O último cesto de Paulo Pinto

O basquetebol português perdeu anteontem o seu melhor jogador da actualidade - Paulo Pinto. Uma paragem cardíaca durante a partida em que a sua equipa, o Aveiro Basket, defrontava o Benfica, pôs um fim precoce a uma carreira desportiva que prometia ainda muitos sucessos. O extremo-poste, prestes a cumprir 28 anos, desmaiou a meio de um desconto de tempo, no pavilhão do Galitos, de nada valendo os esforços para o reanimar, e só a autópsia realizada ontem poderá ajudar a diagnosticar a exacta causa da morte (suspeita-se de um aneurisma cerebral). Paulo Pinto vai hoje a enterrar na sua terra natal, S. João da Madeira, onde a notícia causou consternação geral.Trinta minutos depois da confirmação do óbito, o FC Porto, o clube da sua vida, iniciava no Seixal um jogo que acabou com uma vitória não celebrada. Alberto Babo, técnico dos "dragões", escondeu a notícia dos seus jogadores até ao final da partida. Mas o seu rosto e o dos dirigentes do clube traíam a dor sufocada que lhes ia na alma. No fim, a emoção desfez-se em lágrimas. Só em Nuno Marçal, companheiro de Paulo Pinto nos sete anos de sucessos que ambos viveram nas Antas, essa dor se traduziu num indignado silêncio.Sobram memórias a Alberto Babo sobre Paulo Pinto, "apenas as boas", neste momento. "Era um vencedor nato, com enorme força interior, que não gostava de perder por nada", recorda o técnico que primeiro o acolheu quando, com apenas 17 anos, chegou ao FC Porto. O impacto do seu potencial desportivo materializou-se logo na primeira temporada de "azul e branco", em 1993/94, com a conquista do campeonato nacional de juniores, a que se seguiram, no anos seguintes, mais três no escalão maior. Junto a atletas como Marçal, Rui Santos, Raul Santos, Nuno Perdigão ou Jared Miller, marcou uma época no FC Porto, integrando a primeira e única dinastia da jovem Liga profissional da modalidade, vencendo ainda três Taças de Portugal, duas Supertaças e uma Taça da Liga. Tudo, sublinha Babo, sem colocar os estudos de parte, o segundo campo onde foi brilhante, tendo recentemente terminado o curso de Medicina. "De cada vez que tinha uma exame de manhã, passava a noite sem dormir; mas nem por isso baixava o seu nível no jogo que disputava nesse mesmo dia. De resto, era a sua inteligência que fazia a diferença dentro do campo. A sua capacidade de assimilar o que lhe dizia e de ler e pensar o jogo era superior à maioria dos seus colegas", acentua Babo, que recorda com emoção a frase, "terna", que o jogador lhe dispensou nos festejos do primeiro título como técnico principal do FC Porto: "Bibi, ganhámos o campeonato!". Por essa altura, era já considerado o melhor jogador português e estava a caminho de se tornar capitão da selecção nacional, pela qual obteve 65 internacionalizações.Sucesso individual que Augusto Araújo, o seu último treinador na Sanjoanense - onde iniciou, aos 9 anos, a prática na modalidade - bem entende. "Para ele, só existiam duas paixões: o basquetebol e os estudos. Na adolescência, lembro-me que os seus colegas tinham as suas saídas à noite, mas o Paulo não tinha tempo para isso". Araújo lembra-se bem do rapaz que, já estudante de Medicina, vinha de propósito às quartas-feiras a S. João para treinar e obrigava, depois, alguém a transportá-lo de regresso ao Porto, "para não se atrasar nas aulas". A homenagem à integridade do seu carácter é, aliás, o motivo do minuto de silêncio que os adeptos presentes no jogo da liga espanhola entre Gran Canaria, equipa que representou por um ano antes de ingressar no Aveiro, e Fuenlabrada lhe vão prestar este-fim-de-semana.Entretanto, a Liga de Clubes de Basquetebol decidiu que os 20 minutos que ninguém quereria jogar vão mesmo ter que ser disputados, ordenando a continuação da partida em que faleceu o único atleta luso integrante da lista de candidatos ao "All-Star" europeu, em 1999. Esta tragédia aumentou para três os casos de desaparecimentos recentes na modalidade: em 1997 e 1998, os atletas Angel Almeyda e Rui Guimarães, ambos da Portugal Telecom, também morreram enquando treinavam.

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