GAL voltam aos tribunais

Os tiros na nuca que vitimaram Lasa e Zabala constituem o mais horroroso dos crimes do historial dos denominados Grupos anti-Terroristas de Libertação. Uma operação - cujo julgamento começa hoje - ao mais puro estilo dos para-militares da extrema direita da América Latina, que pode salpicar antigos responsáveis socialistas. Em véspera de novas eleições.

O sequestro e assassinato, em 1983, de dois bascos, acusados de pertencerem à ETA, começa hoje a ser julgado na Audiência Nacional da capital espanhola. No banco dos réus estão o general Enrique Rodriguez Galindo, um dos oficiais da Guarda Civil que mais se destacou na luta anti-terrorista, o ex-governador civil de Guipuzcoa, Julen Elgorriaga, nomeado pelo primeiro executivo socialista de Felipe González e, entre outros, o antigo secretário de Estado da Segurança, Rafael Vera. A "guerra suja" contra os etarras desenvolvida pelos auto-denominados Grupos anti-Terroristas de Libertação (GAL) regressa, 16 anos depois, à política espanhola.De todos os crimes dos GAL - que nos anos 80 provocaram 27 mortos em 33 atentados -, o que vitimou os bascos José Ignácio Zabala e José António Lasa é um dos mais horrorosos. Zabala e Lasa, presumíveis simpatizantes da ETA, foram sequestrados na madrugada de 16 de Outubro de 1983 na cidade francesa de Bayona, transportados para Espanha e, segundo o Ministério Público espanhol, interrogados em São Sebastião, no "Palácio de la Cumbre", para revelarem o paradeiro de etarras residentes em solo francês. Após várias "sessões" de interrogatório, os dois jovens foram levados até Alicante onde, nos arredores de Busot, cavaram a sua própria sepultura e receberam um tiro na nuca. Os seus restos foram enterrados em cal viva para dificultar a sua posterior identificação.Uma acção que recorda o "modus operandi" dos para-militares da extrema-direita da América Latina. Apenas em 1985 as ossadas foram encontradas e só uma década depois foi possível a sua identificação. O que levou as famílias a solicitarem a reabertura judicial do processo, um dos protagonizados pelos GAL que irá a julgamento (ver caixa).De acordo com o magistrado instrutor, o sequestro, transporte, interrogatório e assassinato de José Zabala e José Lasa, foi executado por uma das ramificações dos Grupos anti-Terroristas que operou a partir do comando 513 da Guarda Civil, com sede no quartel de Intxaurrondo, nos arredores de São Sebastião. O responsável daquelas instalações era o então comandante Galindo, contra o qual são agora solicitados 92 anos de prisão pelos crimes de assassinato, detenção ilegal, lesões graves, e promotor de grupo armado. Segundo a acusação, foi aquele oficial superior quem "perante o lamentável estado físico [após as torturas] dos dois jovens, decidiu que fossem levados para Alicante, onde os fariam desaparecer".A mesma pena de 92 anos de prisão é requerida, também, para o ex-governador civil Elgorriaga, apontado como co-responsável da operação e que, tal como Rodriguez Galindo, terá assistido às sessões de interrogatório. Aos agentes Enrique Villalobos e Bayo Leal, acusados do duplo homicídio, e ao capitão Angel Vaquero, este último referido no auto da acusação como indutor, são solicitados 90 anos de prisão. Por fim, o ex-secretário de Estado da Segurança dos socialistas, Rafael Vera - condenado a 10 anos de prisão pelo sequestro do francês Segundo Marey, na primeira acção reivindicada pelos GAL, e indultado há um ano pelo Governo conservador espanhol - e o advogado Jorge Argote, arriscam uma pena de dois anos de prisão por encobrimento.O "caso Lasa e Zabala", cujo julgamento decorrerá em plena pré-campanha eleitoral, poderá constituir-se em mais uma munição contra a gestão dos socialistas no Ministério do Interior, afectando as suas expectativas de regresso ao poder após o escrutínio de Março. Para além desta repercussão política, este processo incide sobre o envolvimento de responsáveis e agentes da Guarda Civil com os GAL. Uma teia ainda não desvendada. Segundo algumas investigações, os GAL, montados a partir da acção dos ex-polícias José Amedo e Michel Dominguez, teriam posteriores ramificações e diversas cores. Ao "GAL azul", o original, afectando agentes policiais, ter-se-á sucedido o "GAL verde" - com elementos da Guarda Civil -, e um "GAL castanho", envolvendo o discreto trabalho de elementos dos serviços secretos.

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