Bolshoi em decadência enquanto o Mariinsky cresce

Foram, outrora, sinónimo de extraordinários bailarinos, músicos talentosos e interiores sumptuosos. Mas, actualmente, as produções dos teatros russos reflectem uma desesperada luta por financiamentos, travada nos bastidores. Peguemos no caso do Teatro Bolshoi, de Moscovo. Durante o seu período de ouro, na era soviética, o Bolshoi produziu alguns dos melhores espectáculos de ópera e de bailado do mundo. Agora, está a desagregar-se, é incapaz de pagar aos seus profissionais e a sua administração está constantemente a ser investigada pelo governo russo."O nosso teatro é como um espelho - reflecte o que se passa no país. Quando o país não tem dinheiro, nós não temos dinheiro. Quando os governos mudam, nós mudamos", afirmou à Reuters Elena Lebedyanskaya, responsável pelo gabinete de imprensa do Bolshoi. Para tornar o cenário ainda mais negro, o seu rival, o Teatro Mariinsky de São Petersburgo, despertou para a ribalta sob a nova direcção, presidida por Valery Gergiyev, reunindo a aclamação internacional e donativos e investimentos substanciais. O Bolshoi está em declínio há anos, mas a sua degradação recente tem vindo a ser atribuída à liderança de um dos seus bailarinos-estrela, Vladimir Vasiliyev. Nomeado director artístico em 1995, foi despedido no ano passado, sob a acusação de ter mergulhado o teatro num caos administrativo e de ter produzido espectáculos banais. O Presidente Valdimir Putin colocou, então, o Bolshoi sob o controle directo do ministro da Cultura, que nomeou Gennady Rozhdestvensky - um maestro veterano e um dos ícones dos dias de glória do Bolshoi - para a direcção artística. Rozhdestvensky demitiu-se menos de um ano depois, quando a sua produção da ópera "The Gambler", de Prokofiev, foi ridicularizada por ter péssimos cantores e um cenário que chiava. Ele atribuiu o fracasso à falta de verbas e disciplina do teatro, admitindo que os intérpretes eram forçados a faltar aos ensaios para poderem participar em espectáculos no estrangeiro que lhes permitiam garantir a sua subsistência. "O dinheiro é um problema e neste momento não temos nenhum. Muitos dos intérpretes ainda aqui estão simplesmente porque amam o Bolshoi", afirmou Lebedyanskaya. O esforço seguinte para ressuscitar o Bolshoi foi a nomeação do dinâmico Alexander Vedernikov, 38 anos, para o prestigiante cargo de maestro principal e director musical. "É habitual ter tantas mudanças de directores - havemos de encontrar o certo", disse Lebedyanskaya, confiante. "O Bolshoi é um símbolo da nossa cultura. Agora temos de reaver o nosso nome, a nossa reputação."Encontrar a pessoa certa para levar o Bolshoi a entrar no século XXI não é o único problema deste teatro lendário - o edifício com quase 150 anos precisa de obras de restauro no valor de, pelo menos, 300 milhões de dólares (330 milhões de euros, 66 milhões de contos). As reparações estão agendadas para 2003, quando a companhia se mudar, temporariamente, para o "Pequeno Bolshoi", que deverá estar terminado no próximo ano. Por contraste, o Mariinsky está cada vez mais forte, graças à direcção de Gergiyev, já com dez anos. "Ele é muito talentoso, quase um génio. Ninguém pode imaginar o que ele trabalha. Às vezes ele dorme apenas duas horas", disse Natalia Matoukhno, porta-voz do teatro. Só no ano passado, o Mariinsky estreou 13 produções e participou em diversos festivais internacionais.Gergiyev faz inúmeras digressões como maestro e atrai várias estrelas e directores de orquestra a São Petersburgo, incluindo o seu amigo, Placido Domingo, que integrou o White Nights, o festival de Verão.O Mariinsky também recebe fundos federais, mas beneficia de uma longa lista de patrocinadores e mecenas de vulto, como o filantropo Alberto Vilar. Entretanto, Gergiyev está a tentar assegurar o futuro do teatro dando formação a jovens esperanças russas. "Claro que tudo depende do talento e da capacidade de trabalho de cada um", disse Matoukhno. "Todos têm aqui uma oportunidade. Se trabalharem o suficiente, chegarão a estrelas."Há já projectos para ligar o teatro à Casa da Cultura através do Canal Kurkov, com uma galeria e um segundo auditório. Mas, apesar da sua rivalidade pública, o Mariinsky e o Bolshoi trocarão espectáculos este Outono."Nós podemos e devemos reforçar os laços que nos unem ao Mariinsky", diz Lebedyanskaya. "Eles têm o seu rosto e nós temos o nosso. O Mariinsky transformou-se num teatro mundial, o Bolshoi não. Isto significa Rússia, e a Rússia está a mudar."

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