Torne-se perito

Giuseppe Verdi

CENTENÁRIO DA MORTE. Um pouco por todo o mundo se celebra o autor de "La Traviata"

Giuseppe Verdi, o maior compositor italiano da sua geração, nasceu em 1813 em berço pobre, numa aldeola do norte de Itália, Le Roncole, a uns cinco quilómetros da pequena cidade de Busseto (província de Parma). O seu pai, Carlo Verdi, tinha um estabelecimento que servia simultaneamente de estalagem e de venda; mas os seus proventos eram escassos e os hábitos familiares espartanos: quando o jovem Giuseppe, aos dez anos, foi enviado para a casa de um sapateiro em Busseto a fim de prosseguir os estudos no liceu, regressava aos domingos a Le Roncole a pé e descalço, para poupar nas solas.O pequeno Verdi tinha uma razão especial para voltar à aldeia aos domingos: era, desde os nove anos, o novo organista da igreja, função na qual sucedera ao seu velho professor. Desde os sete anos que praticava num instrumento de tecla muito usado, que o pai fora convencido a comprar; a sua formação iria continuar, em Busseto, junto de Ferdinando Provesi, organista, maestro da Banda Filarmónica e director musical do município.O horizonte de Verdi era uma música provincial bem estruturada, com postos eclesiásticos fixos e organizações cívicas herdeiras das formações instrumentais da antiga aristocracia. Aos dezasseis anos, Verdi passou a ser assistente de Provesi em Busseto. Conheceu entretanto o Presidente da Filarmónica, o comerciante Antonio Barezzi; aos dezoito anos, foi acolhido como hóspede na sua casa e começou a dar lições de música à filha Margherita, por quem se apaixonou e com quem viria a casar cinco anos depois.Barezzi foi o grande apoio de Verdi nesses primeiros anos de afirmação profissional, quase um segundo pai: pagou-lhe as despesas da sua ida para Milão, onde veio a aprofundar os seus estudos musicais. A intenção de Verdi era estudar no Conservatório com uma bolsa de beneficiência, que não pôde obter; mesmo pagando privadamente as propinas, Verdi não passou no exame de admissão. Razões: má posição das mãos no teclado e idade (dezoito anos) acima do limite legal. Verdi ficou em Milão, mas a estudar com um professor privado, o compositor Vincenzo Lavigna.Em 1833, tendo Verdi vinte anos, morreu Provesi, deixando os seus postos vagos. Verdi fez menção de concorrer a estes, mas o caso arrastou-se. Um ano depois, sem concurso público, foi nomeado o preferido da facção clerical; Verdi recorreu, sem resultados imediatos, terminando em 1835 os seus estudos em Milão. Acabou por ganhar o concurso para director musical municipal, o que lhe permitiu casar-se e instalar-se em Busseto, ao mesmo tempo que compunha a sua primeira ópera, "Rocester".Entre 1837 e 1839, nasceram e morreram, ambos com pouco mais de um ano de idade, os filhos Virginia e Icilio Romano. Menos de um mês depois de perder Icilio, Verdi conseguiu finalmente levar à cena no Teatro La Scala de Milão a ópera "Oberto". O êxito obtido permitiu o início de uma colaboração estreita com o editor Ricordi e um contrato com La Scala para três óperas mais, mas foi ensombrado em 1840 pela morte, por encefalite, de Margherita. No ano seguinte veio a consagração pública e nacional do compositor, com a ópera "Nabucco", triplamente "belíssima", no dizer de Donizetti. Chovem convites para frequentar a alta sociedade milanesa, o que convém a Verdi mas não faz muito o seu género, taciturno e pouco polido."Nabucco" foi recebido com entusiasmo apesar do papel principal de soprano ter sido desempenhado, na estreia, por uma Giuseppina Strepponi em má forma vocal; mas Giuseppina era uma das maiores apoiantes de Verdi, numa altura em que o parecer dos cantores tinha uma influência por vezes decisiva na carreira de um compositor de ópera. A colaboração profissional entre os dois tornar-se-ia mais estreita nos anos seguintes; do convívio acabaria por nascer uma atracção mútua que levaria, com algum escândalo público, à vida em conjunto, já Giuseppina tinha abandonado o palco, a partir de 1847; o casamento só aconteceu em 1859.A primeira ópera que Verdi compôs para um teatro que não La Scala foi "I Lombardi", estreado em 1843 no La Fenice de Veneza; mas foi "Ernani", levado à mesma cena no ano seguinte, que lançou a reputação internacional do compositor. Foi também numa reposição de "Ernani" que a música de Verdi se viu pela primeira vez associada ao patriotismo italiano, então politicamente candente. Entretanto, a saúde de Verdi ressentiu-se do excesso de trabalho; uma paragem forçada em 1846 permitiu-lhe reaparecer com uma visão dramática mais profunda, e a vários títulos original, em "Macbeth", estreado em Florença em 1847 (e revisto em 1864).O reconhecimento internacional chegou com encomendas de Londres ("I masnadieri") e Paris ("Jérusalem"). A conjuntura política levou Verdi a conceber uma ópera que reforçasse os ideais nacionalistas, "La battaglia di Legnano", uma partitura de grande sofisticação orquestral. Em "Luisa Miller", Verdi lançou as sementes de uma reformulação das relações entre canto e orquestra. Assim se preparavam as primeiras óperas da maturidade plena: "Rigoletto", "Il trovatore", "La Traviata", em que Verdi dispensa, sem romper com as convenções da ópera romântica italiana, tudo o que não é essencial à verdade dramática.Entretanto, Verdi tinha-se instalado nas suas novas propriedades em Busseto, onde havia metodicamente aplicado os rendimentos das suas óperas. Em 1853-1854 mudou-se provisoriamente para Paris, de modo a prosseguir uma frutuosa colaboração com a Opéra ("Les vêpres siciliennes"). Escolheria Génova para viver a partir de 1867. Para Nápoles escreveu "Un ballo in maschera"; as dificuldades com a censura, apesar da reformulação do libreto, levaram-no, depois de ganhar um processo judicial, a estrear a ópera em Roma (foi em Nápoles que o grito "Viva Verdi" ganhou o significado político de "Viva Vittorio Emanuelle Re d'Italia"). As simpatias nacionalistas e prestígio de Verdi explicam a sua eleição e actividade como deputado entre 1861 e 1865. No horizonte estavam ainda a espaventosa "Aïda" (1870), o dramático "Requiem" (1874) e a admirável renovação artística da velhice, plasmada em "Otello" (1884-1886) e "Falstaff" (1889-1892). As obras sociais por que foi directamente responsável, um hospital em Villanova sull'Arda e a Casa di Riposo para músicos, em Milão, atestam o espírito filantrópico e a generosidade do artista.

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