Zimbabwe prepara o pós-Mugabe

Os partidos da oposição zimbabweana estão a tentar forçar o Presidente Robert Mugabe a sair de cena no fim deste ano, mas o "Leão de Harare" ainda está agarrado ao poder. As Nações Unidas preparam eleições gerais para Junho. Só então será possível conhecer a distribuição de forças na antiga Rodésia do Sul.

Nos últimos dias, a pequena mas muito activa sociedade civil do Zimbabwe tem vindo a dar a ideia, através das suas várias publicações, de que o actual regime está à beira do fim - o Presidente Robert Mugabe poderia abandonar o cargo já em Dezembro. Observadores na região crêem, porém, que o velho "Leão de Harare" ainda vai "rugir" durante mais algum tempo.Emmerson Mnangagwa e John Nkomo são os chefes de duas das facções do partido governamental, a União Nacional Africana do Zimbabwe (ZANU), prontos a digladiarem-se pelo posto de Mugabe, chefe de Estado desde a proclamação da independência, em 1980. As capacidades de Mnangagwa e Nkomo vão ser postas à prova durante a campanha para as legislativas a realizar daqui a cinco meses.A oposição quer mesmo que, em simultâneo, se realizem presidenciais, o que obrigaria Mugabe a encurtar o seu mandato, actualmente previsto para durar até 2002. As tensões acumulam-se, fala-se de curva descendente do regime, estabelecem-se paralelos com o que na Indonésia aconteceu ao Presidente Suharto.Sábado, um novo partido da oposição, o Movimento para a Mudança Democrática, abriu a sua primeira convenção com um espectáculo de força visto como o mais forte desafio até agora ao Presidente Mugabe. "O nosso objectivo é acabar com a crise, com Mugabe e com o seu governo", disse o secretário-geral do MDC, Morgan Tsvangirai, perante os aplausos de 4.000 delegados.Nesta última década, Robert Gabriel Mugabe gastou 260 milhões de dólares norte-americanos em viagens a mais de 150 países, noticiou há dias "The Zimbabwe Independent", de Harare, com base em peritos da aeronáutica e da indústria petrolífera. Este dinheiro é apenas referente ao combustível utilizado pelos aviões que o Presidente freta à Air Zimbabwe. Não estão incluídas as contas de hotéis e os custos de representação para os que acompanham o homem a quem o próprio povo começou a alcunhar de "Vasco da Gama". Em 10 anos, Mugabe cometeu a proeza de se manter fora do país 306 dias, cobrindo mais de 640 mil quilómetros, como se estivesse a concorrer para o Guinnes Book of Records. Só no ano passado foram 44 dias de ausência, para ir a 21 países. Este mês, já esteve em Moçambique, na Líbia e nos Estados Unidos.Enquanto Mugabe viaja, a recessão aumenta e a economia nunca pareceu em tão mau estado, nestes últimos 15 anos, o que contribui para reforçar a imagem, corrente no Ocidente, de que uma grande parte dos países africanos que alcançaram a independência nas décadas posteriores ao fim da II Guerra Mundial não têm sido capazes de se administrar a si próprios.Perante o caos, todos os caminhos são viáveis. Como o remédio do federalismo que agora se quer prescrever ao Zimbabwe. Significa isso que cada província administraria os seus próprios problemas em vez de deixar todas as decisões nas mãos de Harare. Como se assim fosse mais fácil progredir.Tentando renascer das cinzas, a velha União Popular Africana do Zimbabwe (ZAPU), que foi liderada pelo defunto Joshua Nkomo e actualmente é dirigida por Joshua Mhambi, defende um partido com base na Matabelelândia e que represente claramente os interesses do povo matabele, permitindo-lhe até escolher líderes oriundos da região, por oposição aos shonas, de Robert Mugabe.Os matabeles vivem no Sul do país, mais perto da África do Sul, de onde são oriundos, e têm por principal cidade Bulawayo; os shonas, fundadores do primeiro Estado na região do actual Zimbabwe, residem no Norte, mais perto do curso do rio Zambeze.Até há um século, tratava-se de dois povos distintos apenas unidos pelas contingências da colonização britânica, com Cecil Rhodes e a sua South Africa Company. Agora, só o futuro dirá se eles voltarão ou não a trilhar caminhos diversos, no incerto pós-Mugabe, uma vez que todas as dúvidas são susceptíveis de se colocar, numa África social e politicamente ainda tão frágil.

Sugerir correcção