Começou o ano da democratização do DVD em Portugal

Há já algum tempo que não restam grandes dúvidas: o DVD veio para ficar. Essa certeza não teve um reflexo imediato nos hábitos dos consumidores. Mas, ao longo de sete anos, desde que em 1996 foi lançado no mercado japonês - partindo de uma condição de curiosidade tecnológica e de bem de luxo -, este formato de vídeo digital foi fazendo uma continua e imparável escalada nos mercados internacionais. A Portugal este sistema chegou em 1997. Cinco anos depois, pode agora dizer-se ter chegado o ano da sua democratização. Ao longo de 2001, foi como se uma explosão começasse a anunciar-se numa onda de calor, com um número crescente de pessoas a aderir ao sistema e, consequentemente, os preços de "hardware" (aparelhos de leitura) e de "software" (o disco) a baixarem, começando a tornar-se acessíveis a uma progressivamente mais vasta faixa da população. A grande corrida às compras de Natal foi o momento da deflagração final dessa bomba-relógio: em Dezembro de 2001 o DVD foi o electrodoméstico mais vendido e uma das prendas mais cobiçadas pelos portugueses. Os preços acompanharam o aumento do consumo: hoje já é possível comprar um leitor por 150 euros.A paisagem do lazer e entretenimento caseiro nacional entrou, portanto, num grande e irreversível momento de metamorfose. Ainda que, ao contrário do que se possa pensar, o VHS não esteja, por enquanto, em vias de extinção, a ideia de "cinema em casa" que no final dos anos 70 se popularizou internacionalmente com o surgimento de sucessivos sistemas domésticos (o Vídeo 2000, o Beta Max ou o mais disseminado e já referido VHS - ironicamente aquele que tinha menor capacidade de definição de imagem) está a conhecer, com a imensa qualidade de reprodução e armazenagem de informação do DVD, um novo significado. Em Portugal, o número de vendas de títulos em suporte DVD quase triplicou entre 2000 e 2001 - o crescimento foi de 155,78 por cento. De facto, segundo dados coligidos pela Federação de Editores de Vídeogramas (FEVIP), se em 2000 o total de vendas de aluguer e vendas directas se situava nos 268 mil exemplares, no ano passado ascendia já aos quase 686 mil. É ainda possível verificar que o mercado das vendas directas tem nível de crescimento francamente superior do que aquele das vendas para aluguer. Se em 2000 foram vendidos para aluguer apenas perto de 36 mil títulos e em 2001 perto de 92 mil, na área das vendas directas foram comprados em 2000 mais de 232 mil títulos e em 2001 algo como 594 mil. A partir da avaliação de números semelhantes fornecidos por vários países, a companhia norte-americana Warner Home Vídeo concluiu que o leitor de CD e o VHS demoraram sete anos a atingir os níveis de vendas que o DVD conseguiu em apenas três. De facto, "consumidor médio de cultura" parece plenamente satisfeito e crescentemente voraz. Sara, uma empregada da primeira loja Blockbuster de Lisboa, nas Amoreiras, explicou ao PÚBLICO que, se quando o DVD apareceu representava apenas cerca de 10 por cento dos alugueres feitos na loja, desde então esse número quadriplicou, representando actualmente 40 por cento do total de alugueres feitos. Números totais do negócio em Portugal, a multinacional não fornece por razões comerciais.Será uma surpresa aquilo que esse "consumidor médio" mais aluga? Explica ainda Sara que "essencialmente são procurados filmes que têm efeitos especiais" e que, aparentemente, com o advento do DVD a ambiciosa produção cinematográfica dos irmãos Wachowski ganhou perfil de filme ideal - "Matrix" é o filme mais alugado, depois vêm as novidades. O "top mais" nacional de vendas da Fnac do ano passado (números oficiais também não há) não traz grandes alterações à paisagem traçada por Sara, ainda que aqui a tradição do nome "Star Wars" fale mais alto: no topo da lista vem o mais recente episódio da saga espacial de George Lucas (Episódio I: A Ameaça Fantasma"), logo seguido de mais efeitos especiais e acção com "A Múmia" e "Gladiador". A surpresa chega em quarto lugar com "Seven - Sete Pecados Mortais" - talvez por ser difícil resistir ao apelo estético da sua cuidada edição. Tudo isto poderá parecer dar razão aos mais cépticos, que têm vindo a recusar o sistema digital afirmando ser este apenas mais um passo para a total "analfabetização" dos públicos, cada vez mais longe do cinema europeu e das salas convencionais, numa rendição ao tecnicismo, à velocidade e à violência, à possibilidade de através dos "extras" conhecer os "gags", as cenas cortadas e saber dos mexericos das rodagens pela viva voz dos intervenientes, etc. Mas, se por um lado as grandes editoras norte-americanas já anunciaram o eminente desaparecimento desses extras - que funcionaram como uma espécie de engodo até à total implantação do formato no mercado -, por outro lado, pode-se também pensar no actual momento como uma espécie de adolescência. Diz Ima Turbau, da Fnac, que esta é uma fase que está já a ser ultrapassada. Segundo ela, o DVD está rapidamente a atingir um momento "mais normalizado", ou seja, um momento em que o volume de vendas começa já a justificar às editoras o lançamento, em cada vez maior escala, de clássicos do cinema bem como de objectos cinematográficos mais exclusivos. Isto, diz, "faz com que o DVD fique também cada vez mais próximo dos cinéfilos, pessoas que todos os meses compram dez ou quinze filmes". Por tudo isto, explica: "Em 2002 vai haver mais cinema dito 'interessante' que comercial. O DVD já explodiu. Agora chegou o ano da sua democratização."

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