reinventar a paisagem natural deSerralves, mais de três mil crianças estarão nos jardins e na quinta, a comemorar o Dia Mundial do Ambiente. Além de oficinas temáticas e jogos tradicionais, os meninos vão poder ouvir a orquestra "Tocá Rufar" e os "Pequenos Cantores da Maia". E espreitar os trabalhos feitos por muitos outros meninos que ao longo do ano visitaram a Fundação de Serralves - 3800 alunos de 58 escolas participaram no projecto "Narrativas de Viagem", que é também o nome da exposição que hoje se inaugura. No final do dia, que para Serralves será a todos os títulos uma festa, é feita uma largada de balões. R.S.

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