Novos saberes, novos problemas: Bioética

Os problemas criados neste nosso "admirável mundo novo" pelos progressos do saber exigiram também investigações e reflexões sobre os problemas da vida, dando origem a uma nova e específica ciência: a bioética. Ampliado o âmbito do saber, tornou-se necessário recorrer a uma palavra grega, que significa vida - bíos -, para a designar.Foi no princípio do século XIX que Treviranus empregou a raiz helénica no título da obra "Biologie oder die Philosophie der lebenden Natur" (Biologia ou Filosofia da Natureza Viva). O médico francês Lamarck abandonou a medicina e voltou-se para a zoologia, dando início a uma teoria completa dos seres vivos.Foram surgindo outras ciências relacionadas com a vida, que, por isso, necessitaram de novas expressões para as distinguir.As ameaças da poluição atmosférica, do aquecimento climático, da destruição de enormes superfícies florestais de modo tal que alteraram as relações entre o meio e os seres vivos em geral que exigiram estudos sobre esses fenómenos, constituindo-se assim a bioecologia.A partir deste sentido genérico, o médico cancerologista Potter entendeu chamar bioética a uma parte da bioesfera, intitulando um artigo publicado em 1970, "Bioethics, Bridge to the Future". Vários ramos de saber se constituíram a partir da noção dinâmica da vida, tais como a bioantropologia, que é o mesmo que antropologia biológica, a bioconsciência, o biodireito, etc.Em 1971, o Kennedy Institut of Ethics da Georgetown University de Washington criou o Center of Bioethics, que promoveu, em 1978, a publicação da primeira "Encyclopedia of Bioethics".Qualquer atento leitor da imprensa encontra notícias sobre delicados temas de bioética, como a eutanásia (activa e passiva), ou a clonagem humana. Recentemente, cientistas da Noruega anunciaram, na revista "Nature Biotechnology", a transformação de células adultas da pele em células imunitárias, o que, a confirmar-se como viável, poderia talvez substituir a discutível clonagem humana para obtenção de células estaminais destinadas a reparar tecidos e órgãos doentes, sem riscos de rejeição. Os fundamentos teóricos que valeram a Francis Compton Crich e a James Dewey Watson o Prémio Nobel de 1962 foram, porém, contestados, ficando em causa o pressuposto de que o gene seria inteiramente controlável e que, "movendo-o" de um para outro organismo, continuaria a fazer o mesmo. Seriam falsas, assim, as fundações da chamada engenharia genética.Dois especialistas italianos, Salvino Leone, obstetra e ginecologista, professor em Salerno, e Salvatore Privitera, director do Instituto Siciliano de Bioética, organizaram, em 1994, um "Dicionário de Bioética". A Editorial Perpétuo Socorro não receou a audácia de publicá-lo em versão portuguesa, revista e actualizada sob a responsabilidade do prof. Jorge Teixeira da Cunha. Aos colaboradores da edição original juntaram-se quase duas dezenas de portugueses e uma dezena de brasileiros. De entre os portugueses, refiramos os conhecidos professores Daniel Serrão, Walter Oswald, Adriano Moreira, Feytor Pinto e outros.Foi com eles possível colocar outras "entradas" mais, como sejam: "Centros de Bioética em Portugal", "Colonialismo", "Objecção de Consciência Militar", "Direito e Legislação Bioética", "Conselho da Europa sobre os Direitos do Homem e a Biomedicina", "Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida" (CNECV), criado em 1990 em Portugal, etc.Introduziu-se mesmo uma "entrada" original sobre a obra médica de Pedro Hispano Portugalense, o Papa João XXI. Quer se consulte ao modo de dicionário alfabético, quer se percorram as mil e cem páginas como leitura sistemática, que é proposta na abertura, aqui se tem o resultado de um notável trabalho em que "não se quis fazer um dicionário de ética confessional" mas se preferiu "o diálogo com quem enfrenta os problemas da bioética a partir de outras posições religiosas".professor da Universidade de Coimbra

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