Em Portugal a prisão preventiva "é a regra e não a excepção"

1" dos Fischerspooner, "Will Save Us" das Chicks On Speed, "604" dos Ladytron, "Resuscitation" dos Adult, "Stadkind" de Ellen Allien, "The First Album" de Miss Kittin & The Hacker ou "Teaches Of Peaches" de Peaches. Numa linha diferente, e bem mais ecléctica, referência para as colectâneas "Trash", "2 Many DJs - As Heard On Radio Soulwax" ou "Playgroup - DJ Kicks". Da vaga conotada com as divagações punk-disco-funk têm surgido lançamentos mais interessantes, como os álbuns homónimos de Playgroup e Zongamin.

O problema é antigo. Está diagnosticado há já alguns anos. Não foi descoberto agora. Aliás, ninguém contesta que o recurso à prisão preventiva, a medida de coacção mais gravosa prevista na lei, é excessivo em Portugal. Prova-o a percentagem de presos preventivos - que continua a rondar os 30 por cento do total da população prisional - e provam-no os números absolutos: actualmente são mais de quatro mil as pessoas detidas preventivamente nas cadeias portuguesas. É preciso notar, porém, que o excessivo recurso à prisão preventiva não é um exclusivo português. Portugal ostenta uma das maiores taxas de presos preventivos da União Europeia (31,9 por cento, no final do ano passado), mas ainda há países que nos suplantam, como são os casos da Holanda (36,9 por cento, no final de 2001) e da França (33,6 por cento, em Maio de 2002), a crer nas estatísticas coligidas no "site" do International Centre for Prison Studies (ver quadro nestas páginas).Quanto aos dados nacionais (da responsabilidade da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais), esses não são suficientes para avaliar a dimensão do problema. Sabe-se apenas que, em cada ano, em média, cerca de metade das pessoas detidas preventivamente acabarão por não ser condenadas a prisão efectiva.Veja-se o que aconteceu em 2001: numa minoria dos casos (186) houve absolvição; 1195 foram libertadas, por alteração da medida de coacção, ou porque não chegaram a ser acusadas ou pronunciadas, presume-se; e 813 acabaram por ser condenadas a meras penas suspensas ou outras medidas não detentivas, como a multa. Para José Pinto Ribeiro, presidente do Fórum Justiça e Liberdades - que nos últimos 15 anos tem vindo recorrentemente a denunciar este problema -, a leitura do fenómeno é simples e a solução também. "Temos uma estatística que prova que a prisão preventiva é a regra e não a excepção", ao contrário do que estipula a Constituição, diz, defendendo que a última medida de coacção prevista na lei apenas deveria ser possível na altura da acusação.De qualquer forma, defende, mais do que na percentagem de presos preventivos, o que importa é atentar na duração média deste tipo de clausura. Que é muito elevada em Portugal: cerca de oito meses, uma média muito superior à dos outros países da União Europeia, como concluiu o Conselho da Europa (dados de 2001).Também o sociólogo Boaventura Sousa Santos, do Observatório Permanente da Justiça e do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, acredita que este fenómeno deve ser sobretudo analisado à luz de "a morosidade da justiça", que tem vindo a aumentar nos últimos anos. Se, em 1992, a maior parte dos presos preventivos (54 por cento) permaneciam, no máximo, seis meses na cadeia, em 2001 isso acontecia com menos de um terço (31,4 por cento); e, se no início da década de 90, apenas 2,7 por cento ficavam mais de um ano e meio nessa situação, em 2001 eram já 5,8 por cento do total os enclausurados por períodos longos.Ainda assim, o sociólogo diz que é preciso estudar mais a fundo o problema, até porque "os dados fiáveis são raros" (ele contabiliza apenas o número de preventivos à espera de julgamento, 2501 para um total de 103.624 processos, em 2001), uma vez que em Portugal um recluso continua tecnicamente em prisão preventiva, mesmo depois de ter sido condenado, caso recorra da sentença. Tomando como referência os dados de Fevereiro deste ano, uma fonte judicial adiantou todavia ao PÚBLICO que serão pouco mais de dez por cento os presos preventivos nesta situação.Uma investigação concluída no ano passado chegou a uma conclusão ainda mais preocupante: a de que é "elevada a proporção de preventivos no grupo dos detidos no período entre 1 a 3 anos". São 20,9 por cento, ou seja, mais de um quinto do total, revela o trabalho "Droga e prisões em Portugal", assinado por Anália Torres e Maria do Carmo Gomes, do ISCTE (Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa). Esta pesquisa serviu ainda para "desfazer algumas ideias pré-concebidas", nomeadamente a de que a justiça portuguesa é branda. "Portugal é um dos países da Europa Ocidental onde é mais longa a duração das penas e o tempo de permanência na prisão, com valores muito acima da média, para além de ser o país com maior número de reclusos por cem mil habitantes" (a par do Reino Unido, actualmente). O que é paradoxal, no entender das autoras, uma vez que é dos países com uma das mais baixas taxas de criminalidade, em especial da criminalidade violenta.Este problema está muito ligado à toxicodependência e a crimes relacionados com droga e à questão da reincidência, justifica Jerónimo Freitas, secretário-geral da Associação Sindical de Juízes Portugueses, sublinhando que o que é necessário é criar soluções para tratar estes casos fora das prisões e, em simultâneo, dotar a justiça de meios para que possa "resolver os processos em tempo útil". Já na opinião do presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, António Marinho, este fenómeno - que se começou a fazer sentir com mais acuidade na década de 90 - fica a dever-se sobretudo aos "discursos securitários" de alguns políticos e à "mentalidade autoritária" dos magistrados.Noronha Nascimento, vice-presidente do Conselho Superior de Magistratura, responde à letra, defendendo que a "alta taxa" de prisão preventiva deve ser atribuída em grande parte aos advogados, que recorrem frequentemente a "incidentes dilatórios". Além disso, defende, "muitas vezes a defesa das pessoas não é bem feita" e são "os próprios juízes que têm de a fazer".Noronha Nascimento nota ainda que os limites máximos de prisão preventiva em Portugal (quatro anos) até "nem são dos maiores" da UE. Na Itália é possível manter a prisão preventiva até seis anos e, na França, sete anos e meio, afirma, lembrando que este último país até já foi condenado por este motivo pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. E mesmo assim recusou-se a alterar a lei.

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