A alegre despedida de Tim Booth

Tim Booth, o vocalista, "frontman" e fundador dos James, decidiu deixar a sua banda de sempre. Mas o choque inicial dos inúmeros seguidores da banda deu lugar à alegria de poder partilhar com o septeto britânico uma digressão de despedida que Booth espera ser uma verdadeira osmose entre o público e a banda, num memorável ponto final para o ciclo que está prestes a encerrar. Muito ligados a Portugal (o violinista Saul Davis vive nos arredores do Porto), os James fizeram questão de passar por cá. Aos concertos de hoje, em Lisboa, e de amanhã, no Porto, segue-se uma mini-digressão em Inglaterra. Um regresso a casa (os James são de Manchester) que reserva para o final um concerto na mítica Wembley Arena. Uma verdadeira chave de ouro que, para Tim Booth, faz parte de um conjunto de espectáculos que se pautarão pelo mesmo sentimento. "Em cada noite estarão pessoas que não poderão ver-nos mais" e, por isso, há que queimar os últimos cartuchos "para lhes deixar grandes memórias", diz Booth. Daí que o alinhamento da banda de "Born of Frustration", "Laid", "Sometimes" ou "Sit Down" se centre mais em "músicas que as pessoas conhecem bem" e nalgumas "canções mais antigas que não tocamos há quatro ou cinco anos". Assim sendo, o novo álbum - "Pleased To Meet You" - deverá passar para segundo plano, abafado pela vontade de revisitar os grandes êxitos que fizeram dos James a banda que hoje são. Isto, apesar de Tim Booth reconhecer, orgulhoso: "Este, é provavelmente, o nosso melhor álbum desde 'Laid'. Foi um disco que deu imenso prazer a gravar. Adoro-o." Uma razão para isso terá sido o facto de a banda ter voltado a trabalhar com Brian Eno, que também produziu "Laid". E, desde então, já passaram oito anos. Aliás, embora a frescura da banda possa enganar, a verdade é que já lá vão 20 anos de carreira, onze álbuns, concertos em todo o mundo e muitas, muitas músicas. Para Tim Booth, o balanço é mais do que positivo. "Adoro tudo o que fizemos". Realizado? Sonhos cumpridos? "Sim. Não posso dizer mais", diz por entre um sorriso. Cortar amarrasEis-nos então perante uma moldura estranha para configurar uma saída tão repentina: um músico feliz, realizado e perfeitamente integrado a querer sair? Parecem faltar motivos. Booth explica porquê: Não faz sentido procurar razões, simplesmente porque não as há. A decisão foi intuitiva, como tudo na sua vida. "Tenho muita fé na minha intuição. De repente, tornou-se simplesmente óbvio que era chegada a altura de partir. É só." No entanto, não deixa de confessar que estar nos James impedia-o, de algum modo, de se dedicar a outras actividades para as quais as suas pulsões o começavam a empurrar. "Ser vocalista dos James amarra muita da minha energia. É como se a minha identidade fosse ser cantor dos James. Eu quis cortar as amarras." Não quer isto dizer que a banda fosse uma prisão. Pelo contrário, "os James tenho tido uma maravilhosa liberdade para criar. Mas, ao mesmo tempo, há muitas outras coisas que quero fazer", explica. No fundo, age segundo a velha táctica dos vencedores: deixar o jogo enquanto se está a ganhar. "Depois de vinte anos nisto, apercebes-te de que estas coisas têm ciclos. Mesmo na natureza, a um período de fartura segue-se outro de seca", explica. "Podíamos ter-nos separado há alguns anos mas, se o tivéssemos feito, teria sido muito negativo. Acho que é óptimo separar-nos agora, quando nos estamos a sentir mesmo no topo."E estão mesmo. Os fãs já há muito foram conquistados, embora o número cresça de dia para dia. Mas os James tiveram de suar para conquistar a crítica (apesar de nunca ter sido esse o seu grande objectivo) que acabou por se render. Quanto mais não seja pelo feito (raro) que é conseguir viver num equilíbrio único entre os holofotes do efémero sucesso pop e uma presença marcada no circuito alternativo, com direito a estatuto de banda de culto. Resta saber se o culto sobreviverá quando, finda a digressão, Tim Booth sair de vez para seguir outros projectos (ver caixa). Quanto ao destino dos James, é ainda desconhecido. Aliás, os próprios ainda não resolveram se vão ou não continuar. Uma dificuldade de decisão compreensível, uma vez que não será fácil encontrar um vocalista com uma presença e uma voz tão carismáticas como as de Tim Booth, desde sempre o rosto da banda. Um rosto e uma banda a ver pela última vez nos concertos que Tim Booth promete serem "uma grande celebração." Venham as memórias.

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